Débora Fogliatto
Os moradores da Ocupação São Luiz, na zona Norte de Porto Alegre, conseguiram um agravo de instrumento, concedido pelo desembargador Nelson José Gonzaga, que suspende a reintegração de posse marcada para esta terça-feira (14). Inicialmente, a chuva que atinge diversos pontos do Estado havia barrado, ainda na noite de segunda-feira (13), o despejo, visto que uma determinação da Brigada Militar não permite que sejam realizados quando chove.
A decisão de hoje foi tomada a partir da argumentação baseada na existência da Lei de Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS), aprovada pela Câmara no ano passado, e no fato de se tratarem de famílias em situação de vulnerabilidade social. “[Os moradores] afirmaram que, com a aprovação da legislação, possibilitou-se aos ocupantes a aquisição formal dos terrenos. Salientaram descabida a medida drástica de reintegração de posse, sobretudo considerando a questão social de relevante importância. Argumentaram que se trata de pessoas de baixa renda, sem tetos. Narraram que foi requerido o envio do presente feito ao CEJUSC, órgão no qual há projeto-piloto sendo realizado para a tentativa de conciliação de diversas áreas em Porto Alegre com conflitos fundiários”, narrou o desembargador em sua decisão.
Baseado nesses argumentos, ele optou por conceder o agravo. “Em princípio, a documentação que instrui o recurso denota a existência de fato novo, ou seja, legislação municipal que, em tese, teria passado a amparar juridicamente a posse dos ocupantes no local. Tal circunstância, aliada à anunciada probabilidade de composição do feito, conduzem à conclusão da necessidade de prudência, evitando-se apressada medida que pode vir a prejudicar todos os envolvidos no processo”, discorreu na decisão. A partir de agora, as partes têm dez dias para se manifestar a respeito da decisão, caso a proprietária queira contestá-la.
A ocupação, na zona Norte de Porto Alegre, existe há cerca de cinco anos e estava sendo ameaçada de despejo a pedido da proprietária. Um dos argumento atualmente usados para tentar reverter a situação é de que a área estaria incluída em um projeto-piloto do Judiciário que estabeleceu um núcleo de mediações de conflitos entre proprietários e ocupantes. No entanto, apenas a região dos fóruns do Sarandi e Alto Petrópolis participam da iniciativa e, embora se encaixe na zona referida, o projeto da São Luiz tramita no Foro Central.
Na decisão de 1º grau, o juiz Antonio Nascimento e Silva, da Vara dos Registros Públicos, não autorizou que a ocupação estivesse entre uma das contempladas na mediação, pois a proprietária da área não concordou com a iniciativa. Por isso, o Conselho Regional por Moradia Popular* entrou com o agravo, na 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, que conseguiu barrar a reintegração. “Agora só pode mudar a decisão quando julgar o mérito. Isso deve acontecer daqui um mês e meio, dois talvez, e nesse meio tempo tem q botar o processo pra conciliação”, explicou o advogado Rafael Lemes.
A conquista foi a primeira grande vitória possível graças à mobilização do Conselho Regional por Moradia Popular, coordenado por Juliano Fripp. Os moradores estão em clima de festa, após um dia de muita tensão nesta segunda-feira (13), quando não sabiam se a reintegração aconteceria ou não.
“Coisa boa né, agora não poderia estar melhor. Estamos dando graças a Deus, depois de tudo que passamos ontem. Isso é fruto de muita luta”, contou o morador Arduíno Balduíno, membro do Conselho. Os moradores se movimentam desde sexta-feira (10), quando realizaram protestos durante o dia para tentar sensibilizar o Judiciário.
*Correção: até as 22h dessa terça-feira (14), constava que o agravo havia sido posto pelo Fórum das Ocupações, o que estava incorreto. A informação foi corrigida.