MAB lança campanha para financiar documentário sobre ‘arpilleras’

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O documentário retratará diversos casos de violações cometidas contra as mulheres na construção de barragens no Brasil, por meio de uma técnica de bordado utilizada como prática de denúncia e resistência contra a ditadura militar chilena. (Foto: divulgação)
O documentário retratará diversos casos de violações cometidas contra as mulheres na construção de barragens no Brasil, por meio de uma técnica de bordado utilizada como prática de denúncia e resistência contra a ditadura militar chilena. (Foto: divulgação)

Marco Weissheimer

O coletivo de comunicação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) lançou uma campanha de financiamento coletivo para a produção do documentário “Arpilleras: bordando a resistência”. O documentário retratará diversos casos de violações cometidas contra as mulheres na construção de barragens no Brasil, por meio de uma técnica de bordado utilizada como prática de denúncia e resistência contra a ditadura militar chilena.

Desde 2013, o MAB vem divulgando essa técnica de bordado para relatar violações de direitos humanos em áreas atingidas por grandes projetos de barragens. A entidade já realizou mais de 100 oficinas em dez estados brasileiros, com a participação de mais de 800 mulheres atingidas por barragens. Por meio dessas atividades formou-se uma rede de cerca de 100 testemunhos e narrativas têxtis de mulheres atingidas em 14 áreas de barragem espalhadas pelo país. O documentário pretende retratar essa história.

A técnica das “arpilleras” surgiu em Isla Negra, no Chile, mas ganhou uma dimensão política especial durante a ditadura do general Augusto Pinochet, que esteve no poder de 1973 a 1990. Mulheres que viviam em áreas do subúrbio de Santiago e em áreas rurais adotaram essa técnica para desenvolver uma narrativa contra a repressão da ditadura. Utilizando roupas dos parentes desaparecidos e sacos de farinha ou de batata, elas denunciaram as diversas violações de direitos humanos cometidas pela polícia de Pinochet.

Além do caráter de denúncia e de construção de uma memória da resistência à repressão, as “arpilleras” eram produzidas em oficinas apoiadas por entidades ligadas à igreja, que vendia os bordados em feiras na Europa e Estados Unidos, ajudando a garantir uma fonte de renda mínima para as suas autoras. Desde 2008, as “arpilleras” chilenas percorrem o mundo ensinando outras mulheres a registrar e denunciar suas experiências de violação de direitos humanos. No Brasil, o MAB abraçou a técnica para ajudar a contar a história de sua luta.

A ideia é costurar uma “arpillera” coletiva de norte a sul, na qual uma mulher de cada região do Brasil narre o impacto das barragens em suas vidas.  (Foto: Divulgação)
A ideia é costurar uma “arpillera” coletiva de norte a sul, na qual uma mulher de cada região do Brasil narre o impacto das barragens em suas vidas. (Foto: Divulgação)

O custo social das barragens

Segundo o último levantamento realizado pela Comissão Mundial de Barragens, em 2000, mais de um milhão de pessoas já foram atingidas pelas barragens no Brasil. Deste total, cerca de 70% não teriam recebido nenhuma forma de reparação. O relatório de 2010 do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Secretaria de Direitos Humanos da República do Brasil, reconheceu a existência de um padrão de implantação de barragens que provoca a violação de 16 direitos humanos das populações atingidas,  acentuando desigualdades sociais e provocando situações de miséria e desestruturação social, familiar e individual.

Milhares de pessoas já foram obrigadas a deixar suas casas e terras por causa das barragens. Aos atingidos, protesta o MAB, são negados o direito à informação, à memória e à terra. No caso das mulheres, acrescenta o movimento, as violações são ainda maiores. Segundo o MAB, com o inchaço populacional repentino nas regiões que recebem as obras das barragens, há um aumento nos casos de assédio sexual, tráfico de mulheres, prostituição e estupro. Com o início da construção das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, por exemplo, Porto Velho (RO) registrou um aumento de 208% nos casos de estupro em apenas dois anos, segundo relatório da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (DHESCA).

O documentário quer contar um pouco dessa história de opressão de gênero nas áreas atingidas por barragens, por meio da vida de cinco mulheres. A ideia é costurar uma “arpillera” coletiva de norte a sul, na qual uma mulher de cada região do Brasil narre o impacto das barragens em suas vidas. O Movimento dos Atingidos por Barragens espera arrecadar, por meio de financiamento coletivo no Catarse, R$ 25.000,00 até o dia 12 de junho deste ano. A previsão de conclusão do documentário, que será dirigido pela documentarista Adriane Canan, é dezembro de 2015.


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