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23 de abril de 2015
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20:01

250 mil pequenos agricultores do RS podem ficar sem assistência técnica

Por
Sul 21
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Audiência pública no Dante Barone reuniu 1,8 mil pessoas para discutir a ameaça da perda da Filantropia da Emater/Arcar|Foto: Guilherme Santos/Sul21
Audiência pública no Dante Barone reuniu 1,8 mil pessoas para discutir a ameaça da perda da Filantropia da Emater/Arcar|Foto: Guilherme Santos/Sul21

Jaqueline Silveira

A possibilidade de 250 mil pequenos produtores do Rio Grande do Sul ficarem sem assistência técnica devido à ameaça de perda de filantropia da Emater/Ascar mobilizou representantes de entidades ligadas ao campo, agricultores, prefeitos e políticos de diferentes partidos em audiência pública realizada na manhã desta quinta-feira (23), no Teatro Dante Barone da Assembleia Legislativa, que ficou superlotado. Em março deste ano, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) publicou uma portaria negando o certificado beneficente de assistência social à Emater por considerar que o trabalho não teria caráter social.

Sem a filantropia, a Emater teria de pagar um passivo acumulado de mais de R$ 2 bilhões em contribuições patronais ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Os valores devidos são referentes aos 23 anos de disputa judicial, já que a ação do INSS cobrando as contribuições  com a cassação do certificado é de 1992. Atualmente, a Emater mantém a filantropia amparada por uma liminar concedida em uma ação popular ingressada por ela. A perda da filantropia inviabilizaria o funcionamento da associação, já que seu patrimônio é bem menor que o valor devido e, conforme a assessoria jurídica, não seria suficiente para pagar as indenizações dos funcionários que seriam demitidos.

Diferentes frentes

Para reverter essa decisão, a assessoria jurídica do órgão público atua em diferentes frentes. Além das ações e dos recursos judiciais, o advogado Rodrigo Dalcin informou que a associação solicitou à Advocacia-Geral da União (AGU) que reconheça a relevância pública do problema e como consequência, então, assuma a questão. Nesse caso, a AGU instalaria a Câmara de Conciliação chamando todos os envolvidos – ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento Social, Receita Federal, Emater, entre outros – com o fim de resolver a situação depois de algumas reuniões de negociações.

Outra alternativa é o julgamento do recurso administrativo ingressado pela Emater contra a portaria do MDS que negou a filantropia. Para isso, a assessoria jurídica tenta convencer o ministério a aceitar a manifestação de entidades ligadas aos pequenos agricultores para reforçar a importância da manutenção da filantropia, mas o MDS estaria resistente em aceitar para evitar a pressão popular. Em relação à decisão do ministério, o advogado afirmou que há uma contradição, o que pode ser um ponto a favor do órgão. No mesmo dia em que saiu a portaria negando o certificado, o MDS publicou uma outra reconhecendo a filantropia anterior. “O Ministério reconheceu a do passado negando para o futuro”, explicou Dalcin.

O Teatro Dante Barone não comportou todos os participantes e muitos acompanharam do lado de foram em um telão|Foto: Caroline Ferraz/Especial Sul21
O Teatro Dante Barone não comportou todos os participantes e muitos acompanharam do lado de foram em um telão|Foto: Caroline Ferraz/Especial Sul21

A audiência pública, segundo os organizadores, reuniu 1,8 mil pessoas de diferentes regiões do Estado. Como não foi possível o acesso de todos ao Teatro Dante Barone, muitos acompanharam a atividade no saguão por meio de um telão. Nas três horas e meia de reunião, representantes de entidades, pequenos agricultores e políticos se revezaram ao microfone e questionaram o critério usado pelo ministério para considerar que a assistência técnica não tem caráter social, uma vez que atende os “que mais precisam” e de forma gratuita.

Em nome do Estado, o vice-governador José Paulo Cairoli (PSD) prometeu que “não faltará esforço pra a continuidade da filantropia”. “A nossa política de Estado passa pelo fortalecimento da Emater”, garantiu Cairoli, apesar de especulações que o governo dispensaria mil técnicos contratados na gestão anterior para cortar custos.  Um dos proponentes da audiência pública, o deputado estadual Jeferson Fernandes (PT) disse que foram vencidas “algumas batalhas, mas é preciso vencer a guerra”, referindo-se à necessidade de a associação conseguir em definitivo o certificado de filantropia para não conviver constantemente com essa ameaça. “Eu sou um assistido da Emater”, completou o deputado Elton Weber (PSB), o outro proponente da audiência, logo no início de sua manifestação, ressaltando a importância do trabalho do órgão em sua propriedade.

Testemunho no MDS

Já o presidente da Federação de Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), Seger Menegaz (PMDB), ofereceu-se para dar um testemunho junto ao Ministério do Desenvolvimento Social, caso o MDS aceite a manifestação popular no recurso administrativo, além de levar 400 prefeitos, para provar “o bem que a Emater faz às comunidades do interior”. Outro que também se comprometeu a prestar depoimento em prol do órgão foi o delegado regional do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) no Rio Grande do Sul, Marcos Regelin.  “A Delegacia reconhece o trabalho e a condução da Emater. Os técnicos trazem no sangue a filantropia”, enfatizou ele, acrescentando que hoje 60 mil famílias são beneficiadas no Estado pelos programas do MDA em parceria com a entidade e que intenção é a avançar nos projetos.

A voz dos beneficiados

Os diretamente beneficiados com a assistência técnica da Emater também tiveram voz. O cacique-geral das aldeias Guaranis no Rio Grande do Sul, José Camilo, apelou pela manutenção e valorização do trabalho da associação nas pequenas comunidades. “O trabalho da Emater traz benefícios às comunidades indígenas. O técnico da Emater é preparado para trabalhar com os pequenos” disse ele, sob aplausos. Pescadora do Balneário Pinhal, Litoral Norte, Isabel Hofmann contou que a Emater auxiliou no desenvolvimento, inclusive na elaboração dos projetos. “A Emater é a pessoa mais próxima do agricultor, do pescador, do quilombola, do indígena, do povo”, afirmou ela.

Para finalizar, a coordenadora da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (Fetraf –RS), Cleonice Back, resumiu o trabalho essencial da Emater no interior e a preocupação dos agricultores com a ameaça de perder essa assistência técnica. “É a Emater que faz com que as politicas públicas cheguem a todos os cantos do Rio Grande do Sul, é quem faz esse trabalho fundamental nos nossos municípios”, concluiu ela, sobre a atuação da entidade em 494 municípios.

Os pequenos produtores temem ficar sem o trabalho da Emater, que está presente em 494 municípios|Foto: Guilherme Santos/Sul21
Os pequenos produtores temem ficar sem o trabalho da Emater, que está presente em 494 municípios. Muitos levaram faixas em defesa da filantropia|Foto: Guilherme Santos/Sul21

Durante a reunião foram feitas críticas à ausência de representantes do MDS, apesar de serem convidados. Quase ao final da audiência pública, o ministério informou que não foi possível enviar um representante devido a outros compromissos. No encerramento, o presidente da Comissão de Agricultura, Agropecuária e Cooperativismo da Assembleia, Adolfo Brito (PP), que presidiu a reunião, e os proponentes definiram que em 10 dias será elaborado um documento sobre o trabalho da Emater com a assinatura das principais entidades e sindicatos ligados aos pequenos agricultores para ser levada a Brasília por uma comitiva, que o entregará na AGU, no Ministério de Desenvolvimento Social e à bancada gaúcha.

Números do trabalho da Emater no RS

494 municípios atendidos

250 mil pequenos produtores assistidos diretamente

378 mil pequenos agricultores assistidos diretamente e indiretamente

200 cooperativas assistidas

2,5 mil técnicos levam assistência ao Estado


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