Geral
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14 de agosto de 2021
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10:17

Negros são apenas 5,9% dos repórteres e apresentadores no telejornalismo gaúcho

Por
Andressa Marques
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Dados da pesquisa “A gente não se vê por aqui: o jornalista negro no maior grupo de comunicação do Rio Grande do Sul”
Dados da pesquisa “A gente não se vê por aqui: o jornalista negro no maior grupo de comunicação do Rio Grande do Sul”

Apesar de representarem 56% da população brasileira, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os negros são apenas 5,97% dos profissionais de Jornalismo das sete principais emissoras com programas telejornalísticos no Rio Grande do Sul. “O Brasil tem uma ferida aberta com o seu passado escravocrata, que tem ramificações até hoje. E isso só se acentua em um Estado de maioria branca, que historicamente coloca a contribuição negra em segundo plano”, diz Gabriel Bandeira, jornalista e autor da pesquisa.

O trabalho “A gente não se vê por aqui: o jornalista negro no maior grupo de comunicação do Rio Grande do Sul”, desenvolvido por Bandeira, sob orientação do Prof. Dr. Juremir Machado da Silva, foi defendido e aprovado no início de julho como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Jornalismo pela PUCRS. “A ideia era trazer esses dados porque a branquitude não reflete sobre isso como deveria”, afirma o autor.

Bandeira conta que entrou no Jornalismo com o intuito de ser referência para outras pessoas e tornar a invisibilidade dos negros no Jornalismo palpável para pensar em avanços sobre o tema. “Na pesquisa, como aluno negro e minoria nesse espaço, queria pautar a negritude e deixar algum tipo de legado para os meus”, diz. Além de fazer um levantamento dos dados, o trabalho aborda racismo, desigualdade racial na mídia gaúcha e questiona o papel dos veículos de comunicação na luta antirracista. 

Trabalho de Gabriel Bandeira foi defendido e aprovado no início de julho

Ao todo, foram analisados 134 profissionais de vídeo entre os dias 14 e 24 de junho de 2021. Desses, apenas oito são negros, sendo cinco homens e três mulheres. São eles: Fernanda Carvalho, Marck B e Seguidor F, da RBS TV, Domício Grillo e Fernanda Bastos, da TVE, Marcinho Bléki e Rafael Cavalheiro, do SBT RS, e Liliane Pereira, da Record TV RS. As emissoras Band TV RS, TV Pampa e a Rede Digital de Comunicação (RDC), que somam 36 profissionais de vídeo, não têm nenhum negro exercendo a função. “Precisamos questionar essa estrutura, não só os veículos de comunicação, como também as universidades e faculdades de Jornalismo”, diz o recém-formado.

A pesquisa ainda revisa o trabalho do jornalista Wagner Machado da Silva, publicado em 2009, que encontrou apenas três comunicadores negros entre 421 jornalistas analisados, somando 0,71% na época. “O aumento de três para oito num espaço com 134 profissionais é pouca coisa. É um aumento, mas segue sendo muito baixo após mais de uma década. Isso não é justo com a população negra do Rio Grande do Sul”, afirma.

Segundo o censo demográfico de 2010 realizado pelo IBGE, a população autodeclarada negra do Rio Grande do Sul representa 16,13% do Estado. “No Rio Grande do Sul, nós temos um histórico de apagamento da contribuição negra, isso parte do massacre de Porongos”, diz Bandeira. 

O Massacre de Porongos ou Traição dos Porongos ocorreu durante a Revolução Farroupilha, na madrugada de 14 de novembro de 1844, quando um esquadrão de lanceiros negros acampado no Cerro dos Porongos foi surpreendido e arrasado pelas tropas imperais. Pouco mais de 100 homens negros foram assassinados. Os homens que não escaparam para quilombos ou para o Uruguai, foram enviados à Corte, no Rio de Janeiro, onde seguiram escravizados até a Lei Áurea, 43 anos depois.

Há contestações sobre o que teria facilitado o Massacre dos Porongos. Porém, a maioria das evidências históricas indicam que a chacina foi resultado da traição do general David Canabarro, homem forte dos farroupilhas.

Fruto de um incômodo do pesquisador sobre a ausência do negro na comunicação, o trabalho começou a ser planejado ainda em 2020, com a pauta antirracista sendo amplamente debatida após os assassinatos de George Floyd, nos Estados Unidos, e de José Alberto Freitas, na zona norte de Porto Alegre. “Eu não me sentia representado quando ligava a TV durante a minha adolescência e infância e isso tem um efeito na nossa autoestima e principalmente nas nossas inspirações, porque como vou saber se posso chegar em um lugar se nunca vi ninguém igual a mim?”, diz o jornalista.

Gabriel Bandeira ainda chama a atenção para o papel social da mídia e do Jornalismo na construção da auto imagem de pessoas negras na profissão. “A mídia é um espelho, então é uma potência uma criança negra ver a Maju Coutinho na posição que ela está”, afirma. “Precisamos mostrar que tem negrada se formando e entrando cada vez mais no mercado de trabalho jornalístico”.


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