Opinião
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18 de abril de 2022
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17:07

O mercado quer derrubar o anfiteatro Pôr do Sol (por Jonas Reis)

Anfiteatro durante a Copa do Mundo de 2014 | Local: Anfiteatro Pôr do Sol
Anfiteatro durante a Copa do Mundo de 2014 | Local: Anfiteatro Pôr do Sol

Jonas Reis (*)

Inaugurado no dia 13 de maio de 2000, com shows de Geraldo Flach, Renato Borghetti e Titãs, o Anfiteatro Por do Sol simbolizava uma Porto Alegre democrática, que promovia grandes aglomerações de pessoas para debater política, cultura e para assistir shows gratuitos, onde todos podiam participar, independente de sua condição social e econômica. Uma cidade das multidões em movimento, que não por acaso foi o berço do Fórum Social Mundial e da busca de um outro mundo possível. 

Construído na gestão do prefeito Raul Pont a obra envolveu uma parceria com a iniciativa privada, mas diferente das parcerias feitas pelo atual governo o equipamento permaneceu público e sob gestão do município. Até a escolha do nome ocorreu de forma democrática, com cerca de 200 mil pessoas votando em cupons distribuídos pela prefeitura e publicados num jornal de grande circulação.

Pelo palco do Anfiteatro Por do Sol passaram nomes como Buena Vista social Club, Ivete Sangalo, Maria Rita,  Zakk Wylde, Roberto Carlos, Jota Quest, Guri de Uruguaiana; Chimarruts. Jorge Benjor, Skank e Céu, entre outros expoentes da musica gaúcha, brasileira e internacional. O anfiteatro também sediou atividades do Fórum Social Mundial e a Fan Fest da FIFA durante os jogos da seleção brasileira na Copa do Mundo de 2014.

O abandono e o anúncio da demolição do Anfiteatro Por do Sol simbolizam uma Porto Alegre onde os espaços públicos são privatizados e a cultura e a natureza são transformadas em mercadoria e fonte de lucro. O acesso e a fruição dos bens culturais já não são mais para todos, mas apenas para quem tem dinheiro para pagar o ingresso. Uma cidade triste, onde impera a ditadura do capital e a população trabalhadora da periferia é excluída, estigmatizada e criminalizada, como ameaça à segurança dos ricos.

Fica a pergunta: Quem vai ganhar com a demolição do Anfiteatro Por do Sol? Qual empresa vai urbanizar o trecho três da Orla? Haverá concessão da área a iniciativa privada? A decisão sobre o futuro do Anfiteatro Por do Sol não pode ficar na mão do mercado, a decisão deve ser tomada pela população, em consulta pública, assim como o nome do anfiteatro foi decidido por cerca de 200 mil pessoas. Por isso entrei com representação no Ministério Público de Contas, para sejam apuradas as responsabilidades pelo abandono do equipamento Em audiência com o procurador-geral do Ministério Público de Contas, Dr. Geraldo Da Camino, fomos informados de que o MPC abrirá procedimento para acompanhar o caso.

O abandono do Anfiteatro Por do Sol segue a lógica do abandono dos equipamentos culturais do município, como o Teatro de Câmara Tulio Piva, o Centro Municipal de Cultura (Biblioteca Pública Municipal Josué Guimarães, Sala Álvaro Moreyra, Teatro Renascença e um Saguão de Exposições) e o Museu Joaquim Felizardo. A Usina do Gasômetro está fechada desde 2017, com uma obra que não termina nunca e com os valores reajustados periodicamente.

O parque Harmonia (Maurício Sirostky Sobrinho) teve a gestão privatizada por R$ 200 mil e até a rua lateral foi transformada em estacionamento privado que cobra R$ 20,00 por carro. O resultado é que o parque está deserto. As pessoas deixaram de frequentar um equipamento que segrega seus usuários pelo pagamento de valores, mesmo que disfarçados sob a forma de cobrança de estacionamento em via pública.

A receita é a mesma: deixar sucatear, fechar e depois privatizar sob a alegação de que o município não tem recursos para realizar a manutenção. Este discurso coincide com a redução dos parcos recursos destinados a cultura. Em 2020 o gasto com a cultura foi de apenas R$  31.337.451, correspondendo a 0,45% do Orçamento do Município.  Em 2022 o orçamento aprovado pela Câmara Municipal, lei n°12.942, prevê uma despesa de irrisórios R$ 31.748.039, correspondendo a 0,32% do orçamento do município. O que era ruim ficou pior, na pratica ocorreu uma redução do percentual do orçamento destinado a cultura. 

Em 2004, no governo do prefeito João Verle (ultimo ano do PT na prefeitura) o orçamento da cultura foi de R$ 71.875.029 (valores atualizados pelo IPCA até dezembro de 2020). Ou seja, o orçamento destinado a cultura foi reduzido a menos da metade do que era nas administrações petistas.

Queremos uma cidade democrática, plural e inclusiva, onde os recursos públicos sejam aplicados em benefício do povo e não do lucro privado. Mais espaços públicos para a cultura. Não à privatização dos equipamentos culturais.

(*) Vereador do PT, Vice-Presidente da Comissão de Educação, Cultura, Esporte e Juventude (Cece), professor de música e doutor em educação

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