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11 de maio de 2010
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13:46

Para onde vai a Itália?

Por
Sul 21
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Por Bruna Peyrot

Há poucos dias, no 25 de abril, festejamos os 55 anos da liberação da Itália do nazifascismo. Mais de meio século de história divide a atualidade daquele dia marcante, cheio de esperança e de futuro.

A Constituição, em vigor desde o lº de janeiro de 1948, havia indicado um novo caminho para a Itália, inspirado na democracia real, na tutela das liberdades individuais, no direito ao trabalho e ainda em um federalismo regional que, no entanto, não negasse a unidade nacional.

A Constituição foi um pacto social entre diversos atores políticos. Liberais, socialistas, comunistas e católicos democrata-cristãos haviam estabelecido “princípios” e “regras” para conviver em paz e solidariedade.

A Itália tornou-se uma República que, como todas as democracias, para sê-lo, deve manter separados os três poderes que as caracterizam: Executivo (governo), Legislativo (parlamento) e o Judiciário (magistratura). Hoje, no entanto, assistimos a uma coação populista por parte do líder do Executivo, Silvio Berlusconi, que em nome do “governo do fazer”, pretende simplificar os passos para construção de uma lei, com velozes decretos-lei, ou mesmo tomar decisões sem consultar o Parlamento. Ou mesmo, ainda, que se esquiva do Judiciário, face aos crimes de que é acusado.

Quem hoje governa a Itália tende a não se sobrepor à lei, mas em nome da larga maioria que tem no Parlamento, Berlusconi pretende interpretá-la como um vencedor, sem respeito aos procedimentos e passos institucionalmente previstos.

Em outras palavras, a idéia que guia o governo Berlusconi é a seguinte: nós não baseamos a nossa legitimidade nas leis que regulam o Estado italiano, mas sobre o fato que vencemos com um determinado número de votos. Não conta a mediação política com a oposição, mas a midiatização, isto é, o diálogo feito especialmente através da mídia, com “o povo”. Entre o líder e o povo, não deve haver nada, porque partidos, associações, sindicatos, movimentos etc, são coisas inúteis, que “fazem perder tempo”.

Nesse contexto, foram realizadas as eleições para governador das regiões italianas em 28 de março, onde a centro-esquerda ganhou em sete regiões e a centro-direita em seis. Nas eleições de 2005, a centro-esquerda tinha onze e a centro-direita, duas. Particularmente no Piemonte e no Lazio, a centro-esquerda perdeu por uma diferença mínima.

A campanha eleitoral pode ser descrita como áspera. Algumas semanas antes da eleição, a TV pública suspendeu todos os debates políticos, a pedido do premier Berlusconi, o que foi considerado por muitos como um ato de grande autocracia e de limitação da liberdade de imprensa. Alguns jornalistas, apresentadores de programas de entrevistas, fizeram a transmissão desde praças públicas de algumas cidades, como “Anno Zero”, de Bolonha.

O partido de Berlusconi, o PDL (Partito della Libertá ou Partido da Liberdade), teve uma vitória clara. Internamente à sua coalizão, porém, abre-se uma controvérsia. De um lado, a Liga (que insiste em romper a unidade italiana a favor dos poderes regionais e se caracteriza por defender uma limitação agressiva da imigração) torna-se cada vez mais forte. De outro, uma parte da Aliança Nacional (ex-Movimento Social), com o atual presidente da Câmara, Fini, reclama mais atenção e declara que quer constituir-se como “componente”, isto é, como um grupo organizado dentro do PDL.

Não se sabe ainda onde nos conduzirá o debate entre Fini e Berlusconi. Talvez, até, a eleições antecipadas. No front da centro-esquerda, se fala em derrota mais uma vez, e ninguém entende porque a maioria dos italianos se deixa convencer por um premier de características autoritárias e personalísticas, um “capo” que encanta, enquanto o estado, com seus equipamentos (escola, justiça, saneamento) vai de mal a pior.

A pergunta que mais instiga diz respeito àqueles 35% de abstenções, que demonstram profundo desinteresse pela política.

Há décadas não se repensa, na Itália, o significado da militância e da participação ativa nas decisões que dizem respeito a todos os cidadãos. Não há mais lugar para debates e para escolha.

Que Itália, portanto, está se delineando? Uma Itália, a meu ver, dividida não só entre norte e sul, entre direita e esquerda, mas entre sociedade civil e instituições políticas. Entre quem se abre para o encontro com o estrangeiro, o voluntariado e a interculturalidade, e quem se fecha na identidade local.


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