Educação
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6 de dezembro de 2022
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19:52

Bloqueio no orçamento de instituições federais de ensino impede pagamentos de auxílios e serviços

Por
Duda Romagna
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Foto: Manoela Frade/Adverso
Foto: Manoela Frade/Adverso

Na quinta-feira (1º), após liberar verba congelada anteriormente, o Ministério da Economia voltou atrás e bloqueou outra vez R$ 344 milhões no orçamento das universidades e institutos federais. Ao todo, o orçamento do Ministério da Educação teve cerca R$ 1,4 bilhão bloqueado em 2022. A justificativa é de que os cortes orçamentários seriam necessários para garantir que não se ultrapasse o teto de gastos.

No dia 5, a Universidade Federal do Pampa (Unipampa) divulgou uma nota das Instituições Federais de Educação Superior (IFES) do Rio Grande do Sul: “Os prejuízos, de mais de R$ 45 milhões em repasses não realizados, são gravíssimos e afetam diretamente a autonomia das instituições, representando prejuízo do direito à educação dos estudantes de todas as instituições, além de risco judicial para as instituições.”

A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) também publicou uma nota à comunidade alegando não ter recursos para o pagamento de bolsas e de despesas após o bloqueio na Lei Orçamentária Anual (LOA). “A principal consequência disso é a impossibilidade de pagamento de bolsas estudantis, auxílios, entre outros benefícios. Somente em bolsas mantidas pela UFSM, trata-se de mais de R$ 600 mil, além de outras bolsas mantidas pela CAPES, como residência multiprofissional e de mestrado/doutorado, para as quais não há garantia de pagamento no momento.”

Nas contas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS), o corte de verbas em junho, de R$ 4,53 milhões, somado ao bloqueio recente, de R$ 8,35 milhões, resultou em um orçamento 20,4% menor do que o previsto em lei para o ano. Em nota, nesta terça-feira (6), o IFRS informou que não tem recursos para pagamentos durante o mês de dezembro, afetando bolsas de assistência estudantil, ensino, pesquisa e extensão.

“O governo federal zerou o limite para pagamentos de despesas discricionárias do IFRS, que são todos os gastos cotidianos, como energia elétrica, água, bolsas aos estudantes, contratos terceirizados como limpeza e vigilância, entre outros, à exceção de salários de servidores efetivos e aposentadorias”, diz o comunicado da instituição.

Júlio Xandro Heck, reitor do IFRS. Foto: Luiza Castro/Sul21

Para reitor do IFRS, Júlio Xandro Heck, a situação é desesperadora e uma crise sem precedentes. “A gente teve um bloqueio de crédito orçamentário que é o que a gente poderia executar até o dia 13, a gente tinha um monte de processos em andamento, de licitações de obras e de contratações que seriam feitas. Ainda era o saldo do ano que a gente faria uso para uma série de coisas.”

Além disso, o que preocupa ainda mais as instituições são os programas de assistência estudantil, que não poderão ser pagos sem a liberação do orçamento. “A gente não tem o dinheiro de fato, o financeiro para pagar o que já foi executado no mês de novembro. São aproximadamente R$ 5 milhões em pagamentos que eram para ser feitos até o dia 8. Assim, a gente já se torna devedor para o nosso estudante, para os credores que executaram algum serviço, não temos como pagá-los”, explica.

Outro agravante é o bloqueio acontecer no final do ano. “Nós nunca tínhamos passado por isso, de termos, ao mesmo tempo, um bloqueio de crédito e a falta do financeiro. Para agravar mais ainda, isso acontece em dezembro, quando não há margem para qualquer tipo de reprogramação. Bloqueio sempre é péssimo, mas quando ele acontece em maio, em junho, a instituição tenta se reorganizar, reagir. Quando ele acontece em dezembro fica absolutamente impossível fazer qualquer reorganização, então ele tem impactos muito mais severos.”

Lucia Pellanda, reitora da UFCSPA. Foto: Luiza Castro/Sul21

Lucia Pellanda, reitora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), concorda com a análise de Heck. “Esse corte nos pegou muito de surpresa porque ele veio no fim do ano e zerou totalmente nossas contas. Antes, a gente conseguia priorizar a assistência estudantil, quem é mais vulnerável, só que agora não temos nada e já tínhamos assumido compromissos. Temos contas para pagar, é como se a gente tivesse um cheque sem fundo. Está sendo muito difícil, os alunos estão desesperados porque as pessoas precisam disso pra comer, pra pagar aluguel, pra vir pra universidade”, relata.

Uma possibilidade de reversão desse estado é a aprovação da PEC da Transição na Câmara dos Deputados e no Senado, onde o texto foi aprovado nesta terça pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e segue para o plenário. A proposta expande o limite do teto de gastos em R$ 145 bilhões e liberaria algum valor de crédito para as instituições ainda no ano de 2022.

Para Lucia, o bloqueio atual pode impor complicações para o novo governo federal. “Vai ser bem complexo ter que dar conta de todos esses atrasos de pagamentos e do problema orçamentário, para depois poder propor coisas novas. O orçamento de 2023 é feito em 2022 e enviado para o Congresso, esse orçamento já está 20% menor do que o previsto. Se isso não for revertido na votação, tem mais esse desafio.”

Segundo o reitor do IFRS, representantes de IFES participaram, nesta terça, de uma reunião com o Ministério Público Federal para buscar soluções. “A gente fala desse assunto com profunda tristeza, porque implica a vida de centenas de milhares de pessoas, não só no IFRS mas em todas as instituições públicas, a gente atende basicamente um estudante que tem um perfil de vulnerabilidade. A gente sabe o quanto isso é importante, esse dinheiro todo mês, e nos sentimos absolutamente impotentes. O que conseguimos fazer é reclamar, é denunciar, é apontar o que deveria e o que pode ser feito.”

“A gente quer manifestar a solidariedade e dizer que é um assunto muito grave e que nós estamos dedicando todo o nosso tempo na busca de uma solução, não é por falta de esforço dos reitores e das instituições, infelizmente a solução não passa por nós. Literalmente, as instituições federais de ensino pedem socorro, esse é o nosso recado”, conclui.

As Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), signatárias desse documento, foram surpreendidas, na segunda feira 29/11, por um bloqueio dos limites de empenho das universidades e institutos federais, sem prévia comunicação do Ministério da Economia. No dia 01/12, após intensa mobilização da sociedade, o MEC anunciou a devolução dos limites de empenho. No entanto, algumas horas depois, ocorreu novo bloqueio, conforme Decreto nº 11.269 de 30/11/2022.

Os prejuízos, de mais de R$ 45 milhões em repasse não realizados, são gravíssimos e afetam diretamente a autonomia das instituições, representando prejuízo do direito à educação dos estudantes de todas as instituições, além de risco judicial para as instituições. As IFES estão, no momento, sem recursos financeiros para honrar pagamentos já previstos no orçamento, como a assistência estudantil, bolsas e contas básicas para o funcionamento das universidades, como água, luz, trabalhadores terceirizados e outras obrigações imediatas. Caso a situação persista, poderá afetar também a despesa obrigatória da folha de pagamento.

Considerando que a Educação é o futuro da nação, a sociedade tem o direito de contar com instituições federais de ensino fortes, que formem cidadãos, produzam pesquisa, extensão, cultura e dialoguem com as comunidades. Todo o planejamento orçamentário do ano é realizado no ano anterior e aprovado pelo Congresso Nacional.

As instituições federais de ensino superior já vêm sofrendo com progressivas reduções do orçamento discricionário. No entanto, este derradeiro bloqueio, com seu caráter inesperado e extremamente prejudicial, nos coloca em uma posição crítica perante os compromissos assumidos e afeta diretamente o cumprimento de nossa missão institucional.

Reitor Roberlaine Ribeiro Jorge – Unipampa;

Reitora Lúcia Campos Pellanda – UFCSPA;

Reitora Isabela Fernandes Andrade – UFPel;

Reitor Danilo Giroldo – FURG;

Reitor Júlio Xandro Heck – IFRS;

Reitor Flávio Luis B. Nunes – IFSul;

Reitora Nídia Heringer – IF Farroupilha;

Reitor Luciano Schuch – UFSM;

Reitor Carlos André Bulhões – UFRGS.


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