Colunas>Paulo Muzell
|
29 de setembro de 2017
|
12:59

Os infames

Por
Sul 21
[email protected]
Os infames
Os infames
Na eleição de 2014 foi eleita a pior composição da Câmara Federal na história do país. A bancada BBB, do Boi, da Bala e da Bíblia constituiu uma sólida maioria. (Foto: Flávio Soares/Câmara dos Deputados)

Paulo Muzell

A política, especialmente no Brasil, é atividade cada vez mais desacreditada e isto é péssimo para o país. São muitas as razões. Começam pelos equívocos de um sistema eleitoral que alimenta o personalismo – os eleitores votam em pessoas, não em ideias ou programas. É um sistema que, ao permitir o financiamento privado das campanhas, favorece o poder econômico que banca campanhas cada vez mais caras. Os candidatos das grandes empresas disputam com ampla vantagem e constituem uma maioria comprometida com a defesa dos poderosos. É um jogo de cartas marcadas, decidido antes que o voto seja depositado na urna. Além disso, partidos cada vez mais desmoralizados, enfraquecidos, consolidam o poder de uma mídia oligopolizada, entreguista e apátrida que exerce crescente influência na opinião pública. Aqui no Rio Grande do Sul a RBS elegeu sucessivos senadores e governadores, apoiando invariavelmente candidatos conservadores. Tem uma marca: o antipetismo, seguindo a orientação da empresa-mãe, a Globo, decisiva em várias eleições presidenciais em que coordenou furiosos ataques a Lula e ao PT.

Por sua própria natureza, governar, fazer a boa política, é tarefa de enorme grau de dificuldade. Pressupõe a definição de um programa e a perseverante busca da sua execução. Exige muito trabalho, fidelidade a princípios, superação de armadilhas, resistência às tentações. Há que se vigiar para impedir que os aduladores de ego, que invariavelmente orbitam em torno do poder, tenham sucesso, cultivando o narcisismo, terreno fértil para o seu abjeto trabalho. Não faltam, também, as tentações do dinheiro fácil, da fortuna e da riqueza. A maioria sucumbe aí, engrossando a enorme fileira dos corruptos. E há, ainda, aqueles mais raros, os profissionais do poder: se embriagam com ele, não vivem sem ele. Para mantê-lo e aumentá-lo recorrem à violência e até ao crime: semeiam a tirania.

Nos países subdesenvolvidos, a miséria e o baixo nível de escolaridade são fatores que contribuem para tornar mais espinhosa a prática política. No Brasil a coisa piorou porque a oligarquia com seu braço midiático resolveu, depois de doze anos, dar um basta aos governos petistas. Prepararam a “virada”, programada para 2014, com a eleição de Aécio Neves. Intensificaram os ataques a Lula e ao PT iniciados em 2005 com o episódio do Mensalão. Montaram a Lava Jato, contando com o respaldo de um Supremo Tribunal Federal (STF) que não cumpre e nunca cumpriu sua missão de guardião da Constituição, resguardo da Democracia. A maioria dos seus ministros, com poucas exceções, nos momentos cruciais da vida política do país – em 1954 (morte de Getúio), em 1956 (JK), em 64 (golpe militar) e agora em 2016 -, revelaram o que são: um bando de pavões togados, mestres nas artes da falácia e do sofisma.

Houve, ainda, um outro  fator que foi decisivo para que o Brasil se tornasse objeto de chacota no cenário mundial. Na eleição de 2014 foi eleita a pior composição da Câmara Federal na história do país. A bancada BBB, do Boi, da Bala e da Bíblia constituiu uma sólida maioria. Só uma Câmara tão desqualificada como essa poderia eleger Eduardo Cunha presidente. Cunha é o primeiro, encabeça a longa lista dos personagens infames que vitimou a política brasileira nas últimas duas décadas. Teve um importante papel de articulador de um grupo de profissionais do crime, da mentira e a da traição. Há muitos outros infames, mas três, especialmente, tiveram papel central na montagem da trama que iria criar o caos: Temer, Aécio e Padilha. Na moita, atrás da macegas, a figura decrépita e caricata de FHC. O Supremo teve, também, papel fundamental na articulação do golpe. E lá foi decisivo Gilmar 45, que impediu a posse de Lula como ministro de Dilma, entregando-o à fúria inquisitiva de Sérgio Moro. O Supremo fez “vista grossa” para os abusos e ilegalidades da Lava Jato: longas prisões preventivas, delações premiadas suspeitas, vazamentos seletivos e o desrespeito ao amplo direito de defesa e à presunção de inocência, o que criou no país um estado de exceção.

Para completar esta breve narrativa não poderíamos deixar de mencionar os infames da casa, o grupo de vira-casaca, dos traíras. Eles começaram sua trajetória na esquerda, juraram que acreditavam e que perseguiriam a utopia de construir uma sociedade melhor, com menos desigualdades. Ao longo do tempo, paulatinamente foram mudando de rumo.

Uns foram vítimas na obsessão por cargos e poder, outros seduzidos pelas facilidades do dinheiro. Oportunistas, cínicos arrivistas. Trocaram de lado, de pele. A lista é numerosa, mas é preciso citar alguns nomes que representam o pior da galeria de infames: Marta Suplicy, Cristóvão Buarque, Marina Silva e Antonio Palocci.

Marta votou a favor do afastamento de Dilma e, pasmem, da reforma trabalhista de Temer. O Professor Hariovaldo, no seu excelente blog, resumiu com humor: “Marta Suplicy retira direitos comunistas e se redime com os homens bons”. E prossegue: …“ela se integra a luta dos homens de bem contra os absurdos que o comunismo trouxe para as relações de trabalho, como férias, 13º, licença maternidade, limitação da jornada de trabalho a 8 horas, pagamento de horas extras. Marta se consagra ao dar um tapa na cara desses trabalhadores abusados”. Cristóvão Buarque também votou a favor do impeachment de Dilma, segundo se fala, em troca de uma nomeação para um cargo no exterior. Marina Silva apoiou Aécio no segundo turno da eleição de 2014. Traição imperdoável.

Por fim tivemos o recente episódio da delação premiada de Antonio Palocci. No exato momento em que a direita prepara seu golpe mortal contra Lula, na hora “h” ele se presta a dar o que Moro precisava: vende uma delação premiada acusando Lula, sem provas. O que os operadores da Lava Jato teriam lhe oferecido em troca?

***

Paulo Muzell é economista.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora