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12 de junho de 2015
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18:48

“Terceirização é o caminho para o trabalho infantil”, aponta auditor-fiscal do trabalho

Por
Sul 21
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Foto: Agência Brasil
Grande parte da exploração infantil está em áreas agrícolas | Foto: Agência Brasil

Débora Fogliatto

Embora o trabalho infantil tenha diminuído consideravelmente nos últimos 20 anos no Brasil, com uma redução de 56% dos casos, ainda havia, em 2011, 3 milhões e 700 mil crianças nestas condições. Apenas no Rio Grande do Sul, são 351.940, segundo dados de 2013 do IBGE. Neste Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul e o Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil apresentaram, em Porto Alegre, estatísticas e análises a respeito do tema.

Em 1992, o país tinha um número alarmante de 8 milhões e 500 mil crianças trabalhando, quando começou a “reconhecer que vivia um problema sério, e assim passou a enfrentar com firmeza esse problema”, conforme explicou o procurador-chefe adjunto do Ministério Público do Trabalho no RS, Rogério Fleischmann.

Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Fleischmann (D) destacou que há ainda o tráfico e a prostituição, que por serem ilícitas não há estatísticas | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

A tendência é que o número já tenha diminuído mais desde 2011, especialmente graças a políticas sociais para manter crianças e adolescentes nas escolas. A maioria das crianças e adolescentes que trabalham (80%) tem entre 14 e 17 anos. Há ainda uma estatística “escondida”, segundo Fleischmann, de exploração infantil para tráfico e prostituição, que não é possível rastrear números.

Após os 14 anos, há a possibilidade de se ser menor aprendiz, o que é regulamentado pela lei, e a partir dos 16, o trabalho é legalizado. No entanto, há algumas atividades que podem e outras que não podem realizar. “É preciso tomar cuidado com a exploração”, apontou o auditor-fiscal do Trabalho Roberto Padilha Guimarães. Ele observou que há diversas causas para o trabalho infantil, como a pobreza, a sociedade do consumo, a preferência de crianças para certas atividades, a terceirização e quarteirização. “Temos que tomar cuidado com esse projeto que está tramitando. A terceirização é o caminho para o trabalho infantil”, afirmou, destacando que quanto mais o vínculo empregatício se afasta do núcleo inicial, mais precárias são as condições de trabalho e mais provável é a exploração.

O auditor apresentou dados sobre a situação estadual, onde grande parte das crianças que trabalham estão no campo. Aqui, também houve diminuição nos últimos anos. Segundo os dados do PNAD IBGE, enquanto em 2004 eram 103.956 crianças de 5 a 13 anos, em 2013 o número passou para 36.402; de 14 a 15 anos, eram 95.351 em 2004, e 46.699 em 2013; já entre 16 e 17, de 118.949, passou-se para 92.869. Isso representa uma diminuição de 44% nestes nove anos. Este número exclui os jovens aprendizes a partir dos 14 anos e trabalhadores com CTPS/aprendizagem a partir dos 16.

Guimarães também trouxe dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) sobre as atividades econômicas com maior quantitativo de trabalhadores entre 10 e 15 anos. A predominância é de atividades não especificadas no ramo da agricultura (12,22%), criação de bovinos (7,84%), serviços domésticos (6,46%), cultivo de fumo (6,36%) e comércio de produtos alimentícios, bebidas e fumo (4,12%). Em números relativos, o maior percentual deste tipo de trabalho está no norte e nordeste do Estado, em regiões de pequenas propriedades rurais e de fumo.

Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Guimarães apresentou dados estaduais, onde houve diminuição de 44% | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Ao identificar essas situações, o MTE autua o empregador, determinando o afastamento da criança ou adolescente da função realizada, além de encaminhar para os órgãos responsáveis, como os de assistência social, Delegacia da Criança e Adolescente e Conselho Tutelar. De 2012 até maio de 2015, o Ministério realizou 2.116 ações especiais de fiscalização de trabalho infantil, onde encontraram 1.645 crianças e adolescentes em situação irregular e admitiram 52.038 aprendizes após ação da fiscalização. Estes números incluem apenas o grupo especial, e não a totalidade de ações do MTE nesses casos.

O órgão já encontrou casos de explorações diversos, como grandes empresas do setor de calçados que produziam em barracões no meio do campo, além de adolescentes trabalhando em extração de cana de açúcar e produção de carvão. Atualmente, o MTE investiga uma grande empresa que tem vários casos de jovens com queimaduras. A questão da saúde foi trazida com mais detalhes pelo Secretário-Adjunto da Saúde do Rio Grande do Sul Francisco Paz, que mencionou que a cada dia, acontecem dois acidentes de trabalho em menores de 18 anos.

Ele lembrou que o combate ao trabalho infantil também passa por uma mudança cultural, pois até os anos 1950 e 60 era considerado “dignificante”. “Era colocado como algo nobre, bom as crianças trabalharem desde cedo. Era comum crianças serem acolhidas em casas de famílias mais ricas para realizar trabalhos domésticos”, contou. Os malefícios do trabalho para a saúde são diversos, especialmente de mutilação e ferimentos no punho e na mão. Além disso, as crianças não têm o sistema ósseo-muscular desenvolvido, nem o sistema respiratório; e a pele é mais sensível.


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