Opinião
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6 de dezembro de 2021
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10:51

‘Bolsonarismo dissidente’ se veste de terceira via (por Carlos Eduardo Bellini Borenstein)

Sergio Moro e o governador do RS, Eduardo Leite, no Palácio Piratini (Divulgação)
Sergio Moro e o governador do RS, Eduardo Leite, no Palácio Piratini (Divulgação)

Carlos Eduardo Bellini Borenstein (*)

O desgaste do governo Jair Bolsonaro tem provocado uma rearticulação da centro-direita liberal, que se apresenta como terceira via, mas na prática representa o “bolsonarismo dissidente”. Os principais expoentes desse projeto são o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e o ex-ministro Sergio Moro (Podemos). Apesar de ter sido derrotado nas recentes prévias do PSDB, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), também faz parte desse projeto. 

Vale recordar que de 1994 a 2014, o PSDB, ancorado numa aliança de centro-direita que teve início através da aliança com o ex-PFL – hoje DEM, futuro União Brasil – era o polo de sustentação do governo FHC. Naquele período histórico, diante da falta de um projeto de direita com densidade eleitoral, o eleitorado conservador acabava votando no PSDB. A partir de 2010, os tucanos foram indo cada vez mais para a direita. 

Na campanha presidencial de 2010, o então candidato do PSDB ao Palácio do Planalto, José Serra, abraçou no segundo turno a pauta conservadora contrária ao aborto para tentar derrotar Dilma Rousseff (PT), que acabou se elegendo presidente naquela disputa. Em 2014, através do então senador Aécio Neves (PSDB-MG), o PSDB fez uma campanha fortemente antipetista. Derrotado, Aécio não aceitou o resultado. Questionou a derrota na Justiça Eleitoral. E, posteriormente, foi um dos principais responsáveis por fazer o partido embarcar na aventura do impeachment contra a então presidente Dilma. 

O que o PSDB não contava é que seria eleitoralmente “engolido” pelo bolsonarismo, que foi gestado a partir da Operação Lava Jato, sendo turbinado durante as jornadas de junho de 2013, que estruturou uma série de grupos sociais de extrema-direita. Na prática, o bolsonarismo é um filho do lavajatismo, que seduziu parte da classe média alta dos grandes centros urbanos através de uma cruzada contra a corrupção. Aliás, não foi por acaso que, em 2019, Sergio Moro, o grande representante do lavajatismo, acabou guindado a condição de ministro de Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro. 

Porém, a partir da ruptura de Moro com o Bolsonaro, em 24 de abril de 2020, ocorre um rompimento do bolsonarismo com o lavajarismo. Além de Moro, João Doria, que na disputa de 2018 ao governo de São Paulo abraçou a campanha “bolsodoria”, também começa a se distanciar do bolsonarismo. Diante de suas pretensões presidenciais, esse afastamento entre Bolsonaro e Doria ficaria ainda mais nítido para a opinião pública após o surgimento da pandemia da Covid-19.

Sergio Moro também fez um caminho similar. Saiu do governo atirando em Jair Bolsonaro. Se mudou para os EUA, indo trabalhar na Alvarez & Marsal, e agora reaparece como um outro postulante da chamada “terceira via” no tabuleiro, mas na prática é outro integrante do projeto de centro-direita liberal (“bolsonarismo dissidente”).

Apesar da tentativa de Doria e Moro em se posicionarem como terceira via, na prática atuam para tentar remover Bolsonaro da polarização com o ex-presidente Lula (PT). Não é por acaso que entrevista ao Estadão desse domingo (5), Doria afirmou que “eu e Moro estaremos no mesmo campo em 2022, mas não necessariamente na mesma candidatura”. 

Como hoje quem declara voto em Sergio Moro é um eleitor muito similar aquele que votou no PSDB de 1994 a 2014 – e parte desses eleitores, principalmente seu segmento mais conservador, está com Bolsonaro – uma construção do “bolsonarismo dissidente” somente vingará se PSDB e Moro estiverem coligados. 

Na conjuntura atual, o grande beneficiado desse racha – Bolsonaro, Moro e Doria – é o ex-presidente Lula (PT), que avança na montagem do projeto de reconstrução social, ampliando o diálogo com setores do centro progressista. Como tende a ocorrer uma verdadeira guerra fraticida no campo da direita/centro-direita entre Bolsonaro, Doria e Moro, a configuração da disputa presidencial de 2022 neste momento se desenha favorável a Lula. Enquanto seus rivais brigam, Lula fala sobre os temas que são os principais anseios do eleitorado e dialogam com o dia-a-dia do eleitor: desemprego, inflação, volta da fome, perda do poder aquisitivo da população, etc. 

(*) Cientista político formado pela ULBRA-RS. Possui MBA em Marketing Político, Comunicação e Planejamento Estratégico de Campanhas Eleitorais pela Universidade Cândido Mendes

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21


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