Política
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7 de agosto de 2021
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08:34

Privatização dos Correios pode encarecer serviço e privilegiar investimento privado nas grandes cidades

Por
Luciano Velleda
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A ECT, em 2020, obteve lucro líquido de R$ 1,5 bilhão. (Correios/Divulgação)
A ECT, em 2020, obteve lucro líquido de R$ 1,5 bilhão. (Correios/Divulgação)

O primeiro importante passo para a privatização dos Correios foi dado. Na última quinta-feira (5), a Câmara aprovou o texto-base do Projeto de Lei 591/21, que privatiza todos os serviços postais no Brasil. Foram 286 votos favoráveis e 173 contrários. 

A proposta estabelece condições para a privatização da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e remete a regulação do setor à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Segundo o substitutivo aprovado, elaborado pelo deputado Gil Cutrim (Republicanos-MA), o monopólio para carta e cartão postal, telegrama e correspondência agrupada continuará com a ECT por mais cinco anos, podendo o contrato de concessão estipular prazo superior.

Alexandre dos Santos Nunes, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Correios e Telégrafos (Sintect-RS), critica a forma açodada como a aprovação foi feita. Para ele, os parlamentares deveriam estar mais preocupados em votar e aprovar mediadas que ajudem a população brasileira, em meio à grave crise do coronavírus, econômica e de desemprego.

“Nosso país está tomado de aproveitadores. Em meio a uma pandemia, ao invés de votar coisas para ajudar o povo e os trabalhadores, votam em regime de urgência propostas como essa dos Correios”, lamenta.

Nunes diz que a privatização coloca em risco quase 100 mil trabalhadores dos Correios, e deve causar a falta de acesso ao serviço às pessoas mais pobres e moradores de cidades pequenas ou mais isoladas do País.

“Acaba a universalização do serviço postal. É uma baita mentira o que falam, que agora é que vai ser garantida a universalização… não vai, é o Correio que garante. O que estão fazendo é vendendo facilidade pro setor que quer explorar o lucro da venda de encomendas, e o Correio é a principal liderança do setor, então eles preferem eliminar o Correio”, afirma.

Ele destaca que 92% da arrecadação dos Correios ocorre em apenas 324 municípios dentre as mais de 5 mil cidades brasileiras — todos os municípios restantes são mantidos com o subsídio cruzado obtido nestas 324 cidades. “Na lógica da iniciativa privada, onde ela vai botar postos? Ela não vai botar onde não dá lucro. Então é bastante complexa essa discussão e foi tudo atropelado, não fez sentido nenhum ser em regime de urgência uma discussão dessas.”

Entre as consequências da privatização dos Correios, o secretário-geral do Sintect-RS dá o exemplo do pequeno comerciante que vende algo pela internet e depois posta seu produto para entregar ao cliente. Hoje esse comerciante faz isso diretamente numa agência dos Correios. Com a privatização, ele avalia ser possível que esse comerciante tenha que fazer o serviço por intermédio de outra empresa e pagar mais caro, pois atualmente a tabela de preço dos Correios regula o mercado.

“Mesmo não sendo formal, extra-oficialmente o Correio regula o preço do mercado. Sem o Correio, esse preço dispara e a pessoa vai estar à mercê de negociar com algumas transportadoras”, explica. A situação pode ser pior nas cidades pequenas do interior, com poucas opções de transportadoras, principalmente em remessas para locais mais distantes. Nunes lembra ainda que há cerca de 300 cidades brasileiras sem agência bancária. Nestes locais, os Correios servem para suprir a falta de acesso ao sistema bancário.

Depois de aprovada na Câmara, a privatização dos Correios será analisada no Senado, ainda sem data confirmada. Em suas manifestações, o senador Paulo Paim (PT-RS) tem insistido na rentabilidade dos Correios e questiona quem sairá ganhando com a privatização da empresa. “A empresa Correios está presente em todo o Brasil, nos mais longínquos rincões. No ano passado, foram entregues 343 milhões de encomendas: 28 milhões de encomendas por mês e 1,3 milhão de encomendas por dia. Em 2020 o lucro foi de R$ 1,5 bilhão. A quem interessa a privatização?”

O senador Humberto Costa (PT-PE) também enfatiza o lucro da empresa pública e diz que votará contra sua privatização. “Em 20 anos, os Correios deram lucro de R$ 20 bilhões, e a União embolsou 73% disso. Mesmo assim, o argumento do governo é de que a empresa é deficitária para vendê-la na bacia das almas. É mais um passo do desmonte do Estado brasileiro, da dilapidação a passos largos do patrimônio público. Vamos oferecer toda nossa oposição a mais esse projeto nefasto do governo Bolsonaro.”


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