Opinião
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13 de julho de 2022
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08:19

Desindustrialização e liderança na economia gaúcha (por Alessandro Donadio Miebach e Adalmir Marquetti)

Foto: Felipe Dalla Valle / Palácio Piratini
Foto: Felipe Dalla Valle / Palácio Piratini

Alessandro Donadio Miebach e Adalmir Marquetti (*)

A desindustrialização foi uma característica da economia gaúcha na última década. Segundo dados do IBGE e do DEE-RS, a indústria correspondia a 27,9 % do PIB em 2012 e passou a 22,5% em 2019. Os eventos econômicos associados com a pandemia de Covid-19 mantiveram esse movimento. A desindustrialização possui duas grandes causas: uma de natureza nacional e outra de natureza local. No país, a desindustrialização se intensificou a partir da crise de 2015 que deprimiu a atividade econômica e o investimento produtivo. 

A crise representou o fim do processo de crescimento econômico observado tanto no Brasil como no Estado na primeira década do século XXI. O colapso do polo naval de Rio Grande é exemplo eloquente do abandono das estratégias de desenvolvimento no Estado. O silêncio com que as elites econômicas e políticas gaúchas reagiram ao fim do polo naval revelam o fator regional na regressão da estrutura produtiva estadual. Nos últimos anos houve um processo venda de empresas com o controle da atividade industrial gaúcha migrando outros estados. Simultaneamente, observou-se o aumento do peso econômico e das lideranças políticas das atividades vinculadas ao agronegócio para exportação. 

A dinâmica do agronegócio exportador se articula com os mercados financeiros. O mercado financeiro localizado em São Paulo também passou a ser outro centro de atuação dos grupos gaúchos que, capitalizados após a venda das empresas, buscam de rentabilizar seus ativos. Paulatinamente, segmentos da elite outrora vinculados a busca de lucratividade na produção industrial dirigem sua atenção para atividades sem capacidade de dinamizar a economia local. O agronegócio exportador possui reduzido encadeamento produtivo, concentra renda e gera poucos empregos qualificados, bem como não contribui para a arrecadação fiscal em virtude da lei Kandir. O capital financeiro por sua própria lógica busca rentabilidade sem preocupação com o local.  

Na medida em que o centro de decisão das empresas sai do Estado desaparece o interesse com a performance de longo prazo da economia gaúcha, bem como com a preservação de sua estrutura produtiva. Isso permite compreender a tranquilidade com as lideranças locais observaram o colapso do polo de Rio Grande e o fechamento da única fábrica de chips do País. Serenidade semelhante ocorreu com a venda de ativos locais como a Sulgás e a CEEE-D. Nem as estatísticas públicas estaduais escaparam desse movimento, tendo sua produção delegada a uma empresa paulista, delegação revertida posteriormente. As discussões sobre a adesão do Regime de Recuperação Fiscal e a eventual privatização do Banrisul se inserem no movimento de dinâmica regressiva da economia estadual.  A ideologia dominante entre as classes dirigentes, compatível com o processo de desindustrialização e a financeirização da rentabilidade da atividade empresarial, tem reduzido a capacidade econômica e de liderança do Rio Grande do Sul. 

Caso os processos identificados acima se mantenham, existe o risco real de acentuar-se a regressão produtiva do Estado com graves consequências de longo prazo. A emigração de jovens com maior escolaridade para outros estados é um indicativo nesse sentido. A atividade industrial é o principal elemento de incorporação de tecnologia e de ganhos de produtividade, ao mesmo tempo que é a fonte dos empregos qualificados de melhor remuneração. Cabe questionar se a sociedade gaúcha será capaz de reverter as tendências regressivas de sua estrutura produtiva. A resposta a essa questão condicionará a trajetória futura do Estado.

(*) Alessandro Donadio Miebach é Professor de Economia, UFRGS. Adalmir Marquetti é Professor de Economia, PUCRS

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