Opinião
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3 de junho de 2024
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16:03

O sofrimento dos gaúchos não tem nada a ver com ideologia (por Antônio Vicente Martins)

Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Antônio Vicente Martins (*)

Começo escrevendo sobre o sofrimento dos gaúchos. O sofrimento que todos  estamos vivendo e sentindo não é possível de ser descrito. Faço esta introdução  para rebater a afirmativa ideológica feita por conhecido assessor de entidades  empresariais de São Paulo que escreveu que o sofrimento dos gaúchos está  agravado pela ideologia. No texto ele sustenta que o Governo Federal deveria  autorizar a imediata e indiscriminada aplicação da Lei 14.437/2022 e que  estabelece inúmeras medidas que autorizam a precarização da legislação  trabalhista, de forma unilateral pelas empresas, mas que necessitam de edição  de medida regulatória do Ministério do Trabalho.  

O “preocupado” assessor empresarial acusa o governo federal de não editar  medida regulatória por ter sido a Lei 14.437/2022 aprovada no governo anterior.  Praticante de preconceito ideológico explícito, o autor de larga experiência  manipulatória das palavras, se apresenta como um neutro, julgando o que é feito  ou deixado de fazer pelos outros, sempre imputando comportamento ideológicos  para os que pensam diferente dele ou para os que pretendem defender direitos  trabalhistas.  

Não há como concordar com tais acusações infundadas. Não é por ideologia e  ranço anti-democrático que o Governo Federal não editou a norma que poderia  e deveria editar tratando das relações de trabalho no âmbito da calamidade  climática que atinge o estado do Rio Grande do Sul. O Governo Federal está  tratando a emergência climática sentida por todos os gaúchos sem nenhuma  coloração partidária, tem sido atento e solidário com o Governador Eduardo  Leite, com prefeitos de todas as cidades atingidas, independentemente de suas  afiliações partidárias. Portanto, a linha de raciocínio adotada pelo autor e  assessor jurídico empresarial é injusta e leviana, talvez porque ele não esteja  sentindo o tamanho de nossa tristeza, de nossas perdas.  

Mas, uma coisa é preciso que se diga. O Governo Federal na área do trabalho está sendo omisso. Escrevo isto com dor no coração porque todos sabem que  tenho vinculação muito forte com a assessoria jurídica de sindicatos de  trabalhadores. É inaceitável que o Ministro do Trabalho, do Presidente Lula, não  tenha vindo uma vez sequer visitar o Rio Grande do Sul, ouvir os trabalhadores,  as representações sindicais, os representantes empresariais, ver o tamanho da  perda que milhões de pessoas tiveram. O Presidente Lula já veio 3 vezes ao  Estado no último mês, montou base de operações no Rio Grande do Sul,  enviando todo tipo de ajuda, criou linhas de créditos para empresas, mas o  Ministro do Trabalho permanece em seu gabinete de Brasília. Ninguém pode  entender o tamanho do problema se não estiver presente, se não conversar com  as pessoas atingidas, se não colocar o pé no barro, não escutar a comunidade,  os trabalhadores, as empresas. 

É possível adotar medidas de emergência em proteção de emprego e renda. A  proteção do trabalho é a dignidade do ser humano. Nem a pandemia da COVID  19 implicou tamanha destruição como as enchentes decorrentes da crise  climática. Defender que acordos e convenções coletivas tenham prevalência  absoluta sobre dispositivos legais, independente de adoção de medidas  compensatórias que preservem os trabalhadores pode ser até mesmo  desproporcional com toda a perda que as pessoas estão tendo. Ninguém vai  ganhar. Todos estamos perdendo. Todos teremos que reconstruir a vida, é  preciso viabilizar a continuidade da atividade empresarial sem descuidar um  milímetro de defender a vida.  

(*) Advogado, Assessor Jurídico do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região

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