Política
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12 de fevereiro de 2022
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09:00

Federações partidárias: o que esperar das mudanças no sistema eleitoral brasileiro

Por
Fernanda Nascimento
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Plenário da Câmara dos Deputados. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil
Plenário da Câmara dos Deputados. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

A validação das federações partidárias pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na quinta-feira (10), gerou uma série de dúvidas sobre a repercussão eleitoral dos agrupamentos de partidos. Especialistas ouvidos pelo Sul21 avaliam que a medida é benéfica para o sistema eleitoral brasileiro e permitirá a formação de alianças mais sólidas e coesas. Em contrapartida, a verticalização é apontada como um entrave para os acordos entre os partidos. O prazo para o registro das federações junto à justiça eleitoral é 31 de maio.

Diferentemente das extintas coligações partidárias proporcionais, que permitiam a reunião de partidos em chapas conforme o pleito e a região disputada, as federações são uniões entre legendas que precisam de uma coesão nacional, estadual e municipal e que devem durar, pelo menos, quatro anos.

A criação das federações atende especialmente a demanda dos pequenos e médios partidos e foi aprovada pelo Congresso Nacional em setembro de 2021. Com o fim das coligações, em 2017, e o estabelecimento de uma cláusula de barreira que limita o acesso ao fundo partidário e a propaganda eleitoral gratuita de rádio e televisão a um percentual mínimo de votos recebidos ou de parlamentares eleitos, muitas siglas poderiam ficar sem os recursos.

Na análise do advogado e professor em Direito Eleitoral Gustavo Paim, as federações são um modelo eleitoral interessante, ainda que pudessem ter sido criadas após uma avaliação mais ampla da sociedade sobre o fim das coligações. “O fim das coligações foi benéfico, ele reduziu a fragmentação de partidos nas câmaras municipais, que é algo que dificulta a governabilidade. Talvez pudéssemos ter esperado o processo eleitoral de 2022, pois esse seria o momento para aferir, para saber o impacto dessa medida nas assembleias e no Congresso Nacional”, pondera.

Paim afirma que, mesmo sendo diferente, em alguma medida a federação contempla os partidos que dependiam das coligações: “A federação atende um pouco essa questão. Mas ela não é tão efêmera, não dura apenas uma eleição. Então é algo mais estável e menos provisório”. Para a advogada e especialista em Direito Eleitoral Maritânia Dallagnol, as federações podem ser um “impulso” para a redução da barganha de cargos e recursos que acontece com a pulverização de partidos no cenário nacional. “Em um momento delicado da política nacional, podem ser uma forma de estabelecer um mínimo de governabilidade, de facilitar o trabalho dentro do Congresso Nacional, sem tantas negociatas como a gente observa”.

O julgamento sobre a constitucionalidade das federações pelo STF ocorreu porque o PTB ingressou com uma ação questionando a legislação. Apesar de já estar em debate há meses, a criação de uma federação em 2022 não foi confirmada por nenhum partido. A principal questão apontada pelos especialistas é a chamada “verticalização”. Na avaliação do secretário geral adjunto da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP), Volgane Carvalho, este é o grande dilema dos partidos. “A federação é uma chance para partidos que querem se salvar da possibilidade de não atingir a cláusula de barreira. Mas, ao mesmo tempo, para a federação funcionar, os partidos têm que fazer concessões e sacrifícios, porque a decisão de criar uma federação em 2022 não poderá ser desfeita nas eleições de 2024”, afirma. “Quais partidos vão se beneficiar da federação? Aqueles que tiverem a capacidade de construir um programa mínimo. Mas a verticalização é uma barreira porque nós temos uma cultura política diferenciada nos estados e, especialmente, nos municípios em relação a como atuam as siglas em nível nacional ”, comenta Maritânia.

A união dos partidos não terá impacto apenas nas eleições. Ao se federarem, as siglas também terão atuação conjunta no parlamento, como uma bancada. “O estatuto de cada federação terá que responder algumas perguntas: Como se escolhe o líder da bancada? Como serão distribuídos os cargos? Como será a representação na mesa diretora dos legislativos? Qual a punição para quem desobedecer as regras?”, elenca Carvalho. Maritânia também acredita que estruturar as regras e acordos para as federações será um dos grandes desafios. “Sequer os próprios partidos conseguem que os deputados cumpram suas determinações. Então, ao se federarem, os partidos precisarão prever regras de fidelidade e de punição para aqueles parlamentares que não seguirem as orientações da federação”, avalia.

E, caso algum político que fique descontente com o ingresso de seu partido em uma federação, este ano não haverá tempo hábil para a troca de partido, como explica o advogado e fundador do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral (IGADE), Lucas Lazari. “Os políticos que vão disputar as eleições fazem cálculos sobre a mudança de partido e a federação será mais um elemento nessa equação. Só que, neste ano, a janela fecha em 2 de abril. E a data para o registro de federações é em 31 de maio. Então, muitos políticos ou pessoas que pretendem disputar as eleições e querem entrar em partido ainda não terão certeza se a sigla estará pertencendo a uma federação nas eleições”, disse.

A criação de federações partidárias é uma novidade no Brasil, mas essa estrutura de alianças entre partidos já acontece em outros sistemas eleitorais no mundo. Portugal e Uruguai são exemplos de locais com uma cultura de voto em federações e que podem inspirar mudanças na cultura eleitoral brasileira.


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