![Sob ameaça, advogados denunciam irregularidades em depoimento de jovem baleado](https://sul21.com.br/wp-content/uploads/2021/03/20140130camera-de-seguranca-capta-o-momento-do-confronto-entre-o-jovem-fabricio-proteus-chaves-e-os-policiais-em-higienopolis-reproducao-450x300.jpg)
![Imagem de câmera de segurança mostra Fabrício Proteus Chaves sendo perseguido por PMs | Foto: Reprodução](https://www.sul21.com.br/jornal/wp-content/uploads/2014/01/20140130camera-de-seguranca-capta-o-momento-do-confronto-entre-o-jovem-fabricio-proteus-chaves-e-os-policiais-em-higienopolis-reproducao-300x225.jpg)
Tadeu Breda
Rede Brasil Atual – RBA
Os Advogados Ativistas, grupo que defende voluntariamente manifestantes presos durante protestos públicos em São Paulo, denunciaram nesta quarta-feira (29) ilegalidades na coleta do depoimento do jovem Fabrício Proteus Chaves. O rapaz de 22 anos foi ouvido por três delegados na tarde de terça-feira (28) em seu leito hospitalar na UTI da Santa Casa de Misericórdia, centro da capital, para onde foi levado no sábado (25) após ser alvejado à queima-roupa no tórax e na genitália por dois PMs.
“A colheita do depoimento foi ilegal porque, no momento em que os delegados colheram o depoimento do Fabrício, ele tinha acabado de sair do coma, estava internado numa UTI, estava sob efeito de morfina, e esse depoimento foi assinado com o dedão. Daí você imagina o valor legal que tem esse documento”, explicou um dos integrantes dos Advogados Ativistas, Geraldo Santamaria Neto, em coletiva de imprensa. “Seus pais não puderam acompanhar o depoimento. Ele ficou sozinho com três delegados no quarto. Só no final o defensor público apareceu.”
De acordo com a assessoria de imprensa da Santa Casa, Fabrício Proteus Chaves deixou o coma induzido na manhã de terça-feira (28), poucas horas antes do interrogatório. Durante o depoimento, ainda segundo o hospital, o estado de saúde do jovem era estável, inspirando cuidados intensivos. Nesta quarta-feira, os médicos afirmam que o rapaz está consciente, comunicativo e apresentando evolução satisfatória. Fabrício perdeu um testículo e pode ter alguns movimentos do braço direito comprometidos – atualmente, está paralisado. Por isso, não pôde assinar o documento.
Em seu depoimento, Fabrício contradiz a versão dos três policiais envolvidos no incidente – e que foi automaticamente endossada pelo governador Geraldo Alckmin, pelo secretário de Segurança Pública, Fernando Grella, e pelo comandante da PM, Benedito Meira, antes de qualquer apuração. Os soldados afirmam que atiraram no jovem em legítima defesa, uma vez que o rapaz teria partido para cima de um deles, caído no chão, com um estilete nas mãos. Fabrício afirma que foi alvejado antes de investir contra o policial. As imagens mostram que um dos PMs já apontava sua arma para o rapaz antes de que ele caísse sobre seu colega.
Ameaças
Além de denunciar as condições ilegais em que os delegados tomaram depoimento do jovem, os Advogados Ativistas, que representavam judicialmente o rapaz até a tarde desta quarta (29), afirmaram que receberam “ameaças de morte” para sair do caso. “Na segunda-feira (27), nas imediações do hospital, fui abordado por alguém chamando meu nome. Essa pessoa estava dentro de um carro e pediu que a gente se retirasse do caso, mostrando uma arma”, conta Daniel Biral, 33 anos, um dos integrantes do grupo.
Como advogado criminalista e defensor de manifestantes, com presença constante em protestos de rua, Biral afirma que ameaças são comuns e que essa não é a primeira que ele e seus colegas recebem. “Só que nunca quisemos denunciá-las à imprensa. Não tinha nem motivo”, ressalva. “O grande motivo por termos aparecido agora é por causa desse caso específico, que estávamos cuidando, e tinha uma necessidade de mostrar a cara e falar que tem alguma coisa errada.”
“Não sabemos quem fez a ameaça, mas a ameaça foi específica com relação a esse caso do Fabrício, para a gente sair do caso. E também para deixar de defender manifestantes”, complementa Geraldo Santamaria Neto, sublinhando que, pese aos riscos, o grupo tinha decidido continuar no caso. De acordo com André Zanardo, outro membro dos Advogados Ativistas, a família do jovem havia até mesmo assinado uma procuração na noite de ontem (28) constituindo o grupo como os representantes de Fabrício perante a Justiça.
Na tarde de hoje, porém, parentes entraram em contato com os advogados e, sem maiores justificativas, invalidaram o documento. “Algo ocorreu nesse meio-tempo, de ontem pra hoje, e a família nos desconstituiu do caso”, explica Zanardo, que não soube dizer por que a família de Fabrício tomou essa decisão ou se seus pais também receberam algum tipo de ameaça. Os Advogados Ativistas vinham acompanhando e prestando assistência jurídica ao jovem baleado desde o sábado.
“O caso está estranho desde o começo”, afirma Luiz Guilherme Ferreira, integrante do grupo. “Desde a obscura versão oficial até a falta de informações aos familiares, passando pela colheita ilegal do depoimento de Fabrício, o que vemos é um interesse político atípico, que é confirmar a todo custo a versão dos policiais.” Ferreira ecoou nota do Ministério Público, que ontem repreendeu o governo do estado por inocentar os policiais antes de qualquer investigação.
“Parece-nos oportuno lembrar à Secretaria de Segurança Pública que o único órgão legitimado para imputar e enquadrar conduta criminosa a alguém é o Ministério Público. Caso contrário, existe o risco de Fabrício deixar de ser uma vítima policial para ser também uma vítima política”, continuou. “Percebe-se que as investigações mal começaram e os órgãos deslegitimados já estão até condenando.”