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4 de fevereiro de 2015
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10:57

Cortes de diárias e privatizações não resolvem problemas do Estado, diz Odir Tonollier

Por
Sul 21
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Foto: Alina Souza/Sul21
Odir Tonollier: “O governador andou usando a expressão “se nós não fizermos nada” o déficit vai ser tal…Como um governo pretende governar com a suposição de que não vai fazer nada? Um governo assim não existe”. Foto: Alina Souza/Sul21

Marco Weissheimer

“Há uma grande influência de visões privadas sobre o governo Sartori. O que apareceu até aqui no debate público não é uma visão vinda da estrutura do Estado, mas sim uma visão privada de grupos como o PGQP (Programa Gaúcho de Qualidade e Produtividade) e o Movimento Brasil Competitivo, que no fundo são a mesma coisa. Além de seu caráter ideológico sobre qual deve ser o papel do Estado, essa visão tem interesses econômicos, que envolvem desde coisas grandes, como a Corsan, até coisas um pouco menores, como a empresa de serviços gráficos do Estado”. A avaliação é do ex-secretário estadual da Fazenda, Odir Tonollier, ao comentar as primeiras iniciativas e manifestações do governo de José Ivo Sartori (PMDB) sobre como enfrentar os problemas financeiros do Estado do Rio Grande do Sul.

Esses setores privados, acrescenta Tonollier, inclusive vem pressionando Sartori, por meio de editoriais na mídia, cobrando maior rapidez no ritmo das reformas que defendem. Entre essas medidas, estão a privatização, fusão e mesmo extinção de empresas públicas, criticadas pelo ex-secretário: “essas propostas de privatização não resolvem o problema do déficit do Estado. Elas mais satisfazem interesses políticos da direita e interesses econômicos de alguns grupos, do que resolvem problemas financeiros estruturais do Estado. O Rio Grande do Sul já é um Estado beirando o mínimo, já perdeu pedaços importantes nas últimas décadas, como ocorreu com a CRT e a CEEE no governo Britto. Ficou um Estado muito pequeno, com muitas dificuldades para atender os serviços públicos”.

A mensagem de Sartori à sociedade

As propostas de privatização, fusão e extinção de empresas públicas, até agora, não foram defendidas diretamente pelo governo, mas sim por meio de matérias, artigos e editoriais publicados na imprensa. Nesta terça-feira (3), o governador José Ivo Sartori apresentou sua mensagem de governo ao parlamento e à sociedade gaúcha, mas não adiantou nenhuma das medidas que pretende adotar. Segundo Sartori, a situação financeira do Estado passou do limite e “coloca o equilíbrio financeiro como base da moderna governança, sem o qual nós vamos fazer mais dívidas, mais saques, mais rombos, mais manobras, mais cortinas de fumaça”. O governador assinalou, por outro lado, que o equilíbrio financeiro não é um fim em si mesmo, mas deve estar voltado “para aqueles que mais precisam”. “Ajustar as contas é fazer segurança, é fazer saúde, é fazer educação de melhor qualidade”, acrescentou.

Até aqui, as medidas de equilíbrio financeiro e ajuste de contas do governo Sartori incluíram o corte de diárias de servidores públicos, o congelamento de concursos e a suspensão de nomeações e do pagamento de fornecedores do Estado por um prazo de 180 dias, entre outras medidas. Nem as privatizações, nem essas medidas, defende o ex-secretário da Fazenda do governo Tarso Genro, não resolvem os problemas estruturais do Estado. “Nosso projeto previa um período de transição que começou com a renegociação da dívida, cujos efeitos mais concretos demorarão um pouco. Estimamos esse período de transição em torno de 8 anos. Até lá, o Rio Grande do Sul precisará de recursos extraordinários, fora de seu orçamento oficial, por meio de operações de crédito, convênios com a União e recursos que o Estado tem pendente junto à União. Tínhamos um levantamento inicial para um projeto de quatro anos que previa a captação de R$ 15 bilhões, sendo 7 bilhões em operações de crédito e 8 bilhões com a União”.

“Nós não atrasaríamos o salário dos servidores”

Esses R$ 15 bilhões extraordinários, observa ainda Tonollier, seriam suficientes para enfrentar o problema do déficit nos próximos quatro anos. “Essa previsão levou em conta o fato de que o patamar das despesas está consolidado, já incluindo os 12% para a Saúde, que iniciou no nosso governo, e que os precatórios não vão aumentar mais. O efeito da lei Britto já está aí, não vai aumentar e começa inclusive a ser declinante. O passivo da lei Britto e a necessidade de atingir os 12% na Saúde caiu sobre a nossa cabeça. Isso significou R$ 7,5 bilhões de contas novas no nosso governo. Tiramos dos depósitos judiciais R$ 5,65 bilhões, ou seja, eles não foram sequer suficientes para pagar essas duas contas. Nós defendemos também que é possível aumentar a receita. Essa história de que exageramos a previsão de um aumento da arrecadação do ICMS de 12,5%, que isso é um artificialismo, não se sustenta. O ICMS de 2013 aumentou 12,6%. A média dos nossos quatro anos deu 9,7%. Por que agora vai ser apenas 2%?” – indaga.

Sobre a ameaça de atraso no pagamento do funcionalismo já em 2015, Odir Tonollier garantiu que ela não existiria caso o governo Tarso Genro tivesse sido reeleito. Questionado sobre onde residiria a diferença que afastaria essa ameaça, o ex-secretário da Fazenda apontou uma diferença de estratégia política. “Nós não atrasaríamos o salário dos servidores. O atual governo está se esforçando para problematizar a crise do Estado e com isso ficar livre para tomar as medidas que ele entende necessárias. O governo Sartori, especialmente no primeiro ano, parece desejar o atraso de salários para poder problematizar a crise”.

“Não é cortando diárias que conseguiremos recursos estratégicos para o Estado”

Aí aparece, na avaliação do ex-secretário, a grande diferença de estratégia entre o governo atual e o anterior. “Nós sabíamos do déficit quando assumimos. O governador Tarso Genro disse que precisávamos ousar e fazer o governo funcionar, atendendo os serviços públicos e investindo. Fazer o Estado funcionar significa saúde, educação, segurança e infraestrutura para o crescimento econômico, e com crescimento aumentar a arrecadação no médio prazo. A visão do governo Sartori não quer fazer a receita chegar no nível das necessidades, mas sim baixar as necessidades até a receita disponível. Nós achamos que o grau de necessidade que o Estado atende hoje já é o mínimo. Os 12% para a Saúde é o mínimo constitucional, não é o máximo”.

Sobre a polêmica envolvendo os números do déficit financeiro do Estado, Tonollier defende que a resposta tem a ver com a própria concepção do que significa governar. “O tamanho do déficit depende daquilo que, quem está no governo, vai fazer. É uma projeção do que vai ser feito. O governador andou usando a expressão “se nós não fizermos nada” o déficit vai ser tal…Como um governo pretende governar com a suposição de que não vai fazer nada? Um governo assim não existe. Tudo é difícil. Não tem nada esperando. Só em 2014 eu fui umas vinte vezes a Brasília atrás de recursos. Não é cortando diárias que conseguiremos os recursos estratégicos para o Estado. O governo tem que governar”.


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