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18 de outubro de 2012
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07:50

Quem está a favor da reforma política?

Por
Sul 21
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Muito curiosa a postura de certos políticos da oposição que, vez ou outra, aparecem defendendo em artigos e entrevistas a realização da reforma política brasileira. Curiosa porque, ao que tudo indica, só ao PT interessa votar e aprovar o projeto da reforma, que está há tempos parado nas comissões especiais da Câmara e do Senado, e cujo relator é o deputado federal Henrique Fontana (PT-RS).

Sempre relegado pela oposição, PSDB e DEM à frente, o texto do projeto, que contempla questões vitais para o combate à corrupção, como o financiamento público de campanha e mudanças no sistema de votação, não é colocado na pauta das comissões permanentes nem na do plenário. Empenhado em um acordo para que a votação não seja mais obstruída e protelada, Fontana agora tenta convergência para votar o relatório e depois colocar os destaques em discussão, uma espécie de votação fatiada. O relator propõe ainda que os deputados votem primeiro o projeto de lei do financiamento público e depois a PEC 10/95, em tramitação no Senado, que trata dos sistemas de votação e cria o voto distrital misto. A ideia é sair do impasse e avançar na agenda da reforma ainda este ano.

Mas diante da dificuldade encontrada pelo relator, a pergunta que nos resta é: por que é tão fácil para a oposição discursar a favor da reforma política e tão difícil se mobilizar para votá-la? O fato é que o seu discurso falacioso, em defesa da ética e contra o fisiologismo, não se sustenta em sua atuação. A oposição, assim como a grande imprensa, é contra uma reforma política ampla que, de fato, favoreça a transparência e acabe com a sobreposição do poder econômico ao político nas eleições. O que querem é uma reforma mínima, que mude muito pouco, ou que deixe tudo como está.

A grande mídia contesta o direito à propaganda eleitoral “gratuita” e diuturnamente fala em combater a corrupção, mas se abstém de abrir espaço a um debate amplo sobre a reforma política no país. Para ela parece mais interessante manter a campanha contra os políticos, sem, entretanto, que se ataquem as causas da corrupção. Também parece favorável à formação de um Parlamento menos independente e, portanto, mais vulnerável a pressões de toda sorte.

Já a bancada petista sempre teve como uma de suas maiores frentes de luta no Congresso Nacional a realização de uma reforma política que estabeleça o financiamento público exclusivo de campanhas e a modificação de regras do sistema eleitoral que, embora não sejam as únicas questões, constituem o cerne das mudanças necessárias para melhorar o sistema político brasileiro.

O financiamento público de campanha é o único mecanismo que pode auxiliar no combate à corrupção, além de ter o poder de equalizar a vantagem que candidatos e partidos vinculados às elites econômicas têm em relação aos demais, o que é importante para a consolidação de uma cultura política democrática.

A exemplo do que acontece com o tempo de televisão para propaganda eleitoral e com o Fundo Partidário, os recursos públicos serão distribuídos de acordo com o desempenho dos partidos nas urnas. Aliás, talvez seja por isso que a grande mídia e a oposição entendem que a reforma só é boa para o PT – a legenda que mais cresce em todas as eleições. Na verdade, é boa para a democracia, na medida em que fortalece os partidos que têm apoio social e participação concreta na cena política brasileira, em detrimento de legendas de ocasião.

Pela proposta de Fontana, os eleitores poderão continuar votando no candidato de sua preferência. Como o “tamanho” dos partidos nos Parlamentos dependerá do somatório dos votos nominais e dos votos de legenda, a adoção da lista flexível será neutra em relação às dimensões das bancadas partidárias. Depois do cálculo do número de cadeiras conquistadas pelas legendas, define-se quem são os eleitos dentro do partido.

O relatório propõe ainda a alteração da atual regra de suplência para senadores. Com a mudança o suplente de senador passaria a ser o candidato a Deputado Federal mais votado nas últimas eleições para a Câmara dos Deputados, pelo mesmo partido do titular, ainda que não eleito, impedindo assim que assumam a cadeira políticos não escolhidos pelo voto popular.

Em relação às coligações realizadas no processo eleitoral, se converteriam em “federações partidárias” e seriam mantidas após o pleito, durante os mandatos dos parlamentares eleitos, o que favoreceria a constituição de alianças programáticas e respeitaria a decisão dos eleitores.

Essas medidas também auxiliariam na adoção de campanhas mais baratas, uma vez que levariam as eleições para um confronto de ideias e propostas, fortalecendo a identificação entre os eleitores e os partidos políticos.

São essas as bases da reforma que defendemos, construídas coletivamente, e que, após votadas no Congresso, deverão ser consultadas à população por meio de referendo. Vale ressaltar que o PT sempre trabalhou pela reforma que, já em 2009, foi proposta pelo ex-presidente Lula, e que é hoje apoiada pelo governo da presidenta, Dilma Rousseff. Se alguém não foi/é capaz de lidar com a reforma política, ao contrário do que dizem os colunistas da oposição, certamente foi ela própria quando esteve no poder, e agora, pelas demonstrações de descaso de sua bancada no Legislativo.

O PT sabe muito bem o que propõe e o que defende. Por isso, trabalha junto à sociedade e ao Congresso Nacional para aprovar uma reforma política que ataque as raízes da corrupção e do personalismo e que fortaleça projetos e partidos, modificando o sistema político atual, que já deu demonstrações muito claras de seus limites. Com coragem, compromisso com a democracia e com o país, o partido busca concretizar as mudanças. E a oposição, o que tem feito pela reforma, além de discursar e dificultar seu andamento?

José Dirceu, 66, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT


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