Reginete Bispo (*)
Na noite do último sábado, dia dez de fevereiro, a Escola de Samba Vai-Vai fez história no Carnaval Paulista ao abordar, em sua ala “Sobrevivendo no Inferno”, a violência policial cometida contra o povo da periferia. Vestidos com fantasias que retratavam oficiais do BOPE com asas de demônios e chifres, os passistas dançavam e denunciavam, como só o carnaval consegue, o abuso de poder cometido por alguns membros da corporação contra o povo pobre deste país.
É claro que o PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, tratou de solicitar medidas punitivas para o governador de SP, Tarcísio de Freitas, incluindo o fim da liberação de verbas para a escola. Além disso, a bancada da Bala na Câmara dos Deputados e o Sindicato dos Delegados de São Paulo também solicitaram uma retratação pública por parte da agremiação, o que é absurdo. Como bem lembra o meu amigo Márcio Chagas, Roberto Jefferson atirou granadas contra oficiais da PF e ninguém solicitou qualquer tipo de reparação; os vândalos de 08 de janeiro feriram mais de 44 policiais e nenhuma entidade de classe solicitou qualquer tipo de pedido de desculpas. Solicitar uma reparação quando alguém diz a verdade é apenas mais um tipo de censura e reforça o racismo estrutural no Brasil.
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, somente em 2021, 6.416 pessoas foram mortas pela polícia, sendo que mais de 78% delas eram pessoas negras. Ora, em uma realidade em que o povo da periferia lota as cadeias brasileiras e enfrenta uma polícia que não distingue trabalhadores de criminosos, é natural que esse mesmo povo utilize o carnaval para expressar sua verdade. Não há câmeras de segurança para registrar o que faz um policial militar quando sobe o morro. Eu sei disso, você sabe disso e, principalmente, a corporação policial sabe disso. É injusto punir a Vai-Vai por contar a verdade.
Como autora do PL 4.084/23, que institui o Dia Nacional de Combate à Violência Policial, e relatora do PL 5.231/2020, que busca punir a abordagem policial e de segurança privada que discrimine negros, mulheres, LGBTS e pobres, eu aplaudo a iniciativa da escola. Todas essas iniciativas mostram o quanto é fundamental estimular ações policiais humanizadas e, mais ainda, como é importante denunciar abordagens truculentas das autoridades públicas. Precisamos de mais escolas como a Vai-Vai no nosso Carnaval e de mais denúncias contra o abuso de poder de autoridades públicas e privadas, especialmente os agentes de segurança. Viva a cultura popular e viva o carnaval.
(*) Deputada federal (PT/RS)
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