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23 de julho de 2015
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11:01

Games of thrones, versão Brasil

Por
Sul 21
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Games of thrones, versão Brasil
Games of thrones, versão Brasil

Por Sergio Araujo*

Não bastasse a crise econômica e política do país os brasileiros agora tem que conviver com o conflito institucional provocado pelo presidente da Câmara dos Deputados, o terceiro na linha sucessória da União, com a presidente da República, Dilma Rousseff. Acuado pela citação de seu nome na delação premiada realizada pelo lobista Júlio Camargo, que o coloca como suspeito de envolvimento nas fraudes detectadas pela Operação Lava-Jato, Eduardo Cunha, tal qual um macaco portando uma metralhadora, dispara acusações para todos os lados, aleatória e indiscriminadamente.

Dizendo estar sendo vítima de um conluio político, Cunha chama o delator de mentiroso e afirma que o mesmo foi forçado a incluí-lo no seu depoimento incriminatório pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Da mesma forma, recentemente, procurou o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, para acusar o juiz Sérgio Moro, responsável pela condução da Operação Lava-Jato, de usurpação de competência e pedir a anulação da ação penal que tem como réu Júlio Camargo.

Não satisfeito com as medidas tomadas pela estratégia arrasa-quarteirão, Eduardo Cunha centrou sua tese conspiratória na presidente Dilma que, segundo ele, estaria interessada em desconstituí-lo moralmente e “constranger o Poder Legislativo” num período de aprofundamento da discussão de um eventual pedido de impeachment contra ela. Em resposta a esse “ataque”, Eduardo Cunha promete retaliações de todos os tipos, como por exemplo, aceitar todos pedidos de impeachment protocolados na Câmara. E para não deixar dúvidas, declarou em alto e bom som que o presidente da Câmara dos Deputados está rompido com o governo Dilma.

Como assim? Tudo isso parece uma conduta no mínimo megalomaníaca. Cunha confunde, propositadamente, a figura do deputado, ente político, com a do presidente da Câmara, institucional. A função do presidente da Câmara é representar o a vontade do povo brasileiro, mediante posição majoritária tomada pelos 513 parlamentares eleitos por seus estados, e não de maneira ditatorial. Até porque quem está sob suspeição não é o presidente da câmara Federal, mas o deputado Eduardo Cunha. E a vontade do povo foi manifestada nas urnas, no dia 26 de outubro de 2014.

Ao colocar o cargo ocupado momentaneamente acima da condição de parlamentar, Eduardo Cunha, além de tentar interferir indevidamente na seara alheia, adota uma postura de quem tem culpa no cartório. Mais do que uma tentativa desesperada de defesa ou quem sabe do direito ao “jus esperneandi”, os movimentos do presidente da Câmara dos Deputados desnudam algo muito maior e pouco transparente: a luta pelo Poder. Mais especificamente, pela presidência da República.

Mas não é para isto que existem as eleições? Sim, mas é preciso que os perdedores assimilem a derrota e os vencedores entendam a grandeza e o significado da vitória. E aí é que está o X da questão. O PSDB, o grande derrotado, não engoliu o revés e não desceu do palanque. Apoia e incentiva os protestos de rua contra o governo Dilma e o PT e, embora não admita claramente, torce fervorosamente pelo impeachment.

E é ai que entra o segundo interesse. O PMDB, parceiro de Dilma na vitória, vendo o desgaste popular da presidente e do seu partido, sentiu a possibilidade de conquistar a presidência pela via alternativa. Parece ter cansado de servir de linha auxiliar. E o vice-presidente Michel Temer, ainda na condição de coadjuvante, está vestido e maquiado para assumir o papel principal. E foi essa possibilidade que conduziu Eduardo Cunha e Renan Calheiros, peemedebistas de carteirinha, às presidências da Câmara dos Deputados e do Senado da República.

Cenário montado, coube a presidente Dilma, com sua limitada habilidade política, dar o empurrãozinho que faltava para agravar a sua própria situação. E ele veio através da indicação de Michel Temer para a articulação política do governo. Mesmo com a contrariedade do PT. E o que já era ruim ficou ainda pior. E os fracassos no Congresso Nacional começaram a acontecer. Um após o outro. Como era previsível.

Enquanto isso, a população brasileira assiste a tudo sem entender o que está acontecendo. Por que os políticos estão interessados em questões atinentes ao Judiciário e a Polícia? Por que o Judiciário permite a ingerência política em suas atividades? Por que o Legislativo não se concentra em criar ou modificar leis que melhorem a vida das pessoas, ao invés de cuidar apenas dos seus interesses? Por que o Executivo não implanta medidas efetivas para estancar o avanço da corrupção no setor público, impedir a volta da inflação e muito mais? Resumindo, por que cada Poder não cuida apenas da sua parte?

Enquanto nossos representantes priorizarem apenas a ocupação do trono(poder) e não o bem estar do reino (sociedade) vamos, lamentavelmente, continuar assistindo a nossa versão brasileira dos Games of Thrones (A Guerra dos Tronos).

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*Sergio Araujo é jornalista e publicitário.


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