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14 de junho de 2021
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19:50

Live do Sul21: ‘É um erro estrutural achar que o transporte público irá se pagar apenas com a tarifa’

Por
Sul 21
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Foto: Joana Berwanger/Sul21
Foto: Joana Berwanger/Sul21

A Live do Sul21 desta segunda-feira (14) recebeu Rafael Calabria, coordenador do Programa de Mobilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), para uma conversa sobre a crise dos sistemas de transporte público em Porto Alegre e nas principais cidades do Brasil. Em uma conversa de quase uma hora de duração, Rafael falou sobre o que leva os sistemas a perpetuarem um círculo vicioso de aumento de tarifas de ônibus e perda de passageiros, bem como apresentou bons exemplos no setor que estão sendo propostos ou implementados no Brasil e no exterior.

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Porto Alegre discute nesse momento o aumento da tarifa de ônibus, com a proposta em discussão prevendo a elevação dos atuais R$ 4,55 para R$ 5,20, alta de 14%. A respeito da composição do valor da passagem de ônibus, Calabria avalia que, no Brasil, há um erro estrutural de achar que o transporte público irá se pagar apenas com a tarifa do usuário.

“Aí a gente faz essas concessões que deixa tudo na mão do empresário para ‘fechar a conta’ e isso não se paga. Nenhum país desenvolvido do mundo tem um transporte coberto exclusivamente pela tarifa, senão seria caro e excludente como aqui. É padrão subsidiar com recursos públicos, com algumas taxas, fazendo um mix de receitas para poder ter alguma estabilidade financeira”, diz. “No Brasil, se crítica o transporte público por ser deficitário como se fosse um erro, mas, na verdade, é um padrão do sistema, ele não vai se pagar só com a tarifa. Porque a gente precisa ter linhas atendendo toda a cidade”, complementa.

Calabria destaca que um dos principais fatores que ajudou a escancarar a crise nos sistemas de transporte público no Brasil foi a chegada do Uber e de aplicativos semelhantes no País, a partir de meados da década passada. Em Porto Alegre, o ex-prefeito Nelson Marchezan Júnior chegou a propor a criação de uma tarifa de R$ 0,28 por quilômetro rodado aos aplicativos de transporte individual, que seria revertida para o financiamento do transporte coletivo.

“Na nossa visão, o poder público precisa priorizar o transporte coletivo. Nesse sentido, a gente vem defendendo há algum tempo, inclusive dialogamos na gestão anterior aí em Porto Alegre sobre a necessidade de, se for o caso, tributar o sistema de carros por aplicativo, que está num preço muito baixo e pode tranquilamente ser tributado num valor, claro, ponderado, não abusivo, para baratear o transporte e que não tornaria o sistema deles insustentável, mas ajudaria a garantir a qualidade do transporte na cidade”, diz Calabria.

Rafael Calabria, coordenador do Programa de Mobilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), foi o convidado do programa. Foto: Divulgação

Contudo, ele frisa que não seria interessante basear o financiamento do transporte público em um sistema só, como seria a taxação do Uber, mas propor diversas fontes de financiamento para ajudar baratear o sistema. “É importante ter recurso público, porque é um direito social, então faz sentido Precisa-se mudar o modelo, o Uber foi um provocador da falência do modelo. A partir de duas ou três pessoas, já está muito mais barato usar o aplicativo do que o ônibus, isso é um erro absurdo do sistema. É a lógica da mobilidade das cidades forçando as pessoas a usarem carro, enquanto a gente precisa melhorar o sistema de transportes para incentivar as pessoas a usarem ônibus”, afirma.

Calabria pontuou ainda que, na maior parte das grandes cidades do Brasil, vigora o sistema em que poucos empresários controlam toda a operação do transporte, desde o fornecimento de veículos à operacionalização, o que leva a uma lógica de que, tempos de crise, como o atual, quando cai a receita, ele precariza o serviço para tentar aumentar a lucratividade.

“O que a gente tem de boa prática no setor, que é bastante disruptivo, é um modelo que começou no sudeste asiático e agora está sendo implementado em Bogotá, na Colômbia, e em Santiago, no Chile. A prefeitura divide a concessão, faz contratos temáticos e menores. Em vez de o empresário dominar todo o setor, como acontece nas cidades brasileiras, fazer um contrato só de frota, por exemplo. Então uma empresa vai fornecer só veículos para a cidade. E outro contrato de operação, uma empresa com motoristas, cobradores e fiscais. Com isso, a prefeitura tem mais capacidade de controle. Se uma empresa quebrar ou parar, ela tem a frota para dar para outra empresa. Ela consegue gerir melhor o contrato, diminui o tamanho do contrato e faz contratos específicos. Por exemplo, o contrato de pessoal, não tem investimento de capital e veículos. Então, é muito mais barato, pode fazer contratos menores e, se a empresa não dar certo, fazer outro”, exemplifica.

Confira no vídeo a íntegra da Live do Sul21 com Rafael Calabria.


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