Eleições 2022
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6 de setembro de 2022
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18:27

Proibição de celulares em cabines de votação causa medo de violência em mesários

Por
Flávio Ilha
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Mesários temem reações dos eleitores no dia de votação. Foto: Tania Rêgo/Agência Brasil
Mesários temem reações dos eleitores no dia de votação. Foto: Tania Rêgo/Agência Brasil

Mesários e presidentes de seções eleitorais estão com medo de episódios violentos na eleição do próximo dia 2 de outubro em função de resolução do TSE determinando que nenhum eleitor entre com equipamentos eletrônicos – especialmente celulares – nas mesas de votação. A norma, aprovada por unanimidade pelo plenário do Tribunal no último dia 1º de setembro, é para resguardar o sigilo do voto.

Caberá aos mesários abordar os eleitores informando sobre a proibição. E os presidentes de mesa deverão fazer a guarda dos aparelhos enquanto o eleitor estiver votando. Profissionais convocados a trabalhar no pleito, entretanto, reclamam que não receberam qualquer orientação sobre como aplicar a medida e, principalmente, como agir em caso de recusa por parte do eleitor.

“Apesar de concordar com a medida, acho que não deveria caber a nós essa abordagem. Como não haverá ninguém mediando essa situação, qualquer coisa pode acontecer. Posso ser muito gentil ao informar da proibição, mas o eleitor pode não entender assim e ter uma reação violenta. Eu estou com medo”, relata a presidente de mesa Maíra Lopes de Araújo, de Porto Alegre.

A professora, que trabalha nas eleições desde 2018, informa que até o momento não recebeu qualquer informação do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) sobre como proceder para colocar a determinação em prática. Araújo conta que nas eleições majoritárias de 2018 já foram registradas agressões verbais contra mesários. “Houve casos de eleitores quebrando urnas portando armas em locais de votação. Com mais essa norma, meu medo é que os ânimos fiquem ainda mais exaltados”, revela.

A resolução define que está proibido portar aparelho de telefonia celular, máquinas fotográficas, filmadoras, equipamento de radiocomunicação ou qualquer instrumento que possa comprometer o sigilo do voto, “mesmo que desligado”. O texto acrescenta que o mesário deverá perguntar ao eleitor se carrega algum celular ou outro aparelho que possa registrar ou transmitir o voto e reter tais aparelhos até que a pessoa saia da cabine de votação.

Caso o eleitor se recuse a responder ou a entregar o aparelho, “não será autorizado a votar e a mesa receptora constará em ato os detalhes do ocorrido e acionará a força policial para que tome as providências necessárias, sem prejuízo de comunicação à juíza ou juiz eleitoral”, destaca a resolução.

O mesário Fernando dos Santos Campos também reclama da falta de orientações do TRE sobre a conduta no dia de votação. Atuando em Canoas, na região metropolitana, ele diz que tem medo da reação de muitos eleitores. “Não tenho nada contra a decisão em si, que acho correta. Mas como vamos contornar uma recusa, a revolta de algum eleitor com a proibição ou a insistência em votar mesmo portando celular? Não há segurança nas seções eleitorais, então acredito que estaremos em posição de vulnerabilidade”, diz.

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

A proibição de equipamentos eletrônicos nas cabines de votação nem é nova. É uma norma que vale desde 2009. A novidade é a expressão “mesmo desligados” da nova resolução do TSE. “Não se trata de uma decisão para cercear qualquer direito eleitoral, e sim para impedir eventuais abusos em relação a eleitores vulneráveis a pressões. Sem ter como comprovar em quem votou, esses cidadãos podem se sentir seguros e livres em relação às suas escolhas”, justifica o secretário de Tecnologia de Informática do TRE, Daniel Wobeto.

A mesária Carolina Chagas Schneider também prevê a ocorrência de incidentes, até porque o clima de polarização está mais acirrado que em 2018. “Por conta disso, algumas pessoas podem ir para a seção eleitoral dispostas justamente a criar problemas”, diz a voluntária, que trabalha em eleições desde 2012. Ela também não recebeu qualquer orientação por parte do TRE sobre os procedimentos a serem adotados.

Marina Mattos, presidente de mesa no município de Barra do Ribeiro, diz que já recebeu orientações do seu cartório eleitoral em treinamento realizado um dia após a resolução do TSE ser publicada. “O celular de preferência deverá ficar na mesa do presidente. Ou em um local neutro, que fique à vista do eleitor e também dos responsáveis pela seção eleitoral”, revela. Perguntada se tem medo de que alguma confusão possa acontecer devido à norma do TSE, Mattos é taxativa: “Com certeza”.

Daniel Wobeto, do TRE, diz que os 108 mil mesários e presidentes de seções eleitorais que trabalharão nas eleições deste ano serão orientados sobre os procedimentos quando buscarem o material de votação em seus cartórios eleitorais. Ele espera que haja bom senso por parte de eleitores e de mesários, mas admite que algumas situações extremas podem causar transtornos ao processo eleitoral.

“Se qualquer eleitor insistir em ingressar na cabine portando aparelho celular, o mesário tem obrigação de impedi-lo de votar. Se continuar insistindo, então pode chamar as forças de segurança”, recomenda. Em hipótese alguma, porém, o mesário ou presidente de seção eleitoral têm o direito de revistar os eleitores para saber se estão ou não com aparelhos de telefone.

Outra situação é se o eleitor for pego em flagrante registrando seu voto na cabine. Nesse caso, também se recomenda que a Brigada Militar seja chamada para registrar o flagrante de crime eleitoral. O eleitor deverá ser conduzido a uma delegacia para registro de ocorrência, que posteriormente será encaminhada ao Ministério Público Eleitoral para a devida ação penal.

Wobeto também confirmou que os presidentes de seção deverão providenciar um local neutro para receber os celulares enquanto os eleitores votam. O local deverá ficar tanto à vista do eleitor quanto da equipe que encaminha a votação, para assegurar que não haverá violação ao princípio do voto secreto.

No caso do porte de armas, a resolução do TSE determinou que os equipamentos não se aproximem das urnas. “A força armada se conservará a 100 metros da seção eleitoral e não poderá aproximar-se do lugar de votação, ou dele adentrar, sem autorização judicial ou do presidente da mesa receptora, nas 48 horas que antecedem o pleito e nas 24 horas que o sucedem, exceto nos estabelecimento penais e nas unidades de internação de adolescentes, respeitado o sigilo do voto”, determinou o Tribunal.

A vedação se aplica a todos os civis, mesmo para quem possui autorização para porte de arma ou licença estatal. A exceção é dada somente aos agentes de segurança que estiverem a serviço da Justiça Eleitoral, quando autorizados pelo juiz responsável pela seção ou pelo presidente da mesa receptora de votos.

A vedação também não se aplica a agentes de segurança em atividade de policiamento no dia de votação. Quem desrespeitar a proibição deverá ser alvo de “prisão em flagrante por porte ilegal de armas, sem prejuízo do crime eleitoral incidente”, diz o novo texto da norma eleitoral. A fiscalização, entretanto, não caberá aos mesários nem aos presidentes de mesa.


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