Live do Sul21
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26 de janeiro de 2021
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20:57

Live do Sul21: O Brasil se tornou um pária no cenário internacional?

Por
Luís Gomes
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Live do Sul21: O Brasil se tornou um pária no cenário internacional?
Live do Sul21: O Brasil se tornou um pária no cenário internacional?
Professor Maurício Santoro participou da Live do Sul21 nesta terça-feira | Foto: Arquivo Pessoal

Da Redação 

A Live do Sul21 recebeu nesta terça-feira (26) o professor Maurício Santoro, do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ele conversou com os repórteres Luís Eduardo Gomes e Luciano Velleda sobre os atropelos de Jair Bolsonaro e Ernesto Araújo na condução da política externa brasileira. Santoro falou sobre os problemas na relação do Brasil com a China, o que acontecerá agora que Bolsonaro perdeu o seu principal aliado no cenário internacional, o ex-presidente americano Donald Trump, e se o País já pode ser considerado um “pária”, termo usado pelo próprio ministro Araújo no ano passado.

“Há, sem dúvida, uma crítica global ao Brasil e um certo isolamento diplomático do País nos últimos dois anos. Desde o início do governo Bolsonaro, o Brasil enfrentou ou enfrenta tensões com todos os seus principais parceiros políticos e econômicos. Com a China, com os EUA, com a União Europeia, com a Argentina e outros países latino-americanos. Para onde quer que a gente olhe hoje no mundo, há um certo nível de tensão com o Brasil”, disse.

Santoro avaliou que o Brasil, por ser uma das maiores economias do mundo e um país central na discussão sobre as discussões climáticas, tem relevância no cenário independente do governo de momento, mas disse que, apesar disso, o País vem perdendo muito da influência e respeito internacional que tinha. “Para encontrar um momento em que o País estivesse enfrentando um isolamento diplomático tão grande como agora, a gente teria que recuar para a ditadura militar. E acho que, mesmo lá, a gente não encontraria algo tão profundo, tão complicado como esse momento atual. Se nós não nos tornamos pária no sentido clássico, com sanções e coisas do gênero, nós viramos algo muito parecido com isso. Vale observar que, até agora, o governo Bolsonaro não recebeu nenhuma visita de chefe de Estado relevante para além dos nossos vizinhos da América do Sul, que esses não têm jeito, têm que vir para o Brasil não importa quais sejam as circunstâncias. Mesmo o Trump [não veio]”, disse.

O professor avaliou também que o Brasil fez uma aposta equivocada ao tentar uma relação especial com os EUA num cenário global diferente da época em que os dois países tinham uma relação mais próxima, na primeira metade do século 20. “Naquele momento, os EUA eram o maior parceiro comercial do Brasil. Agora, desde 2009, o maior parceiro comercial é a China. No ano passado, um terço das exportações brasileiras foram para a China, ao passo que para os EUA, mesmo com toda essa busca de uma relação preferencial com o Trump, esse percentual não chegou aos 10%. O mundo mudou, a economia global mudou, mas o governo brasileiro, e muitos outros grupos na sociedade brasileira, continuam presos àquela mentalidade do passado, sem conseguir realmente entender esse mundo não ocidental”, disse. “As últimas semanas têm sido uma aula prática sobre a importância global crescente da China, da Índia e da Rússia, em particular para questões ligadas à saúde pública, fabricação de vacinas, insumos médicos, outros equipamentos importantes no combate à pandemia. Para muitas pessoas, em particular no governo brasileiro, isso foi um choque, porque ainda há no Brasil uma visão muito disseminada de que o centro do mundo é o Ocidente”.

Em relação à China, Santoro destacou que os ataques verbais e em redes sociais de membros do governo Bolsonaro e de seus filhos direcionados ao país asiático podem, sim, ter efeito negativo na relação bilateral entre os país. “Os chineses estão preocupados com isso? Eles se interessam com aquilo que o ex-ministro da Educação dizia ou com aquilo que ocasionalmente o filho do presidente fala nas redes sociais? Às vezes as pessoas acham que não, que seria uma coisa muito trivial, que não seria importante na relação bilateral. Mas, olha, nas minhas conversas com os chineses, esse tema é muito importante, ele aparece o tempo inteiro. Ele só não é mais importante do que a questão se a empresa chinesa Huawei vai poder participar do leilão de 5G de internet. Mas a China está muito preocupada com esse discurso agressivo em relação ao país. Ao longo de 2020, por causa da pandemia, a imagem internacional da China piorou muito nos EUA, na União Europeia, no Canadá. Os chineses estão preocupados com isso, estão tentando responder a essas críticas com a ofensiva diplomática”, disse.

Na segunda-feira, o presidente agradeceu a “sensibilidade do governo chinês” após a confirmação do envio de 5,4 mil litros de insumos para a fabricação da vacina CoronaVac no Brasil. Santoro concordou que, nos últimos dias, Bolsonaro tem dado declarações que indicam recuos e mudanças de tom, tanto em relação ao novo presidente dos EUA, Joe Biden, como na relação com a China, mas diz que é pouco para imaginar se essa é mudança definitiva. “É claro que, tudo isso, é o oposto absoluto do que tem sido a carreira política do Bolsonaro nos últimos 30 anos. Essas tentativas do presidente são acompanhadas, também, por essas explosões, por esse comportamento errático, instável. Acho muito difícil imaginar que ele vá conseguir ter um discurso moderado e coerente”, disse.

A seguir, confira a íntegra do Live do Sul21 com Maurício Santoro:


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