Opinião
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21 de julho de 2021
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07:39

Sodré, os militares e a democracia (por Glauber Gularte Lima)

Nelson Werneck Sodré (Foto:  Arquivo/Marizilda Cruppe/29-9-1998)
Nelson Werneck Sodré (Foto: Arquivo/Marizilda Cruppe/29-9-1998)

Glauber Gularte Lima (*)

Quizá mi única noción de patria
sea esta urgencia de decir Nosotros
Mario Benedetti

Na América Latina e no Brasil a frágil democracia sempre esteve ameaçada e foi inúmeras vezes aniquilada por quarteladas de todo tipo. O dispositivo militar tem servido como uma reserva de força acima da lei e da ordem, exatamente para destruí-las. Este tem sido o último recurso das elites dominantes para manter seus privilégios, diante da ofensiva de governos populares e reformistas.

Herdeira da cultura dos senhores de escravos, a elite brasileira não tem apreço algum pela democracia liberal que impôs à nação. Como afirmou o escritor uruguaio Eduardo Galeano, através de sua fina ironia, “eles amam tanto a democracia que jamais a usam, para que não se gaste”. 

Em um regime democrático consolidado, o aparato militar deveria estar constitucionalmente e de fato subordinado ao poder político. Mas no Brasil foi transformado em guarda pretoriana dos interesses do poder dominante.

Até o golpe de 1964, houve uma luta intestina nas Forças Armadas entre setores nacionalistas e os alinhados aos interesses do grande capital internacional. Após a quartelada em nome da “Família com Deus pela Liberdade” esses militares progressistas foram sumariamente expurgados da corporação.

Duas semanas após a consumação do golpe, o General de Brigada Nelson Werneck Sodré, uma das cabeças mais brilhantes da inteligência militar, teve seus direitos políticos cassados. Esse intelectual enciclopédico legou ao país uma valiosa obra historiográfica. 

Um de seus diamantes é o livro História Militar do Brasil, a mais expressiva obra sobre as Forças Armadas brasileiras, que abrange mais de quatro séculos de história. Por ironia do destino o governo militar proibiu a sua circulação em 1969 e os exemplares disponíveis na editora e em livrarias foram apreendidos.

Mas sua maior condenação foi o ostracismo imposto pela cúpula militar dominante. Os mesmos que abrem a boca para exaltar um assassino e traidor do país como o coronel Brilhante Ustra relegaram ao esquecimento um dos mais talentosos intelectuais que a farda verde-oliva produziu. 

É a triste expressão de uma inteligência formada para a condição de satélite militar dos EUA e em prontidão permanente para ameaçar o país e seu povo e rasgar a Constituição.

(*) Glauber Gularte Lima é professor


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