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16 de outubro de 2015
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17:33

Fórum de Mobilidade Humana pede providências em caso de haitiano morto pela BM

Por
Sul 21
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Fórum de Mobilidade Humana
Seminário de Mobilidade Humana contou com a presença de migrantes de diversos países | Foto: Elton Bozzetto

Débora Fogliatto

O IV Seminário de Mobilidade Humana do Rio Grande do Sul discutiu, nesta quinta-feira (15), a situação dos migrantes no Estado. O documento final do evento exige uma série de medidas por parte do poder público, nas três esferas, para incluir de forma plena as pessoas que chegam ao país, especialmente vindas do Haiti e de nações africanas. Outro pedido feito na carta é que se apure as responsabilidades no caso de violência que resultou na morte um jovem haitiano em Flores da Cunha, morto pela polícia na semana passada.

Proposto pelo Fórum Permanente de Mobilidade Humana, o Seminário discutiu também casos de racismo que afetaram os imigrantes nos últimos meses. Este foi o quarto ano em que aconteceu o evento, desta vez com o tema “Migrações: Interculturalidade, Direitos Humanos e Paz”. Dentre os temas debatidos estiveram “Interculturalidade e políticas públicas” e “Direitos humanos e desafios no enfrentamento de suas violações”. O Fórum de Mobilidade Humana é um espaço permanente de articulação e organização em defesa dos direitos das pessoas em mobilidade, especialmente as que se encontram em situação de vulnerabilidade.

Um dos pontos levados na situação foi a questão do acesso a direitos e políticas públicas por parte dos imigrantes e refugiados. A advogada Tâmara Biolo Soares, da Frente Ampla por Direitos e Liberdades, que ficou responsável por redigir o documento final do evento, apontou que, em sua opinião, “o poder público parece ainda tratar essa questão da recepção como se fosse uma novidade, e a gente tem que superar essa condição”.

Este fluxo migratório já acontece há anos, segundo ela, e as políticas públicas existentes não dão conta de acompanhá-lo. “Precisamos de mais medidas, de inclusão nos programas sociais existentes ou criação de novos. E de apuração dos responsáveis pelos casos de violência. Precisamos que o poder público responda e responsabilize essas pessoas para que não crie um clima de impunidade”, apontou.

Além do medo de novos episódios como a morte do jovem haitiano em Flores da Cunha, os imigrantes também relatam casos de intimidação policial sofrida em diversas cidades por aqueles que trabalham como vendedores ambulantes. “Isso é uma forma legal de geração de renda e eles têm que ter essa possibilidade”, disse Tâmara. O haitiano Jean Fritz St Fleur, que vive no Brasil há dois anos, também trouxe essa demanda por parte de seus compatriotas. “Temos que ver com os governos, em relação aos imigrantes que estão vendendo na rua, quais são as medidas que vão tomar. Porque os policiais estão pegando as coisas deles e eles não estão fazendo nada errado”, relatou.

Seminário construiu carta com exigências e pedidos para o poder público | Foto: divulgação
Seminário construiu carta com exigências e pedidos para o poder público | Foto: Elton Bozzetto

Em sua fala, Jean destacou o amor entre os povos haitiano e brasileiro, lembrando que quando aconteceu o terremoto em seu país de origem, o Brasil foi um dos que mandou ajuda humanitária. Além disso, o país se dispôs a acolher os refugiados e imigrantes oriundos de lá. “Antes de começar a falar das medidas que temos que tomar contra a violência e em relação aos direitos humanos, temos que falar sobre o amor. Os brasileiros foram lá e ajudaram, isso começou o relacionamento entre os dois países”, acredita.

Agora, quando o Brasil abre as portas para os haitianos em situação vulnerável, precisa se comprometer com a sua segurança, mencionou Jean. “Agora abriram as portas para nós virmos para cá, então temos que estar seguros. Não podemos ficar quietos sobre o que está acontecendo agora. O povo brasileiro mesmo não está gostando desse gesto de violência”, disse, sobre a morte do jovem em Flores da Cunha.

Jean mora em Caxias do Sul, na serra gaúcha, onde há cerca de dois anos passou a haver uma forte presença de imigrantes haitianos e senegaleses. “Algumas das dificuldades encontradas pelos imigrantes estão relacionadas a esse recorte étnico-racial, pois se trata de pessoas principalmente negras, que são ou afro-descendentes ou africanos”, afirmou a coordenadora do Centro de Atendimento ao Migrante da cidade, Maria do Carmo Gonçalves, referindo-se a casos de racismo mencionados pelos imigrantes. Uma comitiva de 15 pessoas veio da cidade para acompanhar o Seminário, que aconteceu no Palácio da Justiça. Além de Jean, também deram seu depoimento imigrantes de Guiné-Bissau, Senegal e da República Dominicana.

Morte de haitiano em Flores da Cunha

O jovem Jean Wesly Moriseme, 28 anos, foi morto na semana passada pela Brigada Militar de Flores da Cunha. O imigrante haitiano teria participado de diversas ações que exigiram a presença da polícia. Na quarta-feira (7), ele teria provocado confusões no Centro de Caxias do Sul, o que teria sido relatado por outros haitianos e, na tarde do mesmo dia, retornou para Flores da Cunha, onde vivia, e brigou com outros dois imigrantes em frente à rodoviária. Ele foi preso nesta situação, mas liberado no mesmo dia. Em seguida, foi encaminhado para o Hospital Fátima, onde recebeu medicação.

Após ser solto, ele teria se envolvido em outras desordens ao longo do dia, que culminaram na abordagem fatal da BM. Por volta das 23h30, ele teria começado a atirar lixo em carros que passavam e virar latas pela rua. Ao se dirigir ao local para conter o homem, um dos policiais teria sido ferido por ele. Segundo a versão da Brigada, após tentar contê-lo com spray de pimenta, um brigadiano atirou na perna de Jean para se proteger. Ele foi levado para o hospital, mas não resistiu ao ferimento. Há a suspeita de que o haitiano estivesse em surto psicótico e apresentasse quadro de depressão.

 

 


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