Opinião
|
29 de outubro de 2021
|
07:45

A primavera da democracia (por Selvino Heck)

Votação do Plebiscito Popular sobre as Privatizações no Rio Grande do Sul terminou dia 24 de outubro. (Foto: CUT/RS-Divulgação)
Votação do Plebiscito Popular sobre as Privatizações no Rio Grande do Sul terminou dia 24 de outubro. (Foto: CUT/RS-Divulgação)

Selvino Heck (*)

Domingo, 24 de outubro, dia bonito, tomado pelo de sol. Estamos no Brique da Redenção em Porto Alegre, cheio de gente, gazebo de pé, banca e urna organizadas, chamando os passantes para votarem no Plebiscito Popular das Privatizações, no último dia da jornada do Plebiscito.

Vou anunciando a votação e pedindo o voto para quem passa. Algumas-uns, várias-os, muitas-os param, ouvem e dizem: “Ah, eu  sou contra total.” Digo: “Então, vai lá e vota! É rapidinho.” Poucas-os anunciam: “Sou a favor que vendam tudo!” Respondo: “É Plebiscito para ouvir a população. Cada um vota como quer e pensa.” Estas-es, em geral, não param para votar.

Pelas 11 horas, alguém para atrás de mim e fala: “Oi, Selvino, como estamos?” Me viro para ver quem me saúda. É ninguém mais que Olívio Dutra, que informa: “Hoje, é a primeira vez que saio de casa em meses. E acabei chegando aqui”. Olho. Ele está todo vestido de vermelho, de bermuda, capacete na cabeça. Veio de bicicleta da distante Avenida Assis Brasil, onde mora. Bem ao estilo e coragem de Olívio Dutra. Pergunto pela Judite. Responde que está se cuidando, em tratamento permanente. Pergunto se ele já votou no Plebiscito. Responde que não. Digo: “Então, aproveita e vota”. 

E lá vai Olívio Dutra votar, para alegria de quem está cuidando da urna. Logo junta-se mais gente, pessoas querendo conversar e tirar foto com o sempre prefeito e governador. 

É a Primavera da Democracia. Foi lindo o Plebiscito Popular. Emocionante a semana inteira, de 16 a 24 de outubro de 2021. E não estávamos em tempo de carnaval ou de eleição. Era um Plebiscito Popular rodando o Rio Grande, em municípios, sindicatos, comunidades, nas ruas.

Em todos os cantos, esquinas, vilas, escolas, ruelas das periferias, portas de fábrica, na frente das igrejas, antes e depois das missas e cultos, nos postos de saúde, hospitais, a militância presente e atuante, chamando o povo para se manifestar e dizer NÃO às absurdas privatizações, que entregam de bandeja os bens públicos que são de todos, como aconteceu semana passada com a SULGÁS, vendida a preço de banana, tendo um único interessado no leilão.

A militância voltou aos bons e melhores tempos. Parecia termos voltado aos anos 1970, quando, na Pastoral da Juventude, rodávamos o Rio Grande fazendo os Cursos de Base, a cada fim de semana em município diferente. E eram tempos em que greves eram proibidas, partidos de esquerda não eram legalizados e não havia Centrais Sindicais. Em plena ditadura! 

Ou então termos voltado aos anos 1980, com a ANAMPOS, Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Sindical, juntando movimento sindical e popular para lutar por direitos e democracia e organizar trabalhadoras e trabalhadores. Ou ainda lembrando os anos 1990 no CAMP, Centro de Assessoria Multiprofissional, discutindo o Desenvolvimento Regional e a Economia Solidária por todos os cantos do Rio Grande.

Ou ainda lembrando os felizes anos 2000, e rodando o Brasil inteiro em nome da equipe de educadoras-es populares do TALHER, e inventando a RECID, Rede de Educação Cidadã: ajudar a matar a fome de pão e saciar a sede de beleza. Na mão, na cabeça e no coração, a educação popular freireana libertadora e conscientizadora.

O Plebiscito Popular, junto com as mobilizações de rua, está sendo a volta do ser movimento, sem desprezar a instituição. Ir para a rua, ouvir, dialogar, olho no olho, retomar a relação da mística com a militância e a política, conversar sobre a urgência da mudança. Como diz Paulo Freire na Pedagogia da Indignação: juntar a denúncia, o anúncio, a profecia, o sonho, a utopia. Foi um Plebiscito freireano, em todos os sentidos, exatamente no ano do centenário de Paulo Freire.

A mobilização popular e o trabalho de base, com formação na ação, são fundamentais neste momento histórico e conjuntura desafiadora de VACINA NO BRAÇO, COMIDA NO PRATO, FORA BOLSONARO, JÁ! Não haverá eleição salvadora em 2022 sem o povo consciente e na rua, sem desobediência civil, sem militância acesa, e sem discussão de um projeto democrático e popular de país e de Nação.

Em 2021, apesar de tudo, na boa luta, ESPERANÇAR. A Primavera da Democracia está acontecendo e vai acontecer no próximo verão, também no outono, sem parar no inverno, até chegar a Primavera de 2022.

(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990)

§§§

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora