Opinião
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30 de setembro de 2021
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09:05

A Mina Guaíba e a desfaçatez do governador (por Gerson Almeida)

China anunciou que seu país deixará de participar da construção de usinas termelétricas a carvão no exterior. (Foto: Maia Rubim/Sul21)
China anunciou que seu país deixará de participar da construção de usinas termelétricas a carvão no exterior. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Gerson Almeida (*)

O governo de Eduardo Leite tentou impedir a participação popular no processo de instalação da “Mina Guaíba” e desmontou o sistema de proteção ambiental do estado para permitir que este e outros projetos da mesma estirpe  pudessem ser aprovados.

O governador esteve pessoalmente empenhado em assegurar que as mais de 500 alterações no Código Estadual do Meio Ambiente do RS fossem aprovadas em apenas 75 dias, sem passar, sequer, pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente.

Feliz com essas façanhas contra o meio ambiente, declarou: “a gente acredita que, o empreendedor preenchendo o questionário e os documentos estiverem de acordo com o solicitado, em 24h ele já possa instalar e empreender”. Para ele, o licenciamento não passa de “burocracia” que precisa ser extinta, alinhado aos interesses dos setores mais retrógrados da economia.

Usando da mesma retórica pomposa com a qual anunciou o desmonte do licenciamento ambiental, nos últimos dias o governador declarou “a gente precisa reduzir emissões (de poluentes), e isso envolve uma política, sim, de descarbonização a partir de mudança de matriz energética”.  Para quem carbonizou o sistema de proteção ambiental do estado, esta declaração mostra que a desfaçatez está em alta. 

Leite é o governador que já mostrou não gostar de ouvir argumentos contrários às suas propostas, tanto que encaminhou projeto que alterou a Constituição Estadual e extinguiu a necessidade de realização de plebiscito para a privatização de empresas como a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), o Banrisul e a Companhia de Processamento de Dados (Procergs).

Ao mudar o seu discurso sobre a “Mina Guaíba”, o governador busca apenas esconder que sua estratégia de desenvolvimento baseada no carvão foi derrotada e os argumentos apresentados pelo amplo Comitê de Combate à Megamineração no Estado do Rio Grande do Sul estavam corretos.

Desde o início esse movimento denunciou que a instalação de uma mina de carvão na região metropolitana traria gravíssimas consequências para qualidade de vida dos 4 milhões de moradores da região.

Ao estacionar nas ideias de desenvolvimento do século XIX, o governo de Eduardo Leite não contava com um movimento local tão amplo, com a aceleração da consciência mundial contra as alterações climáticas e, também, com dois acontecimentos políticos recentes, que colocou essa discussão em outro patamar: a vitória de Biden nos EUA, que mudou a posição de negacionismo climático de Trump; e a alteração de posicionamento da China, a maior investidora em energia mundial, sobre a exploração de carvão no mundo.

A declaração do governador pela “descarbonização” foi feita no dia 24/09, exatos três dias depois do discurso do presidente da China na Assembleia-Geral da ONU, Xi Jinping, que anunciou que seu país “deixará de participar da construção de usinas termelétricas a carvão no exterior”.

Como sabemos todos, a viabilidade da “Mina Guaíba” sempre dependeu de investimento externo, especialmente da China, que já investe fortemente em carvão no RS e construiu Candiota III. 

Por sua vez, a Copelmi, empresa à frente do projeto da “Mina Guaíba”, não teria qualquer possibilidade de assumir esse empreendimento sem financiamento do agente que já havia demonstrado interesse em ampliar sua participação na exploração do carvão no estado. 

A determinação em viabilizar o chamado “Polo Carboquímico”, vem desde o governo Sartori e mostra que o campo político da direita não é capaz de oferecer ao Rio Grande do Sul um futuro saudável e sustentável, pois estão firmemente ancorados no passado.

Por sua vez, a luta contra a “Mina Guaíba” mostrou estar sintonizada com a consciência mundial contra as mudanças climáticas e o capitalismo predatório, cujo único compromisso é o lucro imediato, mesmo que com alto custo social.   Os setores sociais que lutaram contra este projeto bizarro é que podem produzir a esperança de um futuro sustentável.

(*) Sociólogo, ex-secretário do Meio Ambiente de Porto Alegre

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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