Opinião
|
15 de maio de 2010
|
18:18

Transformação ou morte

Por
Sul 21
[email protected]

II Congresso de Jornalismo Cultural

Renata Peppl*

O II Congresso de Jornalismo Cultural reuniu em São Paulo, no mês de maio, um público de cerca de 500 pessoas para participar de uma proposta, no mínimo, complexa: debater as mais variadas manifestações culturais e suas representações na imprensa, o espaço da cultura na agenda dos grandes veículos de comunicação, analisar a crítica cultural brasileira e as problemáticas sociológicas e econômicas enfrentadas pela produção jornalística na atualidade. No evento, promovido pela revista Cult, especialistas, jornalistas, críticos e artistas apontaram que, para sobreviver, os veículos de comunicação precisam de uma urgente reestruturação e adequação às novas mídias.

O encontro, que contou com mais de duas dezenas de conferências, reuniu um eclético grupo de artistas, jornalistas, sociólogos, professores e críticos nacionais e internacionais – que iam da especialista argentina Beatriz Sarlo ao músico Lobão; passando pelo editor-adjunto da revista francesa Le Magazine Littéraire, Hervé Aubron, até os escritores Ruy Castro e Eric Lax e o sociólogo Chico de Oliveira – para debater uma vasta agenda de temas. Entre divergências e alguns embates acalorados, houve unanimidade entre os palestrantes quando o assunto é o futuro da informação: o jornalismo e o consumo de cultura como se conhece está em crescente crise, e sua sobrevivência está diretamente ligada ao poder de adequação e reinvenção dos meios de comunicação e profissionais da área.

Mesmo não apontando soluções práticas que impeçam o jornalismo de cultura e a crítica brasileira de naufragar na atual crise enfrentada pela imprensa; o encontro foi providencial ao apontar onde estão os buracos e as lacunas que podem acelerar tal naufrágio, alertando para questões que interessam não só ao jornalismo de cultura, mas também à mídia como um todo. A seguir algumas questões levantadas durante o evento

“O ciclo das revistas independentes de cultura está fechado”

Logo em uma das primeiras conferências do evento, a crítica literária argentina Beatriz Sarlo, referência quando o assunto são os estudos culturais na atualidade, deu o tom que pautaria os debates que seguiram, anunciando o período de grandes transformações trazido pela era digital e a necessidade de adequação, não só dos produtores culturais e veículos de comunicação, mas também do público que os consome. Diretora da revista argetina Punto de Vista, fechada recentemente, a crítica foi enfática ao falar do que considera o fim de uma era. “O ciclo das revistas independentes de cultura está encerrado. Falta espaço para um debate político e cultural aprofundado na imprensa, que reconhece o interesse crescente do público em ler sobre uma cultura cotidiana”.

Para ela, o ritmo imposto pela velocidade dos acontecimentos na internet é alheio ao ritmo de leitura e prejudica a retenção das informações. “É uma tarefa árdua tentar terminar um texto na internet quando temos milhões de hyperlinks oferecidos no próprio artigo, que nos encaminhará para outro endereço e assim por diante, numa espiral sem fim. Na internet, temos a sensação de que o melhor está sempre por vir no próximo clique”. Tal realidade, no entanto, não é vistas com maus olhos pela estudiosa. “A tecnologia e o avanço técnico nos obrigam necessariamente a pensar a cultura, e isso por si só já é positivo”.

“Jornalismo impresso são notícias de ontem publicadas em árvores mortas”

Em outro momento do encontro, a professora e pesquisadora da UFRJ, Ivana Bentes, travou um debate acalorado com os companheiros de mesa, a diretora de conteúdo do UOL Márion Strecker e o editor-executivo da Veja, Carlos Graieb, ao falar do novo modelo econômico e estrutural imposto pela internet às grandes empresas de comunicação.

“Estão todos assustados com a democratização da comunicação. Hoje não é preciso mais se pautar através dos grandes veículos, a sociedade é produtora de informação e isso mexe diretamente no modelo econômico fordista que balizava a grande mídia. Há uma mudança no eixo do poder e a economia da informação foi fracionada na internet. Todos precisam se adequar a essa nova estrutura”, defendeu ela, acrescentando também que os veículos impressos terão de mudar profundamente a sua organização se quiserem sobreviver à era da internet. “Jornalismo impresso são notícias de ontem publicadas em árvores mortas e isso é muito antiquado”, resumiu.

Somando coro ao discurso de Ivana, Joaquim Ferreira dos Santos, escritor e colunista do jornal O Globo também manteve a mesma descrença. “O jornal, como conhecemos, está com os dias contados. Enquanto jornalismo digital é cheio de energia e causa discussão, o impresso está arcaico, pesado, difícil de ler e redundante”. Para a diretora de conteúdo do UOL, o problema vai além do embate travado entre jornalismo impresso e digital. “Mais do que isso, há uma crise no papel do jornalista como pensador e mediador, entre a cultura, bens culturais e o público. o papel do crítico e do jornalista vem diminuindo, e isso que afeta o jornalismo em geral, mas principalmente o jornalismo cultural nos grandes meios”.

Para saber mais, o site do encontro traz vídeos de entrevistas e informações detalhadas em http://revistacult.uol.com.br

*Renata Peppl é jornalista.


Leia também