Colunas>Marcelo Carneiro da Cunha
|
25 de fevereiro de 2016
|
10:06

E agora, Josés

Por
Sul 21
[email protected]
E agora, Josés
E agora, Josés

Por Marcelo Carneiro da Cunha

Pelo que li no post longo pra caramba da camarada Manuela, não vai rolar. Pelo que ouvi de amigos, Manuela seria uma forma de unir forças hoje desconjuntadas sob o guarda-chuva da nossa deputada mais telegênica, para ver se alguma coisa de novo aconteceria no front. No way, Jose. Porto Alegre vai para mais uma eleição sem guarda-chuva, e isso em tempos de enxurradas bíblicas não pode ser bom presságio.

Eu nem ao menos sei quem seriam os demais candidatos. Nem sei se existe algum candidato a algo, nessa cidade em que não se vê sinal algum de que algo esteja por acontecer. Après nous, le déluge, sorri nosso estimado Fortunati, sendo que o dilúvio está ocorrendo durante, e não após ele.

Pois, 2016 quer dizer trinta anos desde que um certo grupo de amigos se encontrou e não mais se desencontrou na estimada Fabico da UFRGS. Um deles, chileno, voltou para o Chile mas deixou o coração aqui, em mais de um sentido. E, em visita à capital de todos os gaúchos, esse último romântico à moda antiga, que mantinha uma relação de amor incondicional com Porto Alegre se rendeu. A cidade que ele viu agora não é a cidade pela qual se apaixonou há décadas. Ou melhor, é por demais a mesma cidade, o que é um problema enorme, por qualquer lado que se resolva olhar.

Nos encontramos, ele e eu, nessa minha passagem por Porto Alegre, e o olhar desolado dele dizia tudo. Trinta anos, caros leitores. Trinta anos é tempo de sobra pra gente inventar a fusão a frio e descobrir a força misteriosa que faz funcionar a Jessica Alba, por exemplo. Meu amigo chileno olha ao redor e se espanta. “O que aconteceu?  O que não aconteceu? Como essa cidade fez para andar em círculos por tanto tempo? Como se faz para ela disparar de novo para a frente, viver de novo a intensidade que nos uniu para sempre, ou pelo menos eu achava que fosse para sempre?”

Ficamos por um tempo sentados em um café (bom café) na Duque de Caxias, lembrando o passado e pensando sobre futuros possíveis. Meu amigo ama a cidade de verdade, e por isso sofre. Acontece algo parecido comigo, com a diferença de que eu nasci aí mesmo, passei por coisas demais para poder esquecer de todas elas e da cidade.

Eu achava difícil achar que uma nobre candidata do PCdoB pudesse ser solução para alguma coisa, levando em conta o que o PCdoB tenha para propor sobre qualquer tema. O PCdoB é aquele partido que mandou nota de felicitações para o governo da Coreia do Norte, lembram? Se eles podem isso, podem tudo, menos conduzir uma cidade para alguma coisa parecida com o século 21.

Da última vez que a cidade se mexeu para a frente foi nos tempos do Olívio e Tarso prefeitos, lembram? Forum Social Mundial? Lembram daquele encontro do Saramago com Fukuyama em plena Reitoria da UFRGS? Ou Peter Brooke no Em Cena?

Algo parecia acontecer, e a cidade parecia se mover, e fizemos uma obra, ao menos, com jeito de algo novo (mesmo que com um senso estético e urbanístico bem desajeitado, na minha modesta opinião), a perimetral aquela, onde era a Carlos Gomes, lembram? De lá pra cá, estimados sulvinteumenses, a única coisa que se mexeu foi a turma dos blackblocs implodindo o centro da cidade ao menor pretexto, em 2013.

Porto Alegre parece a mim e meu amigo chileno demais a mesma, demais do mesmo. Quem , ou o quê podem romper com esse marasmo? Qual liderança pode liderar alguma coisa, qual visão pode visionar o que quer que seja? Quem pode converter a vitalidade de Porto Alegre em um futuro economicamente viável, pelamordedeus?

Eu olho ao redor e não vejo nada, caros leitores, e isso é muito complicado. Aqui eu olho e vejo o Haddad botando pra quebrar, sempre um passo à frente da mediocridade kassabiana que o  cerca. Eu sei que o prefeito de São Paulo tem um projeto e o implanta apesar de tudo. Quem vai implantar alguma coisa em Porto Alegre, me digam vocês?

Uma coisa que me impressiona, sem que eu saiba ao certo o que significa , vou compartilhar com vocês, já que somos íntimos a essas alturas. Nas últimas duas semanas, passei ou fui parado em cinco blitzes aqui em São Paulo. Desde domingo, foram três. Quantas vezes nos últimos dias vocês foram parados ou pelo menos incomodados por policiais em alguma atividade parecida com uma ação preventiva contra crimes em geral, na sua cidade? Falo isso porque a cada ida a POA ouço relatos de violência urbana de gente que não me parece paranoica ou exagerada. E não vejo sinal algum de presença policial, por onde quer que eu ande.

A cidade desandou, e precisa reaprender a andar. Com os que estão aí, não vai. Os que não estão, parecem não querer ir. Não existe vácuo na política, portanto, quem vai ocupar o vazio atual, ocupado pelo Zé Fortunati, ou os vazios que se abrem daqui até a eleição?

Cartas, como sempre, para essa caixa postal.

.oOo.

Marcelo Carneiro da Cunha é escritor.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora