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25 de agosto de 2021
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19:47

‘Nós vivemos aqui nessa terra muito antes de 1988’, lembra cacique guarani em ato no TRF4

Por
Sul 21
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Ato contra o marco temporal foi realizado em frente ao TRF4, em Porto Alegre. Foto: Luiza Castro/Sul21
Ato contra o marco temporal foi realizado em frente ao TRF4, em Porto Alegre. Foto: Luiza Castro/Sul21

Dezenas de indígenas das etnias mbya guarani e kaingang e representantes de comunidades quilombolas realizaram, na tarde desta quarta-feira (25), um ato conjunto de vigília em frente ao prédio do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, contra a tese do marco temporal, que está sendo avaliada no Supremo Tribunal Federal, em Brasília, e em defesa do direito de demarcação das terras indígenas. A manifestação foi organizada pela Teia dos Povos em Luta e pela Frente Quilombola do Rio Grande do Sul. 

Mesmo sob a persistente chuva que caiu na capital gaúcha por toda a tarde, os indígenas permaneceram em frente ao TRF4, protegidos apenas por uma barraca improvisada com uma lona. A direção do Tribunal não autorizou que os manifestantes ficassem no saguão do prédio para se abrigar da chuva.

Manifestantes foram impedidos de ficar sob a sacada do TRF4, para se proteger da chuva. Foto: Luiza Castro/Sul21

Os manifestantes protocolaram um documento no Tribunal manifestando sua posição contra a tese do marco temporal, defendida pelos setores ruralistas, segundo a qual os povos indígenas só devem ter o direito à terra se ficar comprovado que já a ocupavam na data de promulgação da Constituição de 1988.

O cacique Cirilo, da aldeia Mbya Guarani, da Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, disse que a proposta do marco temporal prejudica o futuro de gerações dos povos indígenas. “A terra é nossa vida, a terra é nossa mãe, que foi agredida pelos não-indígenas que só querem fazer dinheiro e não pensam pela vida. O capitalista e o ruralista têm ameaçado esse direito previsto na Constituição Federal de 1988 que garante o direito à demarcação de terras, à autodeterminação. Agora, os brancos não querem respeitar a lei que eles próprios criaram. Nós vivemos aqui nesta terra muito antes de 1988. Vamos enfrentar até o fim esse marco temporal”, disse Cirilo.

“Os brancos não querem respeitar a lei que eles próprios criaram”. Foto: Luiza Castro/Sul21

A vereadora Karen Santos (PSOL) lembrou que Porto Alegre tem 11 retomadas indígenas e no mínimo oito territórios quilombolas em processo de demarcação. “Para nós, que estamos enfrentando a especulação imobiliária e esses novos projetos que o prefeito Melo está trazendo para a cidade, é fundamental resistir contra essa tese do marco temporal, que desconsidera povos nômades e peregrinos que têm uma história milenar dentro do território do Brasil, e também contra o PL 490, que quer legitimar o esbulho e a grilagem”, destacou Karen. Na avaliação da vereadora, a luta dos povos indígenas e quilombolas vai se expressar nas lutas urbanas em Porto Alegre. “Estamos enfrentando um megaempreendimento na Ponta do Arado, a construção das torres do Inter, a reconstrução do Centro Histórico. Todas essas áreas são territórios ancestrais negros e indígenas”, acrescentou.

Representantes de comunidades quilombolas de Porto Alegre também participaram do ato. Foto: Luiza Castro/Sul21

Luis Rogério Machado, do Quilombo dos Machado, criticou a forma como a direção do TRF4 recebeu os manifestantes, não permitindo que ficassem no saguão do prédio, abrigados da chuva. “A recepção deles foi tipo fiquem lá e se ralem. O desdobre deles é a pandemia, mas na verdade é o preconceito e o medo que eles têm da gente se manifestar e falar aquilo que a gente vive e pensa. Da outra vez, a gente até conseguiu entrar lá dentro, mas os caras não deixaram nem a gente sentar. Falem rápido de pé mesmo e  vão embora. Mas a chuva é nossa benção de luta e de luz. Estamos acostumados com isso no nosso dia-a-dia”, afirmou Luis.

Onir Araújo, da Frente Quilombola do RS, informou que os manifestantes protocolaram um documento no TRF4 em nome da Assembleia dos Povos, da Frente Quilombola, da Teia dos Povos, das aldeias, retomadas e quilombos de Porto Alegre destacando a gravidade daquilo que está sendo votado em Brasília. “Território pra nós é tudo. A gente, sem território, não tem política pública, não tem segurança para as crianças e para os mais velhos. É o nosso território que está ameaçado. Por meio dessa tese do marco temporal eles estão querendo confirmar o que roubaram ao longo desses 521 anos dos vários povos que habitaram o Brasil e ainda habitam”, destacou Onir.

Confira mais imagens da manifestação:

Foto: Luiza Castro/Sul21
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