Opinião
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2 de agosto de 2023
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14:29

Contra o aumento das passagens intermunicipais, é hora de defender a Tarifa Zero na Região Metropolitana (por Matheus Gomes)

Estudantes relatam dificuldades sem liberação do passe livre. Foto: Divulgação/Metroplan
Estudantes relatam dificuldades sem liberação do passe livre. Foto: Divulgação/Metroplan

Matheus Gomes (*)

Neste primeiro de agosto as passagens de ônibus intermunicipais da Região Metropolitana de Porto Alegre ficaram mais caras, 6% para o transporte comum e 24% para as modalidades direto, semidireto, executivo e seletivo. Esse novo aumento nos lembra que estamos diante de um sistema falido, que precisa de uma revolução imediata para voltar a garantir à população um transporte digno, eficiente e democrático.

Todo mundo sabe que tarifa alta piora a vida do trabalhador. Segundo dados do IBGE de 2018, quando a passagem de ônibus pesava um pouco menos no bolso do brasileiro, os gastos com transporte ultrapassavam as despesas com alimentação. Ou seja, no orçamento apertado da família brasileira, quando a tarifa aumenta, sobra ainda menos dinheiro para comida.

Mas o buraco é ainda mais embaixo. Segundo cálculos da Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional (Metroplan), o aumento nem deveria ser de 6% para o transporte direto, e sim de 24%, como nas outras modalidades. Segundo a entidade, esta é a defasagem acumulada desde o último reajuste em 2021, no entanto, é necessário lembrar que a defasagem está sendo bancada com dinheiro público, logo, sem nenhum prejuízo às empresas. Além disso, no apagar das luzes de 2022, a Assembleia Legislativa aprovou um repasse de R$108 milhões para as empresas de ônibus, com o objetivo de atenuar os efeitos do aumento dos combustíveis. 

Claro que a primeira coisa que nos vem à mente quando dizem que há defasagens gigantes é se isso realmente faz sentido. O diesel em Porto Alegre aumentou míseros 0,3% entre julho de 2021 e julho de 2023, combustível que representa cerca de 1/3 do custo total da passagem. Já os salários dos trabalhadores rodoviários, que representam quase a metade do custo total, aumentaram apenas 5,71% no último mês de fevereiro. O que nos faz ter algumas dúvidas em relação ao cálculo de defasagem.

De qualquer forma, o que os especialistas dizem é que o número de passageiros tem caído nos últimos tempos, situação que vemos em todo o país, e isso sim tem impacto no financiamento do sistema. Mas há uma contradição aqui, quanto mais se aumenta o preço da passagem, mais gente deixa de pegar ônibus, e consequentemente mais caro fica para sustentar um sistema de transporte público.

Por isso não basta criticar esse aumento específico da passagem, que obviamente piora a vida do trabalhador da região metropolitana e empurra o sistema de transporte um pouco mais para o abismo que já se aproxima. Temos que colocar o transporte coletivo no orçamento, e não apenas subsidiando a sobrevida dessas empresas, mas criando um sistema gratuito, democrático e de qualidade.

Corre na Câmara dos Deputados uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 25/2023) que inclui o direito ao transporte no rol de direitos sociais básicos previstos na Constituição. De autoria da deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), é apelidada de PEC da Tarifa Zero.

Tarifa zero é uma política de gratuidade no transporte coletivo. É a proposta de que as pessoas não paguem na hora de utilizar serviços de ônibus ou trem. Simples, né? Toda a cidade se beneficia com o bom fornecimento de transporte público, então toda a cidade deveria pagar por ele. Assim tudo fica mais barato e eficiente.

Já são 76 cidades no Brasil com tarifa zero e universal, com um total de 3,5 milhões de pessoas beneficiadas. Isso garante a liberdade de ir e vir, além de menos carros e motos nas ruas, gerando menos poluição (mês passado foi o ano mais quente da história do nosso planeta!), contribuindo para o enfrentamento da crise climática.

Em 2013 o Brasil se levantou contra os aumentos das passagens. De lá pra cá o ônibus ficou muito mais caro e muita gente preferiu se virar de outro jeito, derrubando o número de passageiros, mesmo com isenções bilionárias para o setor. É um sistema visivelmente falido, mais caro, mais ineficiente e mais antidemocrático do que há uma década. Tá na hora de discutirmos tarifa zero para a Região Metropolitana de Porto Alegre, da mesma forma que metrópoles brasileiras que iniciam planejamentos para aplicar a gratuidade através de diferentes modelos. Não é sonho, é a realidade nua e crua que nos exige isso. 

(*) Deputado estadual (PSOL-RS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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