Opinião
|
25 de maio de 2024
|
19:08

Governo Melo manteve a extinção do DEP e a cidade colapsou (por Jonas Reis)

Bairro Menino Deus, em Porto Alegre (Foto: Isabelle Rieger/Sul21)
Bairro Menino Deus, em Porto Alegre (Foto: Isabelle Rieger/Sul21)

Jonas Reis (*)

Porto Alegre está vivendo o caos dentro do caos. Após três semanas de enchente, quando parte da cidade buscava voltar a normalidade, o caos se instalou novamente. Negligência e improviso imperaram.

Nos bairros atingidos pela enchente, a água começou a voltar pelos bueiros, provocando novos alagamentos. Enquanto isso, em áreas não atingidas pelo Guaíba, os alagamentos foram provocados pela obstrução das redes pluviais, atingindo bairros da zona norte e sul, como: Restinga, Hípica, Cavalhada, Vila Nova, Jardim Itu, entre outros. A imagem mais paradigmática desses alagamentos foi o Parque Farroupilha (Redenção) tomado pelas águas.

Mas o caos vivido pela cidade na quinta-feira (23), não foi obra da natureza, foi consequência da inoperância e incompetência do governo Melo, principalmente da direção do DMAE.

Em entrevista coletiva concedida junto com o prefeito Sebastião Melo, na tarde de quinta-feira (23), em meio ao caos, o diretor-geral do Dmae, Maurício Loss, alegou surpresa em relação à quantidade de chuva naquele dia. Assim, justificou o despreparo frente a subida das águas.

Entretanto, em alerta enviado por celular, às 23h04min do dia 22 (véspera), a Defesa Civil informava: “Chuva intensa, ventos acima de 80 km/h, descargas elétricas e queda de granizo. Val até as 10h da quinta. Emerg Ligue 190/193.”

Ora, o alerta da Defesa Civil, válido até as 10h de quinta-feira, alertava para chuva intensa. Portanto, o argumento da surpresa formulado pelo diretor Loss, na mesma tarde, não é aceitável e não serve para justificar o despreparo. Soou como deboche ao povo.

Portanto, a alegação de surpresa do diretor-geral do Dmae, não é a primeira bola-fora do Sr. Loss. Na tarde do dia 2 de maio, em entrevista à Rádio Gaúcha, quando foi questionado se os comerciantes do Centro deveriam levantar as mercadorias, o Sr Loss respondeu: “não, nós estimamos que vai dar certo” e justificou que as casas-de-bombas dariam conta. No dia seguinte (3), casas-de-bombas paralisaram e a água tomou conta do Centro através dos bueiros, atingindo comércios, residências e veículos.

Os problemas de gestão do diretor-geral do DMAE não ficaram restritos às suas previsões equivocadas, e a lista é grande:

1º -Desconsiderou e se omitiu frente ao relatório de engenheiros do DMAE, em processo SEI, sobre os problemas em casas de bombas e apontando soluções;

2º -Três semanas após o início da enchente, apenas 11 das 23 casas de bombas estão funcionando, devido à incompetência gerencial da direção do DMAE;

3º- O diretor-geral continuou a operar a política de sucateamento do departamento promovida pelo prefeito Melo. O DMAE tem, hoje (dados de março no site da Transparência), 1.055 servidores e 2.577 cargos vagos. Esta defasagem fenomenal explica boa parte dos problemas operacionais no saneamento;

4º- A falta de pessoal está levando o adoecimento dos servidores, que estão há cerca de um mês trabalhando em ambiente úmido, quando não dentro da água, e realizando horas extras para atender a população da capital;

5º – Outra consequência da falta de pessoal é a excessiva terceirização, com trabalhadores mal pagos e alta rotatividade, comprometendo a qualidade do serviço prestado;

6º- Enquanto a população do Sarandi continua em abrigos, pois as suas casas ainda estão alagadas, o Dmae colocou bombas emprestadas para retirar a água do entorno de grandes empresas da região.

7º – Após o recuo das águas nos bairros Menino Deus, Cidade Baixa e Praia de Belas, a direção do DMAE não tomou nenhuma iniciativa para mapear a obstrução das redes pluviais (entulhadas por detritos da enchente). Embora exista tecnologia, já utilizada pelo DMAE, para colocar câmeras no interior da rede para identificar os pontos de obstrução;

8º – A atual direção do departamento não tomou nenhuma medida para enfrentar o “espalhamento” de engenheiros do antigo Departamento de Esgotos Pluviais por diversos setores do DMAE, despotencializando a inteligência acumulada ao longo dos anos no antigo DEP;

9º – Enquanto a cidade está alagada, o DMAE tem R$ 430 milhões aplicados no sistema financeiro, dinheiro que deveria ser utilizado na manutenção das comportas, modernização das casas de bombas, instalação de geradores, manutenção permanente e qualificação dos diques do Sarandi, dragagem permanente dos arroios, manutenção das redes de microdrenagem e realização de projetos para melhorar a macrodrenagem.

Porém, o mais grave é a manutenção da drenagem urbana subordinada à diretoria de tratamento. Uma cidade como Porto Alegre, banhada pelo Guaíba e pelo Gravataí, com 65 quilômetros de diques de proteção, 23 casas de bombas, por aproximadamente 2,5 mil quilômetros de redes pluviais, mais de 120 mil bocas de lobo e poços de visita, não pode ter a drenagem urbana tratada como terceiro escalão. Porto Alegre já teve a drenagem no primeiro escalão, com o DEP, que se reportava diretamente ao prefeito.

Para enfrentar a crise atual, a capital deve voltar a ter um órgão de primeiro escalão responsável pela drenagem, ou, no mínimo, uma diretoria específica no DMAE, com estrutura e recursos humanos próprios, dedicados exclusivamente à drenagem urbana. Tudo isso ocorre em um contexto de negacionismo climático, de aprovação indiscriminada de loteamentos em áreas com vegetação nativa e banhados, e de transferência das responsabilidades para o governo federal, promovida pelo governo Melo, responsável pela nomeação e manutenção do Sr. Loss à frente do DMAE.

Diante desse quadro de descontrole e incompetência gerencial que levou a cidade ao caos pela segunda vez, o diretor-geral e o seu adjunto (foi diretor-geral na gestão do ex-prefeito Marchezan), não tem mais condições de permanecer à frente do DMAE. Não há outra medida a ser tomada que não seja o imediato afastamento do diretor-geral, Maurício Loss, e de diretor-geral adjunto, Darcy Nunes dos Santos, falsos gestores, que deixaram a cidade entrar no caos e demonstraram não ter conhecimento na área de saneamento, principalmente na drenagem urbana, e não têm responsabilidade com a população de Porto Alegre. Ato contínuo ao afastamento, deve ser instaurado um inquérito administrativo para apurar as responsabilidade pelo descontrole na gestão do departamento, que provocou, e continua a provocar, prejuízos incalculáveis para a população, para as empresas, para a infraestrutura urbana e para a competitividade econômica da cidade.

A direção do DMAE deve ser assumida por uma junta de técnicos seniores, do quadro de funcionários efetivos, do departamento e com longa experiência na drenagem urbana, qualificados para retomar a operação do sistema de proteção contra as cheias, fazer as manutenções necessárias nas comportas, casas de bombas e diques, bem como recuperar a rede de macro e microdrenagem, utilizando os recursos aplicados no sistema financeiro em benefício da população de Porto Alegre.

Caberá a esta junta também enfrentar e resolver os problemas de abastecimento de água, que hoje afetam populações, desabastecidas há 24 dias, incluindo idosos, pessoas acamadas e trabalhadores. Esta junta pode ser apoiada por técnicos das empresas de saneamento que estão ajudando o DMAE a enfrentar a sua maior crise, como por exemplo a Comusa (Novo Hamburgo), Sabesp (São Paulo) e Corsan, entre outras. Assim, recolocando o departamento no controle dos servidores, será possível recuperar a capacidade operacional, imprescindível para superar os gravíssimos problemas enfrentados por Porto Alegre nas áreas de drenagem urbana e abastecimento de água. Não é aceitável que a água continue ocupando as ruas da cidade, devido o não funcionamento das casas de bombas, e milhares de pessoas estejam há 19 dias sem água. Só o corpo de funcionários altamente qualificados do DMAE poderá dar as respostas que a cidade necessita com urgência.

(*) Vereador, Líder da Bancada do PT, Professor e Doutor em Educação

***

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora