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6 de agosto de 2012
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08:59

A expansão do crédito no Brasil

Por
Sul 21
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O crédito bancário no Brasil apresentou nos últimos anos uma extraordinária expansão, passando de 25,8 % do PIB em 2001 para 50,1% em maio de 2012, o que representou um crescimento sobre o PIB de 94%, período em que o PIB cresceu 41%. Tudo junto representou um crescimento real médio em relação ao deflator do PIB de 10,6% ao ano. Entre 2003 e 2011, o crédito para as pessoas físicas apresentou uma expansão média de 21,8% ao ano, ou seja, três vezes o crescimento da massa salarial.

Segundo alguns economistas, o endividamento brasileiro, de 50,1% do PIB, é ainda baixo, se comparado aos padrões internacionais, onde em muitos países supera 75% ou mais. Ocorre que no caso brasileiro, pelo fato de a renda da maioria da população ser baixa e os juros (mesmo com o declínio recente) serem altos, o serviço da dívida (amortização mais juros) consome em torno de 23% da renda líquida, o dobro ou até mais, da percentagem dos países de maior endividamento.

Muito contribuiu para a expansão do endividamento o financiamento de veículos, em muitos casos com prazos que chegaram até 96 meses, período em que acumula o pagamento das prestações com as despesas de reparação dos bens. Outro fator foram os empréstimos consignados, que, apesar de evitarem a inadimplência, facilitam o endividamento.

Estudo recente da Fundação Getúlio Vargas, em pesquisa amostral feita em sete capitais brasileiras, constatou que 9% das dívidas estão com um atraso superior a 30 dias, percentual esse que atinge 19,1%, nas classes de renda mais baixa. Quanto à modalidade da dívida que estava em atraso, os mais citados foram: cartão de crédito, como 48,2%; crédito pessoal, com 10,4%; e outras dívidas, com 24,7%. Os cartões de crédito são os que cobram os juros mais altos.

Segundo essa mesma pesquisa, 48,5%, ou praticamente a metade dos brasileiros, desrespeita o princípio basilar de finanças, pois gasta mais do que ganha, incluindo nesse gasto os cartões de crédito, cheques pré-datados, carnês de lojas, empréstimos pessoais e financiamentos em geral.

O jornal Zero Hora de 22 do corrente traz uma matéria onde mostra que a taxa de inadimplência do Estado do RS em 2012 está em 11,6%, igual ao patamar atingido na crise de 2009, passando de 10,5% em 2010 e 10,8% em 2011. A mesma matéria aponta o grau de comprometimento da renda familiar com o pagamento de dívidas em 2011 nas capitais da Região Sul, sendo 26,4% em Curitiba, 26,3% em Florianópolis e 31,2% em Porto Alegre, que apresenta a maior taxa.

Esse comprometimento da renda pessoal com dívidas é uma das causas do baixo crescimento atual da economia nacional, além da redução do ritmo de crescimento chinês e das economias do primeiro mundo. Paradoxalmente, a massa salarial continua crescendo, o que pode ajudar a reverter essa situação.

O uso do crédito não aumenta a renda dos consumidores, apenas transfere do futuro para o presente a capacidade de consumir. No futuro terá que ser pago o principal do empréstimo acrescido de juros

Ganhos e gastos não necessitam ser igual no mesmo momento, mas se houver mais gastos no presente, no futuro os gastos serão necessariamente menores que os ganhos. É claro que nesse lapso de tempo tem que se considerar o crescimento da renda pessoal.

Se 23% da renda líquida do brasileiro é utilizada no pagamento do serviço da dívida, sua renda líquida efetiva é hoje 77% do que era antes da assunção das dívidas. Na hipótese de que não ocorra um crescimento de renda pessoal que compense essa redução, o resultado será uma queda do poder de compra das pessoas. E é isso que está ocorrendo no Brasil atualmente.

Outro aspecto importante de quem contrai dívidas é fazer uma reserva para pagá-las. É o que se chama de superávit primário na administração pública. E, se isso não for observado, o resultado é o endividamento crescente.

Como tudo na vida sempre há os dois lados. O crédito pode ser um bom ou um péssimo negócio, dependendo da finalidade e das condições. Poderá ser um bom negócio, quando feito para adquirir um bem durável e em condições de pagamento favorável. Será um péssimo negócio, quando obtido para financiar despesas do quotidiano, cujo pagamento no futuro ocorrerá cumulativamente com as despesas da ocasião.

Por tudo isso, temos que ter muito cuidado a avalanche de oferta de crédito que ocorre sistematicamente, que, pode prejudicar a economia familiar e, dependendo de sua dimensão, a economia do País.

Darcy Francisco Carvalho dos Santos é economista, contador com especialização em comércio internacional e integração econômica. Foi contemplado em três oportunidades pelo Prêmio do Tesouro Nacional sobre finanças públicas. www.darcyfrancisco.com.br e [email protected].


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