Marco Weissheimer
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6 de março de 2014
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01:53

Eleições de 2014 ocorrerão em um mundo menos acolhedor para o Brasil e a América Latina

Por
Sul 21
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Eleições de 2014 ocorrerão em um mundo menos acolhedor para o Brasil e a América Latina
Eleições de 2014 ocorrerão em um mundo menos acolhedor para o Brasil e a América Latina
Na América Latina, o ciclo de governos progressistas que se instalou na região há mais de uma década está diante de um desafio: precisa avançar no processo de integração econômica e política.
Na América Latina, o ciclo de governos progressistas que se instalou na região há mais de uma década está diante de um desafio: precisa avançar no processo de integração econômica e política e revitalizar esse ciclo que dá sinais de cansaço.

As eleições de 2014 no Brasil ocorrerão em um cenário crescentemente adverso em nível internacional. Desde que o Banco Central dos EUA passou a implementar uma política monetária mais restritiva, volumes bilionários de capital especulativo estão deixando os países emergentes e pressionando para baixo o valor de suas moedas. Na América Latina, Argentina e Venezuela já desvalorizaram suas moedas. O Brasil segue com sua política de elevação de juros para tentar evitar uma fuga de capitais. A receita, porém, tem impacto recessivo sobre a economia. A margem de manobra é estreita e o terreno é minado. Esse cenário é potencialmente provocador de instabilidade política. Os efeitos da crise econômico-financeira de 2007-2008 propagaram-se pelo planeta e ainda repercutem na vida das nações.

Na América Latina, o ciclo de governos progressistas que se instalou na região há mais de uma década está diante de um desafio: precisa avançar no processo de integração econômica e política, de interligação dos mercados regionais, como forma de enfrentar o crescente protecionismo que se manifesta em nível internacional.

Logo após assumir seu cargo no ano passado, o novo diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, o brasileiro Roberto Azevedo, advertiu que o mundo estava se tornando um lugar menos acolhedor. Ele tomou o ano de 2008, que marca o início da crise econômico-financeira internacional, como a referência central dessa advertência. Segundo ele, os cinco anos de lá para cá são importantíssimos pelos efeitos que apresentaram.

Em primeiro lugar, destacou, o protecionismo voltou de maneira mais sofisticada. Não é o protecionismo tradicional, de subsídio à exportação, de quotas restritivas ou outras medidas facilmente identificáveis, assinalou. Hoje o protecionismo é mais sofisticado, como as politicas estatais de apoio a setores fragilizados (setor financeiro, setor automativo, por exemplo) e outros tipos de subsídios domésticos. Os países que tem mais recursos para apoiar suas empresas e seus empregos, estão agindo nesta direção, apontou Azevedo.

Segundo efeito apontado pelo diretor-geral da OMC: com as novas tecnologias, o volume de capital que atravessa as fronteiras é muito maior. Apesar da crise de 2008, admitiu Azevedo, pouco se mudou em termos de governança financeira. O mundo financeiro hoje segue tão pouco regulado quanto era em 2008. Pouco ou nada mudou. A revoada de capitais em direção aos EUA que se verifica agora é mais um indicativo disso.

Terceiro efeito: os países desenvolvidos estão crescendo mais devagar. A superação da crise de 2008 vai demorar e, em muitos casos, se dará em um quadro de desemprego alto, o que exacerba muito a sensibilidade política dos países onde isso ocorre. A crise orçamentária na zona do euro, as crises políticas em várias regiões e o surgimento dos países emergentes, tudo isso aumenta o quadro de incerteza e instabilidade no cenário mundial.

Países emergentes como o Brasil foram muito resistentes no momento da crise. Foram as economias que conseguiram crescer e que seguem crescendo, como mostrou o resultado do PIB brasileiro em 2013 (o terceiro do mundo). Os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) estiveram entre os países com taxas de desenvolvimento mais altas. Com isso, as moedas desses países se valorizaram, como ocorreu com o Real brasileiro, com um efeito negativo para as exportações. O fato é que os fluxos do capital especulativo estão mudando de direção mais uma vez.

Essas são algumas linhas gerais que definem o contorno econômico do processo político este ano. Elas impõem um paradoxo: ao mesmo tempo em que elas impõem sérios limites para a ação política dos governos e dos Estados, elas exigem, mais do que nunca, ousadia e sabedoria política para atravessar esse terreno minado.

É razoável supor que os protestos de rua que eclodiram em vários países nos últimos anos guardam uma relação com os efeitos da crise econômica internacional. Instabilidade econômica e política costumam andar juntas. Até aqui, as consequências políticas desses processos não são muito animadoras: uma ditadura no Egito, um governo conservador na Espanha, avanço da ultra-direita na França, presença de neonazistas no novo governo da Ucrânia, para citar alguns dos casos mais significativos. A Venezuela vive uma situação similar, com mobilizações de rua e grupos querendo derrubar o governo de Nicolas Maduro. Há quem sonhe com um quadro similar na Argentina e mesmo no Brasil.

Não é pouca coisa, portanto, que estará em jogo neste ano. Já há uma consciência, dentro do governo Dilma, do PT e de setores aliados do atual governo que não bastará fazer, na campanha eleitoral, uma defesa das conquistas sociais dos últimos anos, que não foram poucas. O cenário descrito acima exige algo mais. Exige, entre outras coisas, uma leitura correta da reacomodação de forças que está ocorrendo em nível internacional e a escolha de novas políticas capazes de seguir sinalizando perspectiva de futuro para a vida das pessoas.


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