Opinião
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11 de setembro de 2010
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09:00

Nove anos depois do 11 de setembro. O ocidente entre a guerra e a paz

Por
Sul 21
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Por Mario Soares*

Depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, que deixaram a descoberto a vulnerabilidade dos Estados Unidos que se consideravam, após o colapso do universo comunista, a hiperpotência do planeta, o então presidente George W. Bush ficou, num primeiro momento, desorientado. Ato contínuo, reagiu como um texano agredido, com a máxima violência: “olho por olho, dente por dente”, sem seque tentar ver o fenômeno novo que o desafiava e que depois foi chamado de “terrorismo global”.

Declarou guerra sem quartel ao terrorismo, passando por cima da opinião de seus aliados da “velha Europa”, onde França e Alemanha opuseram, justamente, resistência. Não levou em consideração a solidariedade que o mundo – em todos os continentes – unanimemente manifestou aos Estados Unidos e só pensou em exercer as represálias de acordo com a superpotência militar que era e continua sendo, mas com um senso de vulnerabilidade e com os erros colossais que desde então cometeu. Sem remédio.

Passou quase uma década, a primeira do Século 21. E o terrorismo, embora seguramente debilitado, não foi vencido. Longe disso. Não se sabe onde está Bin Laden, nem se está vivo. Mas a Al Qaeda continua atuando e está presente em vários continentes, embora afortunadamente reduzida. Entretanto, o mundo mudou velozmente e a relação de forças se modificou.

A China se converteu na segunda potência econômica mundial, em competição (pacífica) com os Estados Unidos. Surgiram os países emergentes, que hoje exercem grande influência nas relações internacionais. As Nações Unidas perderam prestígio, sobretudo no plano moral, pois não está demonstrando força para fazer cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. A este quadro internacional de extrema complexidade somou-se a crise econômico-financeira global que aflige, com diferente intensidade, todos os Estados do mundo.

A União Europeia perambula e atravessa a pior crise de sua história, que começou com o Tratado de Roma de 1957. Não conta, como no passado, com dirigentes políticos e morais capazes de encaminhá-la. O euro, uma das grandes conquistas europeias, enfrentou recentemente um quadro de crise que ameaçou desagregar os 27 Estados-membros da União Europeia, embora apenas 16 tenham adotado a moeda única. Esse risco, ao que parece, passou, graças – em parte – à China, que compreendeu que o desaparecimento do euro deixaria sua divisa, o iuan, em competição frente a frente com o dólar, o que poderia desequilibrar ainda mais o sistema. Foi uma ajuda para a Europa e para a Alemanha, em especial, que não se deve esquecer.

Em janeiro de 2009, depois de uma vitória eleitoral extraordinária, o afro-americano Barack Hussein Obama, um fenômeno excepcional e inesperado de nosso tempo, assumiu a presidência dos Estados Unidos, para situar-se nas antípodas de seu antecessor e carregar o peso de uma crise mundial cujo epicentro foi precisamente Wall Street. Conseguiu a aprovação no Congresso de uma lei moralizadora que ficará como um modelo indelével na história norte-americana, o mesmo ocorrendo com a reforma da assistência médica. Mas o principal obstáculo permanece porque a crise continua com certos pontos nevrálgicos de natureza internacional que devem ser resolvidos.

Obama sempre foi contrário à invasão do Iraque e favorável a retirar as tropas norte-americanas desse país. O prazo fixado para a retirada aproxima-se e ninguém pode imaginar como ficará esse desgraçado país, arruinado e em guerra civil entre xiitas e sunitas, graças à falta de consciência de um presidente norte-americano (impune) que sacrificou vários milhares de vidas inocentes enquanto algumas empresas ganhavam fortunas, incluídas as de mercenários.
O caso do Afeganistão é ainda pior, já que envolve duas organizações internacionais, a Otan, que se verá em dificuldades para sobreviver à sua intervenção nesse país, e as Nações Unidas, que avalizou uma guerra que não podia ignorar que terminaria mal. Nicholas Kristof escreveu no New York Times que “um soldado norte-americano custa mais do que 20 escolas”, que “esta é a guerra mais cara da história norte-americana” e que Obama solicitou ao Congresso um orçamento militar “6,1% maior do que o mais elevado da era Bush”.

Christoph Schwennicke escreveu na Der Spiegel: “Aos políticos é difícil admitir que estavam errados. No caso do Afeganistão, as consequências de não reconhecer o erro podem ser fatais. Chegou a hora de o Ocidente limitar suas perdas e se retirar”. Este é o terrível dilema que Obama encara. Sem esquecer os outros: a maré negra no Golfo do México, o aquecimento global, a crise econômica mundial, etc. Se ceder ao “complexo industrial-militar” – como o chamou seu antecessor Ike Eisenhower –, terá um imerecido fim – digo com tristeza – na história dos Estados Unidos e do mundo.

* Mário Soares é ex-presidente e ex-primeiro-ministro de Portugal
Publicado originalmente em Envolverde Revista Digital


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