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12 de maio de 2011
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02:57

Guerra fiscal: estados, trabalhadores e cidadania feridos

Por
Sul 21
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Faz parte do ideário socialdemocrata o incentivo às empresas, como forma de aumentar a produção, o emprego e o bem-estar coletivo. Por meio da ação do Estado, utilizando os incentivos fiscais, buscam-se formas de regular a economia e de direcionar a produção e o consumo. Os setores econômicos que merecem ter o desenvolvimento incrementado são incentivados. Da mesma forma, os setores cujo desenvolvimento precisa ser contido deixam de receber incentivos públicos.

Incentiva-se, por exemplo, o crescimento dos setores com maior agregação de conhecimento e valor ao produto final, como o dos produtos eletrônicos, ou os que produzem para o mercado externo ou, dependendo da conjuntura, para o mercado interno. Não se incentiva, por outro lado, o crescimento dos setores primários da economia, como os produtores e exportadores de matérias primas não processadas ou redireciona-se, por meio de incentivos, a produção destes mesmos setores para o mercado interno.

De maneira geral, o incentivo econômico ocorre por meio da concessão de crédito barato e de longo prazo, quase sempre subsidiado pelo Estado, da renúncia fiscal e até por meio da concessão de incentivos monetários diretamente aos consumidores e usuários, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas. Exemplos deste último tipo de incentivos são o programa bolsa família, as bolsas de estudos e a concessão de crédito a países estrangeiros para a compra de produtos do país concedente.

Todas estas formas são utilizadas no Brasil e foram ampliadas e intensificadas nos últimos anos. Quase todas as formas de incentivo exigem contrapartida dos que os recebem. Como ocorre com a exigência de permanência na escola e a vacinação dos filhos, no programa bolsa família, a obtenção de conceitos elevados nos cursos e pós-graduação, nas bolsas estudantis, e a permanência no emprego por período igual ao do recebimento da bolsa, para os funcionários públicos que recebem bolsas de formação profissional.

Com relação às empresas, que são pessoas jurídicas, as contrapartidas são ainda mais necessárias, pois os incentivos representam investimentos ou renúncias muito mais elevadas do que as concedidas às pessoas físicas. No caso dos incentivos fiscais concedidos pelo Estado do Rio Grande do Sul, a renúncia fiscal atingirá a cifra de R$ 11,5 bilhões em impostos não arrecadados em 2011, o que representa um terço do total a ser arrecadado pela Fazenda estadual.

Um Estado com problemas de caixa, como o Rio Grande do Sul, não pode se dar ao luxo de abrir mão de receitas desta monta, sem exigir contrapartida das empresas que recebem incentivos. A geração de empregos e a permanência por tempo pré-determinado no estado ou na região onde a empresa vai se instalar ou encontra-se instalada são requisitos mínimos. A saída da Vulcabrás/Grendene de Parobé, depois de ter recebido cerca de R$55 milhões ao longo de anos, sem nenhuma explicação prévia e sem nenhum ressarcimento aos cofres públicos, reacende a discussão sobre incentivos e pode levar o governo estadual a rever a política praticada até aqui.

É bem-vindo o movimento iniciado pelas 28 entidades que integram a União Gaúcha em Defesa da Previdência Social e Pública visando uma maior transparência na concessão de incentivos fiscais. É alentadora a postura do atual governo do Estado do Rio Grande do Sul de buscar outros modelos de indução de investimentos que não sejam centralizados nos incentivos fiscais, conforme manifestação do secretario estadual de Planejamento, João Mota.

Além da revisão da legislação estadual e da política de incentivos praticada pelo Rio Grande do Sul, entretanto, será fundamental que seja revista toda a legislação fiscal e tributária nacional. Enquanto for permitido que os diferentes estados da federação disputem entre si, concedendo incentivos para atrair empresas por meio da renúncia de parcelas de ICMS, a chamada guerra fiscal continuará existindo e os estados continuarão à mercê dos humores e/ou dos interesses das empresas.

Sem uma reforma fiscal eficiente, os mortos e os feridos nesta guerra continuarão sendo os estados, que abrem mão de parte de seus recursos e não têm como exigir contrapartidas das empresas, os trabalhadores, que não têm garantia de seus empregos, e, claro, o conjunto da cidadania, que paga integralmente seus impostos e não tem como receber a contrapartida dos serviços adequados, já que os recursos públicos disponíveis são quase sempre insuficientes para provê-los.


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