Opinião
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20 de junho de 2023
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15:18

Eventos climáticos extremos no RS: o risco é piorar (por Airton Stein e Olga Falceto)

Área atingida por ciclone no RS, em junho de 2023. Foto: Joel Vargas / GVG
Área atingida por ciclone no RS, em junho de 2023. Foto: Joel Vargas / GVG

 Airton Tetelbom Stein e Olga Garcia Falceto (*)

Há poucos dias o Rio Grande do Sul foi vitimado por um evento climático extremo que deixou um cenário de destruição, com casas destruídas e arrastadas pela força das águas, inundações e desolação em várias cidades.

Lamentamos as perdas e, em especial, as onze mortes até agora registradas pela Defesa Civil do RS. Faleceram nossa colega, professora Agnes Schmelling, esposo e mãe. A casa da professora foi atingida por um deslizamento de terra, consequência da passagem do ciclone extratropical. Agnes era professora de música do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS) com destacada atuação em benefício da arte e da cultura no Brasil.

Em Maquiné, onde a professora do IFRS teve morte trágica, a chuva ultrapassou quase duas vezes o previsto para o mês. Choveu mais de 290 milímetros, sendo o esperado para o mês de junho de 140 a 180 milímetros.

A perda de vidas numa tragédia como a que ocorreu no Estado precisa ser evitada. O Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) alertou para a gravidade do ciclone no Rio Grande do Sul, antes da sua ocorrência. Há medidas públicas de adaptação possíveis e necessárias. A ação humana já contribuiu para o que a média de temperatura mundial tenha aumentado 1,1 Celsius em relação à temperatura antes da Revolução Industrial, causando já graves desequilíbrios ecológicos.

O agravamento dos fenômenos climáticos na vida dos gaúchos tem sido recorrente e muito triste. Implica um alto custo, humano e material. Devemos refletir sobre seu significado para toda a sociedade.

A região Sul do País precisa se preparar para o aumento de eventos climáticos extremos. O RS foi assolado por 3 anos de seca extrema e, agora, a chegada do fenômeno El Niño deve elevar em 50% as chuvas na nossa região.

Os eventos climáticos extremos incluem ondas de calor, enchentes, precipitações de chuvas extremas, secas, tornados e ciclones tropicais. O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) já demonstrou que essas mudanças climáticas são induzidas por ações humanas, principalmente pelo uso excessivo de combustíveis fósseis, derivados do petróleo e carvão mineral, que geram os chamados gases de efeito estufa, os quais levam ao aquecimento global.

Outro aspecto que se torna cada vez mais relevante nesse cenário de mudança global relaciona-se ao aquecimento dos oceanos e à elevação do nível do mar. Esses efeitos terão consequências catastróficas no nosso País onde metade da população vive num raio de 200km da costa e um terço mora em cidades litorâneas.

As pessoas em todo o mundo estão sentindo cada vez mais o impacto das mudanças climáticas em sua saúde e bem-estar. No entanto, os governos e as empresas de países de alta, média e baixa renda continuam priorizando os interesses vinculados à continuação da produção de combustíveis fósseis.

Essa dependência excessiva de combustíveis fósseis tende a tornar o clima no futuro cada vez mais quente, com impactos previsíveis de piora na saúde física e mental. Vários estudos mostram que esses impactos climáticos são mais destrutivos nas populações mais vulneráveis, aumentando ainda mais a iniquidade social. Também é esperado uma maior migração populacional de regiões sem condições de vida humana, o que, certamente, resultará em conflitos e piora na qualidade de vida.

No Brasil, as mudanças climáticas podem fazer retroceder os ganhos na saúde pública, que ocorreram nas últimas décadas, assim há necessidade de refletir sobre nosso estilo de vida. É imperioso rever como produzimos e consumimos alimentos, energia e produtos manufaturados. É necessário discutirmos sobre como vivemos em nossas cidades. No relatório do Lancet Countdown 2022– uma revista científica de alto impacto – sobre recomendações para políticas de saúde e mudanças climáticas no Brasil foi indicado a necessidade de aumentar os espaços verdes urbanos e reduzir as iniquidades. As cidades brasileiras têm poucos espaços verdes, o que aumenta o calor e os riscos de doenças relacionadas ao calor.

Em síntese, após esse evento climático extremo no nosso Estado é necessário identificar ações estratégicas de mitigação e adaptação da saúde humana às mudanças climáticas – ações necessárias e urgentes a serem tomadas por todos os atores da sociedade.

Airton Tetelbom Stein é professor Titular de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Ciências da Saúde e Médico de Família e Comunidade do Grupo Hospitalar Conceição.

Olga Garcia Falceto é Professora aposentada de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e do Instituto da Família.

Ambos membros do Saúde Planetária Brasil vinculado ao Instituto de Estudos Avançados da USP e membros do grupo Medicina em Alerta

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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