Opinião
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29 de abril de 2024
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15:46

A consulta na UFRGS será paritária (por Marcelo Kunrath Silva)

Foto: Isabelle Rieger/Sul21
Foto: Isabelle Rieger/Sul21

Marcelo Kunrath Silva (*)

No dia 24 de novembro de 2023, o Conselho Universitário da UFRGS (CONSUN) tomou, sem nenhum voto em contrário, uma decisão histórica: a consulta à comunidade acadêmica sobre as candidaturas que concorrem na eleição à reitoria da universidade em 2024 seria feita de forma paritária. Ou seja, a contagem dos votos para definição do resultado da consulta não seria realizada pela forma tradicional, que até então conferia 70% do peso dos votos ao segmento docente e apenas 15% ao segmento discente e 15% ao técnico-administrativo, mas sim a votação de cada segmento teria o mesmo peso (um terço).

Imediatamente à aprovação da consulta paritária atual administração central da UFRGS tem ameaçado  tentar reverter a decisão do CONSUN através da judicialização. Argumento neste texto que essa ação da reitoria interventora contra a decisão do CONSUN não percebe que a eventual reversão da decisão não altera um fato estabelecido em 24 de novembro de 2023: a consulta na UFRGS em 2024 será paritária!

O equívoco daqueles que buscam reverter a decisão do CONSUN através de medidas legais é não perceber que a consulta é, fundamentalmente, um processo político que, em última instância, independe da fórmula de cálculo dos pesos dos segmentos adotada. Para compreender esse argumento é preciso lembrar que a eleição no CONSUN é independente da consulta. Como o próprio nome diz, a consulta é um processo de identificação das preferências da comunidade universitária, que deve servir de subsídio ao processo eleitoral, que ocorre exclusivamente no CONSUN. Assim, a forma como cada integrante do CONSUN utiliza os resultados da consulta tem menos relação com a regra formal e mais relação com sua interpretação política. Se fosse diferente e a consulta determinasse a votação no CONSUN, a chapa vencedora da consulta seria eleita por unanimidade no CONSUN. Mas isso nunca acontece, pois há conselheiras e conselheiros que interpretam o resultado da consulta de outra forma ou mesmo desconsideram o resultado da consulta e votam em chapas que foram derrotadas na consulta (sendo que a própria definição de quem “ganhou” e quem “perdeu” também é parte da disputa política).

Dizer que a consulta não possui um efeito vinculante em relação ao resultado do processo eleitoral realizado no CONSUN não significa, no entanto, dizer que a consulta não tem importância. Se assim fosse, não seria possível compreender tanta polêmica e disputa em torno dela. O fato é que sua importância é centralmente política. A consulta é um mecanismo de (des)legitimação das candidaturas à reitoria que se apresentam à eleição no CONSUN. Apresentar-se como vencedora da consulta é um elemento que fortalece enormemente uma candidatura à reitoria e, via de regra, o CONSUN tende a referendar o resultado da consulta. 

Mas o equívoco é pensar que é a fórmula legalmente estabelecida que determina quem teve a vitória política na consulta. Na medida em que a legitimidade se relaciona a critérios de justiça e merecimento, independentemente da fórmula legal, será considerada legítima a candidatura que for interpretada como aquela que justa e merecidamente venceu a consulta. A última eleição à reitoria já demonstrou isso: com uma parcela expressiva da comunidade acadêmica rejeitando a fórmula tradicional de 70-15-15 utilizada na consulta, a candidatura vencedora na consulta foi interpretada como ilegítima por aquela parcela da comunidade. Mesmo vencendo a eleição no CONSUN, a candidatura vencedora na consulta não conseguiu obter legitimidade na comunidade acadêmica a ponto de, por exemplo, gerar um amplo processo de mobilização em sua defesa e contra a intervenção.

Assim, o que garantia a legitimação das candidaturas que eram vitoriosas nas consultas realizadas no formato 70-15-15 não era o fato dos processos seguirem determinada norma formal, mas sim o fato de que uma parcela majoritária do CONSUN, formada centralmente por docentes, considerava tal formato justo e assim referendava os resultados das consultas nos seus votos nas eleições. A aprovação da consulta paritária pelo CONSUN sem nenhum voto em contrário mostra que tal apoio majoritário não existe mais. Nesse sentido, independentemente da fórmula finalmente estabelecida ao final da queda de braço entre o CONSUN e a reitoria interventora, o fato é que será vista como a justa vencedora da consulta aquela chapa que for a vencedora de acordo com a regra paritária definida em 24 de novembro de 2023. E somente essa chapa terá legitimidade para vencer as eleições no CONSUN e, mais do que isso, para gerir democraticamente a UFRGS após o esperado fim de quatro anos de uma administração ilegítima e autoritária. 

(*) Professor Titular Departamento de Sociologia. Representante Docente Suplente no CONSUN/UFRGS

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


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