Meio Ambiente
|
1 de dezembro de 2021
|
11:49

Parque em São Francisco de Paula é inaugurado com licenciamento ambiental sob suspeita

Por
Luciano Velleda
[email protected]
Dedicado ao paisagismo, parque divulga ter 7 milhões de plantas e mais de 300 espécies. Foto: Vanessa Pedrotti/ Mátria Parque/Divulgação
Dedicado ao paisagismo, parque divulga ter 7 milhões de plantas e mais de 300 espécies. Foto: Vanessa Pedrotti/ Mátria Parque/Divulgação

Com mais de 30 jardins, o Mátria Parque de Flores foi inaugurado na última sexta-feira (26) em São Francisco de Paula. O audacioso empreendimento privado, com dezenas de jardins, já vinha movimentando a cidade bem antes da abertura oficial, contando inclusive com ampla divulgação da prefeitura. Para além do aroma e colorido das flores, o empreendimento tem chamado atenção por uma série de denúncias de ilegalidades e irregularidades envolvendo as etapas de licenciamento do projeto denunciadas pelo Instituto Mira-Serra, com pedidos de explicação do Ministério Público Estadual (MPE) ainda sem resposta.

As denúncias fazem referência a ordem legal de documentos e aspectos relativos à conservação da flora e da fauna. Na parte da documentação, o Instituto Mira-Serra denunciou ao MPE que a Licença Prévia e de Instalação (LP/LI) do empreendimento (e o início de irrigação dos jardins) foi expedida sem a outorga de uso da água, inclusive com o uso de informações inverídicas no cadastro do Sistema de Outorga de Água.

O Instituto Mira-Serra aponta também ausência de comprovação da averbação de área para compensação ambiental, ausência da anuência da unidade de conservação municipal e inexistência de laudo técnico para caracterização do “açude artificial”.

Com relação a preservação da flora, a denúncia aborda problemas com a compensação ambiental, a reposição florestal com espécies impróprias, a autorização para introduzir espécies exóticas invasoras em área de Mata Atlântica, e o risco da introdução de outras espécies vegetais não especificadas na Licença Prévia e de Instalação (LP/LI).

A entidade ambientalista destaca que a Licença de Operação (LO) do Mátria Parque foi expedida pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) apenas na antevéspera da inauguração, embora os ingressos já estivessem à venda há meses. Com a LO expedida quase no dia da abertura oficial do parque, o Instituto Mira-Serra destaca ter sido inviável analisar a execução das compensações e condicionantes ambientais exigidas por lei.

Outra dúvida que cerca a atuação da Prefeitura de São Francisco de Paula refere-se ao tamanho do empreendimento. Nos canais de informação do município, consta que o Mátria Parque tem 135 hectares para o “visitante usufruir”, porém, a Licença Prévia e de Instalação (LP/LI) concedida para o negócio se refere a 20 hectares – área limite para a licença ser expedida pelo município, conforme a resolução 372/2018 do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema).

“As dimensões do empreendimento, divulgadas pelo Executivo Municipal, extrapolam a competência municipal para licenciamento ambiental de Parque Temático – o que incorreria em fraude na emissão da LP/LI ou em propaganda enganosa e, novamente, em usurpação de competência estadual”, diz trecho de ofício encaminhado pelo Instituto Mira-Serra ao MPE.

Conforme a denúncia, a discrepância entre o tamanho do parque divulgado pela Prefeitura e o que consta na Licença Prévia e de Instalação (LP/LI) traz a dúvida se a Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Sustentabilidade de São Francisco de Paula licenciou sobre o território do município vizinho de Canela.

As denúncias sobre a atuação da Prefeitura de São Francisco de Paula no processo de licenciamento ambiental do Mátria Parque tramitam no Ministério Público Estadual (MPE) desde meados de setembro, dois meses antes da inauguração do empreendimento.

No último dia 9 de novembro, o órgão notificou a Prefeitura para que se manifestasse acerca das irregularidade denunciadas. Sem resposta, no dia 28 de novembro, dois dias após a inauguração do Parque, o promotor de Justiça Bruno Pereira fez novo despacho determinando prazo de 10 dias para o Executivo Municipal se posicionar sobre a denúncia, e 5 dias para a Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) enviar a cópia integral do processo de licenciamento ambiental do Mátria Parque. No mesmo dia, o promotor concedeu 10 dias de prazo para os responsáveis pelo empreedimento também se manifestarem sobre as denúncias.

Em contato com a reportagem do Sul21, a secretária de Meio Ambiente de São Francisco de Paula, Damiane Maria Boziki, negou ter extrapolado a competência municipal para licenciamento ambiental de Parque Temático.

Ela afirma que a área total do Mátria Parque é de 135 hectares, conforme matrícula do registro de imóveis, mas a área útil do empreendimento ao qual se refere o licenciamento é de 20 hectares, limite máximo licenciado pelo município. Damiane diz que o licenciamento ambiental do empreendimento não extrapolou os limites do município de São Francisco de Paula.

A secretária, porém, não explicou porque então a Prefeitura divulgou que o visitante teria 135 hectares para “usufruir”.

“Salientamos que não existe nenhuma irregularidade no processo de licenciamento acima mencionado, ademais todos os processos de licenciamento são públicos e podem ser consultados na Secretaria de Meio Ambiente mediante agendamento, assim como a licença está publicizada no próprio site da prefeitura municipal”, afirma.

Coordenadora do Instituto Mira-Serra, a bióloga Lisiane Becker enfatiza que a entidade não é contra os empreendimentos, no entanto, lamenta o não cumprimento das regras impostas pela legislação. “Esse é o problema. Algo que envolveu tanto dinheiro, está com tanta repercussão na mídia, deveria ter sido feito desde o início de acordo com os ditames legais, porque foram avisados e não era desconhecimento do órgão ambiental.”

Oficialmente, a Prefeitura de São Francisco de Paula e o Mátria Parque ainda não responderam aos questionamentos do Ministério Público Estadual (MPE).


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora