Colunas
|
17 de maio de 2012
|
08:58

Grécia – sinal de novos tempos

Por
Sul 21
[email protected]

Nas eleições gerais do próximo dia 17 de junho, na Grécia, há uma possibilidade concreta de vitória da coalizão de esquerda anticapitalista Syriza, que corretamente é definida pela Carta Capital como o equivalente grego do PSOL brasileiro. Syriza tinha há pouco tempo cerca de 4% dos votos, ficou em segundo lugar nas últimas eleições com aproximadamente 16% do eleitorado e agora desponta com 25% das intenções. Isso não é gratuito. Mostra que a Grécia é o ponto mais alto da situação mundial, a expressão mais clara das contradições do regime do capital e das possibilidades da luta anticapitalista. Por isso mesmo nossa camarada Luciana Genro embarcou para Atenas e tem nos mantido informado a partir dos contatos diretos e diários com nossos amigos do Syriza.

Na Grécia, o equivalente ao PT brasileiro fracassou. Quando o governo social liberal da aburguesada social-democracia grega assumiu – depois da vitória eleitoral de 2009, com a clara intenção de manter o modelo econômico do governo conservador anterior – sua base social começou a se evaporar. As contas não fechavam. A maquiagem feita pelo Goldman Sachs nas contas do governo para garantir a entrada da Grécia na Zona do Euro revelou-se uma das maiores fraudes da história. Uma vez mais, ficava claro que a corrupção é inerente ao funcionamento do sistema. A confiança na capacidade de pagamento do governo ruiu, e a dívida grega não podia mais ser rolada, a não ser com novos aportes de capital. Não poderia ser diferente. Depois da crise de 1929, surgiu nos meios financeiros um ditado que diz: “se o crédito é de 100.000 dólares, o devedor sofre de insônia, mas, se o crédito é de 10 milhões de dólares, é o credor que não dorme mais”. Atualmente os números do cassino financeiro se multiplicaram, certamente a dívida grega faz os credores da Alemanha e da França perderem o sono. São os recursos dos seus bancos que estão indo para o ralo na crise grega.

Aliviar as tensões provocadas por essa clara ameaça de default é a razão de todos os pacotes de ¨ajuda¨ aprovados pelo governo da Alemanha e seus aliados europeus. Naquela oportunidade até o governo brasileiro também resolveu dar sua ¨mãozinha¨, uma demonstração simbólica de sua parceria com o sistema financeiro mundial. Com a conversa de ajuda à Grécia, deu cerca 300 milhões que já foram drenados para os cofres dos bancos alemães e franceses.

De lá para cá, as contrapartidas que os governos exigiram da Grécia foram a aplicação de um plano de ajuste draconiano contra o povo. O resumo da ópera é incrível: ajudaram a Grécia para que país não deixe de pagar seus bancos e em contrapartida exigem que o governo retire recursos de seu próprio povo para reembolsá-los novamente. Os sucessivos governos gregos – seja os socialdemocratas em seguida dos conservadores – aceitaram porque não querem abandonar o modelo econômico de privilégios para uma minoria, a burguesia e a alta classe média grega, em detrimento da maioria esmagadora da população.

A política de moeda única impede que os países da Zona do Euro desvalorizem suas moedas. Estão impossibilitados de desenvolver uma política monetária autônoma. Este fato tem duas consequências. Por um lado, a maior produtividade do trabalho da Alemanha, produto de um maior desenvolvimento técnico, tem permitido altos superávits comerciais, capazes de compensar o arrocho salarial promovido pela burguesia alemã contra seus próprios trabalhadores. A Alemanha somente perde para a China na soma de valores exportados, realizando sua produção nos mercados dos países europeus – Grécia incluída – e garantindo assim a acumulação do capital alemão.

A segunda consequência é que os demais países europeus não podem compensar sua menor produtividade e sua balança comercial com desvalorização da moeda. E sem esta possibilidade de desvalorização da moeda tampouco podem disfarçar seus ataques ao nível de vida da população, isto é, segundo os interesses capitalistas, reduzir por essa via seus custos de produção e seus gastos fiscais. Assim, os capitalistas e seus governos na Grécia, na Espanha, na Itália, em Portugal, mas logo também na França e na Alemanha, são levados a atacar abertamente o salário social e, pelo menos já no caso grego e espanhol, a reduzir nominalmente os salários, medida – segundo posição do próprio Keynes, economista mestre para salvar o capitalismo das crises – de muito mais difícil execução.

Diante de tais ataques, vimos a resistência dos trabalhadores, das classes médias empobrecidas, da população grega. Foi essa resistência que abriu caminho para o crescimento político da esquerda anticapitalista. Nas últimas eleições deixou para trás a socialdemocracia, que em três anos passou de primeiro lugar para terceiro. Agora, as pesquisas dão maioria para a coalizão Syriza. Isso confirma que ocorreu, a partir de 2008, um giro histórico na situação mundial. A terra de nascimento de gênios como Sócrates, Platão e Aristóteles, onde floresceu a filosofia e a cultura da qual bebemos ainda hoje, agora, mais de dois mil anos passados, esta confirmando este novo tempo histórico.

Não se trata de prever um cenário de estabilidade e de paz social, mas de inúmeros conflitos. Mesmo a extrema direita grega vai se organizar e militar ativamente, aliada com os capitalistas, contra qualquer mudança de verdade. Mas a Grécia não ficará sozinha. A possibilidade de uma vitória da esquerda nas eleições certamente abrirá um cenário novo. É certo que nos próximos meses e durante pelo menos alguns anos veremos fortes confrontos de classe nas cidades do Velho Mundo. O proletariado europeu não aceitará tranquilamente entregar suas conquistas sociais. Teremos bons exemplos para que nós, trabalhadores e jovens brasileiros, nos indignemos aqui também.

Roberto Robaina é da Direção Nacional do PSOL e pré-candidato à Prefeitura de Porto Alegre


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora