Coronavírus
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13 de janeiro de 2022
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12:27

Em meio a nova onda de contaminação, redução do tempo de isolamento por covid causa dúvida

Por
Luciano Velleda
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Todos os sintomas relatados começaram após a infecção aguda. Foto: Prefeitura Municipal de Arapongas
Todos os sintomas relatados começaram após a infecção aguda. Foto: Prefeitura Municipal de Arapongas

O governo de Eduardo Leite (PSDB) anunciou nesta quarta-feira (12) novas orientações quanto ao tempo de isolamento de pessoas com covid-19. O prazo, que já foi de 14 dias e estava em 10 dias, agora pode ser reduzido para um mínimo de cinco dias, dependendo dos sintomas apresentados e da situação vacinal do paciente.

Para quem está com o esquema vacinal completo, o prazo será determinado após avaliação dos sintomas: cinco dias para quem não apresentar febre (ou estiver assintomática) e sete dias para quem teve febre. O prazo muda para pessoas com o diagnóstico de covid-19 e que ainda não tenham o esquema vacinal completo: para esses, o prazo de isolamento permanece em 10 dias, contados a partir do início dos sintomas.

A nova orientação do governo estadual ocorre dois dias após o Ministério da Saúde anunciar medidas semelhantes. A principal diferença é que o governo federal recomenda o fim do isolamento em cinco dias apenas para quem era realizar teste (RT-PCR ou teste rápido de antígeno) para covid-19 com resultado negativo no 5º dia, desde que não apresente sintomas respiratórios e febre, há pelo menos 24 horas, e sem o uso de antitérmicos.

Porém, se o resultado for positivo, é necessário permanecer em isolamento por 10 dias a contar do início dos sintomas. E para aqueles que no 7º dia ainda apresentem sintomas, o Ministério diz ser obrigatória a realização do teste – orientação não dada pelo governo Leite. Nesse caso, se o resultado for negativo a pessoa deverá aguardar 24 horas sem sintomas para sair do isolamento. Caso o teste dê positivo, deverá ser mantido o isolamento por pelo menos 10 dias contados a partir do início dos sintomas.

Todas essas mudanças no Brasil e no RS ocorrem após o CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos) anunciar a redução do tempo de isolamento (para quem testa positivo) e de quarentena (para quem teve contato com pessoa infectada) no final de dezembro. Na ocasião, a decisão do órgão americano foi criticada por médicos e cientistas e bem-vinda por setores econômicos que sofriam com o afastamento de um grande número de funcionários contaminados.

Para Alexandre Zavascki, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), houve um erro de comunicação do CDC dos Estados Unidos e de interpretação da comunidade. Ele explica que os documentos do CDC dizem que os pacientes assintomáticos no 5º dia poderiam retomar suas atividades usando máscara bem ajustada até o 10º dia.

“Eles mantiveram uma proteção adicional assumindo que existe uma proporção de pacientes que, a partir do quinto dia, ainda conseguem eliminar o vírus”, avalia.

O professor de Medicina da UFRGS diz que o tempo de cinco dias, no caso da variante ômicron, não surgiu de estudos virológicos, e sim de dados epidemiológicos iniciais com a nova variante. Esses dados indicam que os casos secundários, ou seja, as contaminações partir dos casos iniciais, ocorrem no começo da doença e não muitos dias depois. “Eles viram que a fase inicial dos primeiros cinco dias era a fase principal de transmissão da ômicron”, explica.

No entanto, Zavascki alerta que isso não significa dizer que não há transmissão após o 5º dia, e esse foi justamente o erro ocorrido na interpretação feita do documento do CDC. Para o infectologista, faltou ao órgão americano ter enfatizado tal ponto.

“Eles não disseram isso (que não pode haver contaminação depois do quinto dia), mas não enfatizaram, e todo mundo leu, médicos e muitas empresas, e entenderam errado que depois de cinco dias está ‘liberado todo mundo’”, pondera.

Em sua orientação, o CDC ainda declarou ser preciso avaliar se no 5º dia o paciente já estava sem sintomas, sem febre nas últimas 24h e se podia usar a máscara nos dias seguintes. Tais orientações acabaram sendo ignoradas pela comunidade médica e científica, que Zavascki diz também não ter divulgado adequadamente.

“Houve um grande erro de comunicação nisso tudo. Infelizmente a comunicação continua sendo um grande problema. Se ler com calma todo o documento, que não é longo, está tudo escrito ali, mas infelizmente cada vez mais se lê apenas o que interessa e têm pessoas que se aproveitam disso”, lamenta, citando que por esse motivo pessoas começaram a voltar ao trabalho antes do tempo correto e sem preencher os critérios básicos.

Zavascki salienta que alguns pesquisadores propunham a realização de teste rápido de antígeno no 5º dia do isolamento – medida agora orientada pelo Ministério da Saúde, mas não pelo governo gaúcho. Em caso de resultado negativo, associado com a ausência de sintomas, haveria então maior segurança de que a pessoa não estaria mais transmitindo o vírus. E, claro, seguir usando máscara.

“Se tiver esses três componentes realmente vai ser seguro. O maior desafio é conseguir com que as pessoas cumpram o primeiro (não ter mais sintoma). A grande pressão das pessoas que empregam, pra ter o trabalhador de volta…as vezes com sintomas não claramente resolvidos ou não ter mais as 24h sem febre. Esse é o grande desafio”, opina.

A nova orientação do Ministério da Saúde é bem vista pelo professor de Medicina da UFRGS. “Mesmo sem ter estudos virológicos, a partir de estudos epidemiológicos mostrando que esse é o período principal e que poucas pessoas vão transmitir depois do quinto dia, lembrando que ‘poucas’ não é ninguém, se a gente colocar o teste de antígeno haverá uma segurança maior”, conclui.

Também infectologista e mestre em Ciências Médicas, Ronaldo Hallal faz questão de enfatizar que o momento da pandemia no Brasil, com o crescimento da contaminação causado pela variante ômicron, deveria ser o de aumentar medidas de prevenção e não o contrário.

Embora a nova variante parece ser menos agressiva do que as anteriores, ela é mais transmissível e, ao atingir um número maior de pessoas, em escala a quantidade de vítimas doentes também aumenta, algumas com doença grave.

Hallal recorda que os Estados Unidos acaba de passar por uma espécie de colapso em determinadas atividades econômicas devido a ausência de trabalhadores, afastados pela covid. Houve fechamento do comércio, cancelamento de voos e falta de profissionais de saúde.

O infectologista considera que o impacto na economia pode ter influenciado a orientação do CDC para reduzir o tempo de isolamento, embora também concorde que os dias iniciais da doença sejam o auge do período de contágio, podendo no entanto se estender até o 10º dia.

“Como a ômicron é uma situação nova, não há ainda dados epidemiológicos confiáveis o suficiente para dar segurança, do ponto de vista técnico, de que a pessoa não transmitirá depois do quinto dia, mesmo que seja assintomática”, afirma. “Me parece que é uma medida mais relacionada a reduzir o tempo de afastamento das pessoas do trabalho do que por um dado produzido relacionado a ômicron.”

Ao mesmo tempo, Hallal pondera que algumas análises indicam que pessoas vacinadas transmitem por menos tempo a ômicron do que outras não vacinadas. Nesse sentido, o infectologista diz que a redução do tempo de isolamento faz mais sentido para quem está imunizado.

De qualquer forma, Hallal insiste que o atual momento da crise sanitária no País pede reforço nas medidas preventivas. A questão, diz ele, é que o Brasil nunca conseguiu, de fato, fazer testagem em massa e convencer a população a fazer quarentena. A chegada da ômicron neste momento e o rápido domínio sobre outras variantes tampouco é supresa, haja visto o que aconteceu antes na Europa e nos Estados Unidos.

“Acho que não seria o momento oportuno pra se reduzir isolamento, mas seria o momento oportuno pra se reforçar uma política de prevenção, com uso de máscara adequada, algo que a gente vem discutindo desde o ano passado”, destaca.

Embora avalia como inoportuna a redução do isolamento no contexto epidemiológico que o Brasil está vivendo, a medida não o surpreende por ser reflexo do que define como uma falta de política de proteção da vida da população. Hallal ainda demonstra preocupação com os comentários de que a ômicron é “leve”, pois isso banaliza a prevenção e sinaliza que não é mais um problema de saúde pública.

O infectologista diz que a tese da ômicron ser a variante que pode levar ao fim da pandemia, por ser menos virulenta e mais contagiosa, é outro debate e que só poderá ser melhor compreendido nos próximos meses ou anos.

Pessoa sem esquema vacinal completo

  • Isolamento domiciliar de dez dias (a contar do início dos sintomas).
  • Procurar novamente atendimento se houver febre persistente.
  • Reforçar o uso de máscaras.
  • Contactantes domiciliares assintomáticos podem manter atividades, desde que reforçados os cuidados de uso de máscara e distanciamento.

Pessoa com esquema vacinal completo e que não apresentou febre (ou assintomática)

  • Isolamento domiciliar de cinco dias.
  • Procurar atendimento se apresentar febre no quarto ou quinto dia de isolamento.
  • Reforçar o uso de máscaras, em especial por dez dias.
  • Contactantes domiciliares assintomáticos podem manter atividades, desde que reforçados os cuidados de uso de máscara e distanciamento.

Pessoa com esquema vacinal completo que apresentou febre

  • Isolamento domiciliar de sete dias (a contar do início dos sintomas).
  • Procurar atendimento se apresentar febre no sexto ou sétimo dia de isolamento.
  • Reforçar o uso de máscaras, em especial por dez dias.
  • Contactantes domiciliares assintomáticos podem manter atividades, desde que reforçados os cuidados de uso de máscara e distanciamento.

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