![Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Ricardo Stuckert/ Instituto Lula)](https://sul21.com.br/wp-content/uploads/2021/06/lula-450x300.jpg)
Flavio Fligenspan (*)
Todos nós já passamos muitas vezes pela experiência de idealizar uma solução para um problema e não conseguir chegar a ela; mas conseguimos algo próximo do que se pensava. Seria como chegar ao “second best”. Contudo, tomada literalmente, a expressão em inglês representa uma opção luxuosa frente a tantas situações nas quais o que realmente se escolhe é o “menos ruim”. Em processos eleitorais, especialmente num segundo turno de eleições majoritárias, parte dos eleitores escolhe o “menos ruim”, afastando o que considera o mal maior.
Pois bem, os representantes do mercado financeiro brasileiro, sabidamente conservadores e muito pouco preocupados com causas sociais, começam a viver seu momento de escolha para as eleições deste ano. À medida que a cada dia fica mais claro o fracasso em construir a chamada terceira via, restou decidir o que para eles representa o “menos ruim”. E o vencedor da disputa entre Lula e Bolsonaro é o primeiro. Por que?
A resposta depende de várias dimensões, desde as propostas sobre como lidar com o capital estrangeiro – produtivo e financeiro –, questões tributárias, grau de liberdade e facilidade para fazer negócios, participação do Estado na economia, até o trato das questões fiscais, um dos temas considerados mais delicados pelo sistema financeiro para o equacionamento da política econômica. Fixemo-nos no fiscal. Para o sistema financeiro, a ideia de um manejo responsável das contas públicas e de um planejamento de médio prazo da relação dívida/PIB é pedra angular do futuro da economia brasileira. E, neste momento, quem promete o melhor equacionamento – ou “menos ruim” – é Lula.
Primeiro, porque Lula será menos refém do Centrão do que Bolsonaro já é. Claro, não nos enganemos, todos terão que negociar com o Centrão, e num ambiente cada vez mais difícil, dado o avanço maior do Legislativo sobre o orçamento nos últimos anos. Veja-se o caso das Emendas de Relator. Porém, o fato concreto é que o controle político/fiscal de Bolsonaro já se perdeu e não parece haver a menor chance de reversão. Pelo contrário, o Executivo está na mão do Legislativo, até mesmo em relação à decisão sobre as dezenas de pedidos de impeachment, muitos deles bem alicerçados em fatos ligados ao enfrentamento da pandemia.
E com o passar do tempo neste 2022, a sensação de descontrole só vai aumentar, com tentativas desesperadas de virar o jogo eleitoral através da proposição de medidas as mais estranhas, como as de retirada de impostos sobre combustíveis e energia sem compensação de receitas, prontamente rechaçadas pelo staff do Ministério da Economia, inclusive com risco de ofender a Lei de Responsabilidade Fiscal. Este vai-vem de proposições e retiradas de medidas fiscais apenas reforça a noção de perda de controle e de pouca responsabilidade com a administração fiscal, tão cara ao sistema financeiro.
Um segundo aspecto a ser considerado é o fato de que Lula já é bem conhecido do sistema financeiro, nunca tomou e nunca tomará nenhuma medida fiscal mirabolante. Pelo contrário, sempre foi cuidadoso e até exagerado no trato fiscal, como no episódio em que prometeu resultados melhores do que o FMI exigia logo que assumiu em 2003. O Lula da vida real sempre esteve bem longe da imagem de líder radical de esquerda que tantos já tentaram plantar e o bolsonarismo vai tentar explorar na campanha de 2022.
Um terceiro argumento é o que exige um mínimo de autocrítica desses agentes em relação ao apoio a Bolsonaro em 2018. É fácil verificar que naquele momento se erigiram circunstâncias muito especiais e não reproduzíveis da vida nacional; e que Bolsonaro se mostrou ainda mais desqualificado do se imaginava e menos passível de controle. A aposta vazia de quatro anos atrás não deve se repetir diante de tantos maus exemplos que se sucederam.
Na ausência da tão desejada terceira via, ironicamente e sem entusiasmo, o sistema financeiro vai exercer uma de suas principais características, a praticidade associada à vocação para procurar o melhor caminho para ganhar dinheiro. Para eles, Lula é a escolha do “menos ruim”. Sem sombra de dúvida!
Professor do Departamento de Economia e de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
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