Cidades
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29 de setembro de 2020
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09:40

Na pandemia: Veja como será a 1ª Feira do Livro fora da Praça da Alfândega

Por
Sul 21
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A pandemia da covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, tornou inviável que a 66ª edição do evento literário ocorresse na Praça da Alfândega. Foto: Luiza Castro/Sul21

Annie Castro

Pela primeira vez desde que foi criada, a Feira do Livro de Porto Alegre não irá se espalhar pela Praça da Alfândega. Diante da pandemia do novo coronavírus, em 2020, o tradicional evento da Capital será realizado em formato online, com transmissões ao vivo das palestras, com mesas de autores virando salas virtuais e com as bancas de livros transformando-se e-commerces. “Os cancelamentos marcaram o meio literário neste ano, mas resolvemos enfrentar e não cancelar o evento. Decidimos criar um novo formato e fazer com que a Feira pudesse acontecer nele”, explica o presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL), Isatir Bottin Filho.

Todas as atividades da edição deste ano, que tem o tema ‘Janelas abertas para a praça’ e ocorre de 30 de outubro a 15 de novembro, estarão concentradas em uma mesma plataforma: o site da Feira do Livro, que estará no ar a partir desta terça-feira (28). Nos dias 13, 20 e 27 de outubro, antes da abertura virtual do evento, irá ocorrer uma espécie de aquecimento para a Feira, com a transmissão de palestras, que funcionarão como eventos introdutórios. Para possibilitar a transmissão online da programação, a Feira firmou uma parceria com a Fábrica do Futuro, que irá funcionar como QG do evento. “Eles têm uma tecnologia muito diferenciada para fazer as transmissões, então será o nosso QG da parte técnica e sempre teremos alguém da técnica e coordenadores culturais lá”, explica o presidente da CRL.

Durante o evento, a plataforma terá também uma vitrine virtual de livros, que direcionará para o e-commerce de cada editora e livraria. “Nesse modelo novo, cada banca que costumava ficar na Praça é um site”, explica o integrante da comissão organizadora da edição deste ano, Tito Montenegro, que também é editor da Arquipélago. No caso de associados da Feira que não tinham um site, a CRL firmou uma parceria com uma empresa que criou os e-commerces a preço de custo, para que todos estivessem aptos a realizar vendas online.

Outra parceria foi feita a fim de viabilizar uma consultoria para aqueles pouco ambientados ao universo das redes sociais. “Nem todos associados tinham redes sociais, por exemplo, ou estavam conectados com as novas ferramentas da internet. Então, fechamos uma parceria com o Sebrae, que passou a oferecer, por um preço muito mais abaixo que o do mercado, essa consultoria para os associados. Ela vai além de ser uma consultoria apenas de gerenciamento de crise, ela está fortemente voltada para as redes sociais”, explica Bottin Filho. Desde junho, o Sebrae atua na capacitação dos associados, promovendo palestras e encontros online, auxiliando caso a caso cada editora ou livraria.

Segundo Montenegro, além de viabilizar a venda online durante a Feira, a parceria também é uma maneira de auxiliar muitos associados da CRL a se modernizarem e capacitá-los para o meio digital. “Esse novo formato é um desafio muito grande para os livreiros e editores, principalmente para os mais tradicionais, que estão acostumados a ter 100% seu negócio de forma analógica. Acredito que é função da Câmara colaborar e incentivar a modernização dos associados, porque não é só colocar um site na internet, é pensar no público, alcançar o público. O público está muito nas redes sociais, então, precisamos colocar a feira do livro nesse universo. Vamos trazer ela para o século 21”, afirma. Ele ressalta que a vontade da comissão da Feira é que, nas próximas edições, o formato online complemente o físico. “É possível que em 2021 a gente tenha bem mais presença digital na feira”.

Foto: Guilherme Santos/Sul21

Apesar do preparo para o modelo de e-commerce, os associados não conseguem prever como serão as vendas neste ano, uma vez que a ausência de bancas físicas é inédita na história da Feira. “A nossa editora tem e-commerce e costumava estender para ele as condições e promoções que ocorriam na banca na Feira, mas era algo pontual, muito diferente de agora. O volume de vendas reais acontecia sempre na banca. É a primeira vez que vai acontecer totalmente no virtual, ninguém sabe como será o volume, ninguém sabe o que acontecerá”, afirma Gustavo Faraon, cofundador da editora Dublinense, uma das associadas da CRL. .

Ele reforça ainda que, mesmo que alguns associados já estivessem acostumados a trabalhar também no meio virtual, ninguém estava pronto para substituir todas as vendas físicas que ocorriam nas edições anteriores para o e-commerce: “Pessoalmente, tento não ficar com nenhuma expectativa. Sabemos que está todo mundo tentando fazer a coisa mais legal possível e fazer dar certo, mas não temos nenhum parâmetro e nem como comparar com as vendas de outros anos”.

Impactos do novo formato

O modelo digital afetará algumas das principais características da Feira, que são, por exemplo, as conversas entre leitores e autores e a presença de diferentes perfis pessoas em um mesmo ambiente, a Praça da Alfândega. “Temos uma mudança cultural importante, já que a Feira sempre foi um evento muito tátil, em que a presença era uma coisa muito importante. Estar na praça, tocar nos livros, encontrar as pessoas, conversar”, afirma Montenegro.

Ao mesmo tempo, o modelo online permite que a Feira passe a ter um alcance nacional e até mesmo internacional, uma vez que pessoas de diferentes partes do mundo poderão acessar o conteúdo. “O ponto negativo desse novo formato é essa falta de contato com as pessoas que é tão especial, que a gente necessita, mas o positivo é que gente ganha muito em alcance”, explica o presidente da CRL. Segundo ele, outro ponto positivo é que o modelo remoto facilita a participação de escritores e escritoras de fora do Estado, que tinham dificuldades em participar de edições anteriores do evento. Esse é o caso, por exemplo, da convidada de abertura desta edição, a chilena Isabel Allende. “Se antes não era possível a presença por questões de tempo, de agenda ou pelo financeiro, neste ano será muito simples. Todos vão participar de forma remota e isso vai facilitar muito”.

Para o cofundador da Dublinense, o modelo online também poderá alcançar leitores de diferentes locais. “Temos perdas, mas por outro lado temos a oportunidade de encontrar outros públicos que estão pelo Brasil inteiro. Então, todo mundo da cadeia do livro que participa da Feira vai ter a possibilidade de se mostrar nacionalmente”, afirma Faraon.

Foto: Luiza Castro/Sul21

O formato online também impactou a programação do evento, que passou por um enxugamento nas atividades, como palestras, bancas e mesas de autores. Porém, a organização do evento garante que isso fez com que fossem priorizadas propostas de qualidade. “Estamos pegando o que tinha de melhor na feira presencial e passando para o online. Em outras edições, chegávamos a ter de 300 a 400 atividades e agora vamos ter cerca de 100. O número de eventos diminuiu, mas aumentamos na qualidade”, afirma o presidente da CRL.

Outra mudança no evento é que a Feira deste ano terá quatro temas principais, embasados nos assuntos que permeiam as sociedades atualmente e que irão estar presentes, direta ou indiretamente, em toda a programação do evento. Nas edições anteriores, um único assunto norteava as atividades. Segundo a jornalista, escritora e curadora da programação geral da Feira deste ano, Lu Thomé, os temas desta edição são: cultura, diversidade, ciência e sustentabilidade.

“Na cultura, queremos focar no viés de valorização da área e de seus profissionais. O tema da diversidade é um critério que permeia tudo, nossa programação vai ter diferentes perfis de autores, pessoas do movimento negro, do movimento LGBTI+ e mais mulheres do que homens, tanto no número de convidados principais, quanto no número geral de convidados. Na temática da ciência, estamos pensando em toda situação da pandemia da covid-19 e na sustentabilidade queremos refletir nossa própria relação com o planeta”, explica a curadora.

Conforme Lu, essa mudança é algo que já vinha sendo pedido pela comunidade cultural e já ocorria em outros eventos da área: “Não vamos ter atividades divulgando apenas um livro ou um autor, mas vamos juntar vários autores e autoras para falar sobre um tema que faz sentido dentro do evento. A Feira optou por aproveitar o ano da pandemia, de mudança de formato e de muita experiência que a CRL está adquirindo para fazer essa mudança, ter uma manifestação e uma entrega de conteúdos que possam fazer sentido entre si e que não sejam só um número x atividades”. A programação completa será divulgada nesta terça-feira (28).


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