Marco Weissheimer
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19 de março de 2014
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13:39

O golpe de 64 e a ditadura no Rio Grande do Sul: mortos, desaparecidos e sobreviventes

Por
Sul 21
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Ato lembrará os 50 anos do golpe de 1964 e os 50 anos de impunidade dos crimes cometidos pela ditadura civil-militar, dia 31 de março, no Salão de Atos da UFRGS.
Ato lembrará os 50 anos do golpe de 1964 e os 50 anos de impunidade dos crimes cometidos pela ditadura civil-militar, dia 31 de março, no Salão de Atos da UFRGS.

O professor Enrique Padrós (História/UFGRS), que participa da organização do ato que lembrará os 50 anos do golpe de 1964 e os 50 anos de impunidade dos crimes cometidos pela ditadura civil-militar, dia 31 de março, no Salão de Atos da UFRGS, envia material sobre militantes mortos e desaparecidos na ditadura relacionados com o Rio Grande do Sul. O resgate dessa memória é um dos objetivos do ato do dia 31 de março cujo tema central será: “Sobreviventes: a dignidade da resistência contra a ditadura e da luta contra a impunidade na democracia”.

Participarão do ato nomes como João Carlos Bona Garcia, Nilce Azevedo Cardoso, Lilian Celiberti, Lorena Holzmann, Suzana Keniger Lisboa, Nei Lisboa, Sônia Haas, Flávio Koutzii e Antônio Losada (se estiver recuperado do acidente que sofreu recentemente).

A fonte do resgate da memória dos militantes João Batista Rita e Joaquim Alencar de Seixas é a coleção “A Ditadura de Segurança Nacional no Rio Grande do Sul, 1964-1985”, vol.2, “Repressão e Resistência nos Anos de Chumbo”, organizada por Enrique Padrós, Vânia Barbosa, Vanessa Albertinence Lopez e Ananda Simões Fernandes (Corag, Porto Alegre, 2010). Essa é, aliás, uma valiosa fonte de pesquisa sobre o que foi a ditadura e os crimes cometidos por ela. Trata-se de uma publicação em quatro volumes, resultado de uma parceria firmada pela Assembleia Legislativa com o Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFRGS, em 2009. Por todo o Brasil, há milhares de histórias de militantes que foram presos, torturados, mortos, desaparecidos ou que perderam emprego e tiveram que sair de suas cidades ou mesmo do país para sobreviver. Segue um resumo da história de dois destes militantes que viveram no Rio Grande do Sul: João Batista Rita e Joaquim Alencar de Seixas.

João Batista Rita foi militante do Marx, Mao, Marighella e Guevara (M3G).
João Batista Rita foi militante do Marx, Mao, Marighella e Guevara (M3G).

 João Batista Rita

“Militante do Marx, Mao, Marighella e Guevara (M3G). Nasceu em 24 de junho de 1948, em Braço do Norte (SC), filho de Graciliano Miguel Rita e Aracy Pereira Rita. Morou em Criciúma até completar o curso ginasial. Mudou-se para o Rio Grande do Sul, e morava em Cachoeirinha, região metropolitana de Porto Alegre. Participava ativamente do movimento estudantil secundarista gaúcho em 1968. Preso em 1970, foi banido do Brasil em 1971, em função do sequestro do embaixador da Suíça no Brasil, viajando para o Chile com outros 69 presos políticos. Com o golpe do Chile, asilou-se na embaixada da Argentina, em Santiago, onde ficou alojado por muito tempo. Resgatado para a Argentina, preparava seus documentos junto ao Departamento de Imigração, sob a proteção da ACNUR, quando foi preso, em 5 de dezembro de 1973, juntamente com Joaquim Pires Cerveira, em ação articulada pelo capitão do Exército Diniz Reis. Desde então, Catarina, como era conhecido João Batista no RS, faz parte da lista dos desaparecidos”. (página 277 da obra citada acima)

Joaquim Alencar de Seixas foi dirigente do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT).
Joaquim Alencar de Seixas foi dirigente do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT).

 Joaquim Alencar de Seixas

Nasceu em Bragança (PA) no dia 21 de janeiro de 1922, filho de Estolano Pimentel Seixas e Maria Pordeus Alencar Seixas. Operário, iniciou sua militância política aos 19 anos. Mudou-se para o Rio Grande do Sul em 1954, e após um período no Rio de Janeiro, retornou em 1964, participando aqui do movimento de resistência à ditadura. Trabalhou na Varig, Aerovias e Panair como mecânico de aviões e também na Pepsi- Cola de Porto Alegre. Em 1970, vivia em São Paulo, já como dirigente do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT). Foi preso em São Paulo junto com seu filho Ivan, que tinha 16 anos de idade. No dia seguinte, foram presas sua mulher Fanny Akserud Seixas e as filhas Ieda e Iara. Seixas foi morto em 17 de abril de 1971 no DOI-CODI/SP. Após sua morte sob torturas, testemunhada pela família, Fanny e os três filhos foram trazidos ao DOPS/RS, onde foram interrogados e torturados. (página 279)

No artigo “Faz escuro, mas eu canto: Os mecanismos repressivos e as lutas de resistência durante os anos de chumbo no Rio Grande do Sul” (op. cit.), Padrós e Ananda Simões Fernandes assinalam o papel peculiar que o RS teve na ditadura. O fato de fazer fronteira com o Uruguai e a Argentina contribuiu para isso:

“Devido a essa situação, o estado gaúcho exerceu um papel de baluarte da defesa nacional da ditadura brasileira. Paradoxalmente, para a oposição e para as vítimas da Doutrina de Segurança nacional, era praticamente uma rota obrigatória de conexão com o exterior. O Rio Grande do Sul, desse modo, passou a ser uma peça-chave no mapa da mobilidade das organizações de esquerda, mas também o foi para os serviços de segurança e espionagem” (p.34, op. cit.)

O Rio Grande do Sul também mereceu uma “atenção especial” por parte dos generais e seus aliados civis em função da tradição de resistência a golpes, como ocorreu em 1961, na Campanha da Legalidade, liderada pelo então governador Leonel Brizola, que barrou a tentativa de impedir que o então vice-presidente João Goulart assumisse a presidência da República.

Aula pública: Repressão e Resistência no RS

O ato do dia 31 no Salão de atos da UFRGS começará às 18 horas, com uma apresentação da Terreira da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz. Depois, às 18h45min, será a vez dos depoimentos dos convidados sobre a resistência contra a ditadura e a luta contra a impunidade. No dia seguinte, 1º de abril, será realizada uma aula pública, às 10h30min, no Memorial dos Desaparecidos/RS (Avenida Ipiranga esquina com Avenida Edvaldo Pereira Paiva). O tema da aula será: “Repressão e Resistência no Rio Grande do Sul: manifestações de protagonistas e professores”.


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