Saúde
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12 de julho de 2022
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17:49

‘Nossa presença pode ajudar a mitigar violências como essa do Rio’, defende Associação de Doulas

Por
Duda Romagna
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Debate sobre violência obstétrica e a presença de acompanhantes é reforçado por caso de estupro no Rio. Foto: Lela Beltrão/ Coletivo Buriti
Debate sobre violência obstétrica e a presença de acompanhantes é reforçado por caso de estupro no Rio. Foto: Lela Beltrão/ Coletivo Buriti

Na segunda-feira (11), um médico anestesista foi preso em flagrante por estupro durante um parto no Hospital Estadual da Mulher, em São João de Meriti, no Rio de Janeiro. A equipe de enfermagem do hospital já desconfiava das práticas do médico, que aplicava mais sedativos do que o necessário, e por isso, o filmou. As imagens mostram o médico em ato de sexo oral com a mulher desacordada por cerca de 10 minutos, enquanto a equipe, separada apenas pelo lençol azul do chamado campo cirúrgico, realiza a cesariana.

O caso reforçou o debate sobre a presença de acompanhantes durante o parto e, também, de doulas, profissionais que acompanham a gestante durante o período de gravidez, parto e pós-parto. Segundo Gabrielle Araujo, coordenadora geral da Associação de Doulas do Rio Grande do Sul, “a doula não vem para tirar o lugar de ninguém da equipe assistencial, não faz nenhum tipo de procedimento técnico, a função dela não compete ou se confunde com a função de qualquer outro profissional na cena do parto. Nossa função é dar apoio emocional e físico para essa mulher”.

Ainda para Gabrielle, a violência obstétrica, termo utilizado para caracterizar abusos sofridos por gestantes quando procuram serviços de saúde durante a gestação, na hora do parto, nascimento ou pós-parto, possui um caráter de violência a corpos em momentos de fragilidade e vulnerabilidade. “Aquela situação, a forma como um profissional se sente à vontade para estuprar uma mulher numa sala pública, aberta, com pessoas passando, mostra o quanto nós não estamos seguras em lugar nenhum, o quanto nós estamos vulneráveis, o quanto nós ainda somos lidas como corpos que podem sofrer qualquer coisa. Nossa presença pode ajudar a mitigar violências como essa do Rio ”, defende.

A rotina comum de instituições de saúde permite a entrada do acompanhante de escolha da mulher somente após a internação. A parturiente fica sozinha na preparação para a cesariana, enquanto recebe a anestesia e somente no momento da cirurgia o acompanhante tem sua entrada autorizada. Essa prática viola a Lei Nº 11.108, de 7 de abril de 2005, também conhecida como Lei do Acompanhante, que garante às parturientes o direito da presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

Durante a pandemia, restrições foram impostas à presença de acompanhantes e doulas. Segundo Gabrielle, diversas manifestações de Ministérios Públicos estaduais reforçaram que não se deveria restringir a presença, uma vez que se tratava de um direito fundamental da gestante, previsto em lei.

A doula explica ainda que a presença de um acompanhante pode nem ser suficiente para atender às necessidades maternas. “Muitas vezes o acompanhante precisa acompanhar o bebê e a mulher volta a ficar sozinha. Nós consideramos que é ainda mais fundamental a garantia da presença da doula, quando a mulher deseja ter uma. Porque sabemos que tem diversos momentos em que a atenção vai ficar dividida e quem tá ali para cuidar exclusivamente da mulher, para não deixar que ela fique sozinha em nenhum momento, é a doula”, explica Gabrielle.

Homenagem à Associação de Doulas do Rio Grande do Sul. Foto: Ederson Nunes/CMPA

No âmbito do Rio Grande do Sul, entretanto, não há qualquer lei estadual que disponha sobre a presença das doulas quando solicitado pela parturiente, ao contrário de outros 17 estados, além do Distrito Federal, que já possuem legislação. Atualmente tramita na Câmara Municipal de Vereadores de Porto Alegre o Projeto de Lei 79 de 2021, de autoria da vereadora Laura Sito (PT), que dispõe sobre a presença da doula. Segundo Gabrielle, dois hospitais privados da Capital já permitem a presença de doulas, embora não exista a lei.

“Nós entendemos que a lei é indispensável para dar esse direito para todas as gestantes parturientes, não só da rede privada. Nós sabemos que a maioria dos partos acontecem no SUS e que a maioria das mulheres vai ganhar seus bebês no SUS e para que essas mulheres também possam ter assistência da sua doula, quando assim elas julgarem necessário e oportuno”, declara.

Na segunda-feira (11), a Câmara homenageou a Adosul pela sua atuação e, logo após, o Projeto de Lei foi votado em sessão conjunta das comissões e aprovado. Assim, o texto deve seguir ao plenário nos próximos dias.


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