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10 de maio de 2011
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00:43

Caso Banrisul: sócio-gerente da SLM trabalhava para beneficiar empresas do esquema

Por
Sul 21
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Igor Natusch

O publicitário Gilson Storck, sócio-gerente e representante da agência SLM, é indicado pelas investigações do Ministério Público como um dos nomes centrais do esquema de superfaturamento que lesou os cofres do Banrisul. Na trama, destrinchada pelo MP durante a Operação Mercari, Gilson surge ao lado de colegas publicitários, empresários e nomes da política gaúcha em uma quadrilha que lucrava a partir de licitações fraudulentas, realizadas com a conivência da superintendência de marketing e da vice-presidência do Banrisul.

Segundo a denúncia, o principal papel do representante da SLM era garantir que as ações de publicidade a cargo da agência fossem redirecionadas para empresas ligadas ao empresário Davi Antunes de Oliveira. Como todas as empresas engajadas nas licitações estavam sob o controle de Davi, bastava a manipulação dos valores apresentados para garantir um excedente que seria distribuído dentro da quadrilha. Além disso, Gilson Storck manteria contatos com Walney Fehlberg, à época superintendente de marketing do Banrisul, nos quais as fraudes eram discutidas e combinadas.

A relação entre Gilson Storck e Davi Antunes de Oliveira é consolidada por evidências como troca de e-mails na qual os dois tratam do acerto de orçamentos junto a uma pessoa chamada Jairo, que a investigação identifica como Jairo Xavier Amaral, proprietário da gráfica Impressul e incluído na lista de réus do processo. Agendamento de almoços entre os dois também são apresentados pelo MP, bem como uma troca de mensagens de celular, ocorrida em 9 de agosto de 2010, na qual é citada a necessidade de afinar o “discurso”:

DAVI: Oi, um prazer agradar o amigo, não quer dar um pulo na franca antes de ir para o trabalho?
GILSON: Tenho compromisso ja agora 9 h. Nos ligamos depois.
DAVI: Ok, quando puder me chama no radio ou msn para combinarmos detalhes para um discurso igual. Bjs

Ainda mais significativo da presença de Gilson Storck na quadrilha, segundo os investigadores, é o fato de que o representante da SLM tenha recebido pessoalmente Luciano de Oliveira Totti, subcontratado pelas empresas de Davi Antunes de Oliveira para produzir material publicitário para o Banrisul. Luciano teria ameaçado denunciar o esquema de superfaturamento, pedindo uma quantia em dinheiro para não levar o caso adiante. Além de conversa entre Davi Antunes de Oliveira e Armando D’Elia Neto, na qual o nome de Gilson é citado diretamente, o próprio Gilson Storck conversou com uma de suas funcionárias, Sonia, a respeito da situação. A gravação é do dia 5 de agosto do ano passado:

SONIA: Oi. Só pra te avisar. Consegui falar com o amigo, tá? Ficou muito ‘P’ da vida, esbravejou, xingou, enfim. Agora, também diz que não ocorreu nada o que fazer… Não sabe o que fazer, enfim…
GILSON: Sim, nós temos que descobrir o que ele (Luciano) quer, né?
SONIA: O que ocorre pra ele, é que é mais grana, né? Que é a mesma, o mesmo tipo de atitude que teve antes… É entrar através de mim ou de ti, enfim, pra dizer o que é que quer… Que me parece também ser o mais óbvio, né?
GILSON: Claro, é isso. Mas é por isso que eu tenho que saber o seguinte: se é apenas uma ameaça, mais uma, ou se ele foi chamado (pelo MP), entendeu?
SONIA: Aham, aham.
GILSON: Justamente, depois de tudo aquilo, esse veado ainda denunciou!
SONIA: É, é. Então amanhã eu vou tentar, dá uma (tentativa) de manhã de novo ainda, mais algumas vezes, aquele número… Vê se ele me atende e daí vamos ver. Mas de qualquer forma amanhã ele já tá de volta a Porto Alegre, daí ele nos procura pra falar com calma.
GILSON: Tá bom, então.

Na sequência, a mesma Sonia entrou em contato com Davi Antunes de Oliveira para expor a situação. A ligação evidencia a proximidade entre as empresas de Davi e a SLM, já que o contato cita até mesmo um rádio Nextel que o empresário teria cedido a Sonia para facilitar os contatos. As ameaças de Luciano de Oliveira Totti provocavam tanta insegurança que Davi e Gilson voltariam a conversar no dia 26 de agosto de 2010, desta vez por telefone. Na ocasião, discutiram estratégias para lidar com a ameaça de Luciano, concluindo que seria possível convencê-lo de que, depois da primeira denúncia, o esquema criminoso havia sido desmantelado:

DAVI: Não, só para saber que tá tudo tranquilo então (…)
GILSON: Tô, a Sonia vai tomar um… Vai comer um bolinho de chuva, né?
DAVI: É!
GILSON: Vamos ver, deixar… Vamos fazer o seguinte, vou botar ela, né? Para conversar numa de amiga, etc, e ouvir, né?
DAVI: Claro!
GILSON: Sem falar, né…
DAVI: Claro, absolutamente nada. E se ele disser, começar a exigir alguma coisa dizer “bah, bicho, tu viu o Gramado, tu viu isso, tu viu aquilo?”
GILSON: Viu o quê?
DAVI: Viu o quê? Tem que dizer para ele “tu matou lá o troço, o troço”
GILSON: É!
DAVI: “As coisas lá… Os caras mandaram parar tudo, mandaram retirar tudo, graças a ti os caras (pararam)”. Ele não precisa saber por que caiu, né?
GILSON: Não. E também é o seguinte, ó… É muito naquela do tipo “olha, já foi acertado isso que eu saiba, com o fornecedor e” (…) Entendeu?
DAVI: Exatamente.

Documentos mostram pagamentos ilegais via SLM

Parte da documentação apreendida nas buscas dentro da agência SLM mostram a circulação de dinheiro dentro da quadrilha, com direito a referências explícitas a alguns dos beneficiados. Em algumas planilhas, por exemplo, surgem pagamentos da SLM às empresas Mac Mídia, Ideia e Silk Master, todas identificadas pelo MP como participantes ativas do esquema que mascarava os superfaturamentos. Nos três documentos, há referências claras ao nome de Davi Antunes de Oliveira, ao lado de valores que indicariam que 10% dos valores pagos iriam diretamente para as mãos do empresário.

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Documento encontrado em escritório de Gilson Storck indica pagamento de R$ 9.199,00 a "Davi" | Foto: Reprodução
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Recortes demonstram, segundo Ministério Público, que Davi recebia 10% dos pagamentos realizados por Gilson Storck às empresas terceirizadas | Foto: Reprodução

Outros documentos em posse do Ministério Público demonstrariam o papel ativo de Gilson Storck na manipulação dos valores, ajudando a produzir os orçamentos que disfarçariam o valor superfaturado da proposta que venceria as licitações. Palavras manuscritas como “mudaram”, “alterado” e “ficou” surgem ao lado de referências a eventos como Fenadoce, Abrasel e Expobento, e empresas que participaram das concorrências para a confecção e instalação de material publicitário. Para o MP, essas anotações explicitam que Gilson Storck atuou diretamente ou ao menos tinha pleno conhecimento das fraudes.

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Manuscrito mostra que houve manipulação de valores pedidos por empresas em licitações | Foto: Reprodução

O Ministério Público associa o nome de Gilson Storck ao superfaturamento de peças publicitárias relacionadas a vários dos principais eventos associados à marca Banrisul. Um dos casos é o da Expoagro Afubra 2010, onde Gilson teria feito pessoalmente os cálculos necessários para que o valor licitado rendesse dividendos generosos a todos os envolvidos no esquema. Na ocasião, a empresa Q Ideia acabou saindo vencedora sobre as concorrentes Imobi e Renove, mesmo com valores acima dos executados no mercado. O mesmo teria se dado na Movesul 2010, com a vitória final da empresa Self Eventos, e no 37º Festival de Cinema de Gramado, onde a Renove acabou sendo vencedora do processo licitatório. Todas as empresas citadas são de propriedade, direta ou indireta, de Davi Antunes de Oliveira.

Gilson Storck foi detido em setembro de 2010, ao mesmo tempo em que mandados de busca e apreensão eram executados em várias empresas envolvidas no esquema, entre elas a SLM. Na residência do diretor, foram encontrados R$ 87 mil em dinheiro, além de pouco mais de U$ 300 em espécie. No escritório de Gilson, foram encontrados outros R$ 10 mil, sem comprovação de origem. Para o MP, são valores que demonstram a entrada e circulação de quantias ilegais, obtidas por meio do superfaturamento de peças publicitárias para o Banrisul.

Segundo advogado, dinheiro na casa de Storck tem origem lícita

Em contato telefônico com o Sul21, o advogado de Gilson Storck, João Antônio Paganella Boschi, diz que seu cliente ainda aguarda a digitalização de todo o material que consta no processo. Só a partir do recebimento dos volumes e da análise por parte da defesa é que se tomará uma posição concreta quanto às acusações. No momento, os prazos estão suspensos devido ao processo de digitalização dos autos, informação confirmada pela assessoria do Tribunal de Justiça do RS.

De acordo com Boschi, é possível provar com “farta documentação” a origem lícita do dinheiro encontrado em posse do representante da SLM. “Meu cliente encontrava-se em processo de separação”, diz o advogado, acrescentando que Storck optou por receber as devoluções em dinheiro vivo e mantê-las em casa para não dividir os valores com sua ex-mulher. Além disso, o fato de seu cliente não possuir nem mesmo automóvel ou casa própria descaracteriza a ideia de que ele tivesse obtido enriquecimento ilícito.

“A premissa de que, por ter sido citado em conversas gravadas pelo Ministério Público, meu cliente tem envolvimento em um esquema criminoso não é verdadeira”, afirma Boschi. O advogado diz ainda que seu cliente já sofreu prejuízos evidentes com a divulgação do caso, inclusive em sua credibilidade como profissional. “Os nomes foram colocados na rua, e sabemos que há sempre uma presunção de que o acusado é culpado. É uma situação dolorosa”.

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