Selvino Heck (*)
Passadas as eleições municipais, ouve-se falar muito de 2022, à luz do recente processo eleitoral e seus resultados. Confesso que, embora acompanhando o debate (ver, por exemplo, ‘Xadrez dos preparativos para 2022’, blog do Luís Nassif), 2022 não está no centro das minhas preocupações e atenção neste final de 2020. Estou mesmo preocupado com 2021, que, tudo indica, será um ano mais duro e difícil que 2020.
2022 está muito distante. Antes dele é preciso atravessar 2021. Se as preocupações centrais, e articulações, portanto, forem, desde agora, as eleições presidenciais, a instituição vai ‘matar’ o movimento, como tem acontecido muito nos últimos tempos. O que é uma das razões das dificuldades atuais do campo democrático-popular.
O problema, e o dilema, neste momento, final de 2020, não é o nome A, ou o nome B como candidato a presidente da República em 2022. Ou a coligação B, ou C. É urgente, sim, um projeto de país, com uma nova economia, com soberania e democracia, o que tem que ser construído acima e além dos processos eleitorais, mesmo o presidencial. Ninguém sabe ou tem como saber como o Brasil e o mundo estarão no final de 2021, que dirá durante ou ao final de 2022.
Há uma profunda crise econômica, social e ambiental, que deverá se aprofundar em 2021. Mais fome, mais miséria, mais desemprego, mais depredação ambiental, é o que já está acontecendo e continuará em 2021. O Auxílio Emergencial, que ajudou milhões de brasileiras e brasileiros a sobreviver em 2020, vai acabar. Portanto, a indecente desigualdade social vai crescer, assim como a população de rua, o povo das periferias pedindo comida, trabalhadoras e trabalhadores aceitando qualquer coisa ou bico para ter o que comer no dia seguinte.
A pandemia do coronavírus está assustadora no Brasil em dezembro de 2020. Quase 200 mil mortes. E todos os sinais são de que vai levar mais muitas vidas nos próximos meses. A vacina salvadora está no horizonte ou já sendo aplicada na população em outros países. No Brasil, diante do negacionismo do governo federal, se tudo correr bem, haverá vacina para todo mundo na metade de 2021. Mobilização de massa por ‘vacina já’ para toda população é uma das prioridades.
O fascismo, a intolerância, o ódio, os preconceitos, a violência contra as mulheres e a população negra, os assassinatos estão presentes e crescentes no dia a dia. Nada indica que serão superados no curto prazo. Ou seja, há uma sociedade movida a dor, tristeza e sofrimento.
Como, pois, pensar, e preparar as eleições de 2022 neste contexto e conjuntura?
As urgências urgentíssimas são outras.
Por exemplo, construir a mais ampla unidade popular para enfrentar a fome, a miséria e o desemprego, ante a inação dos governos, especialmente o federal. Fortalecer os Comitês Populares contra a Fome, a Miséria e contra o Coronavirus, que nas periferias garantiram o pão de cada dia, a quentinha, a cesta básica em 2020. Solidariedade deve ser palavra chave na boca da militância e dos homens e mulheres de boa vontade em 2021.
Combater o racismo estrutural é outra urgência urgentíssima. Chega de Marielles, Betos, Janes, Rebeccas, Emilys, outras tantas e tantos!
2021 pode e deve ser o ano da solidariedade, da pedagogia libertadora, aproveitando a celebração do centenário de Paulo Freire em 19 de setembro de 2021. E juntar ao centenário de Paulo Freire a Sexta Semana Social Brasileira, promovida pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), cujo tema central é TERRA, TRABALHO, TETO, UM MUTIRÃO PELA VIDA! E todo mundo participando da organização de um grande FSM, Fórum Social Mundial, virtual desta vez, de 25 a 29 de janeiro de 2021. Para começar bem o ano, dizendo, gritando, anunciando ‘um outro mundo possível’, urgente e necessário.
São iniciativas populares que enfrentam o caos social e constroem a unidade na prática e na vida. Movimentos populares, movimento sindical, partidos políticos, igrejas, mandatos coletivos e populares eleitos em novembro, instituições da sociedade civil estão chamados, convocados a juntarem todas as suas forças e militância para este mutirão pela vida em 2021.
Em meio à solidariedade e à ação social militante, com trabalho de base, é necessário e possível fazer muita formação política, muitos processos de organização dos mais pobres, que são milhões. Junto com a ação militante, a construção de um projeto estratégico para o Brasil pode tornar-se realidade, com participação e unidade das forças democráticas e populares e das esquerdas.
Colocar a vida em primeiro lugar, em vez da economia. O capitalismo predador pode e deve ser colocado em xeque, desnudado em 2021.
2022 será construído de baixo para cima, na força e unidade popular, mais como movimento, menos como instituição. O povo organizado enfrentará o fascismo reinante, garantirá a democracia e a soberania nacional, construirá uma economia popular e um projeto de Nação.
(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990). Em onze de dezembro de dois mil e vinte
