Jaqueline Silveira
Foi uma choradeira só a reunião promovida, na tarde desta segunda-feira (28), pela Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) com prefeitos e secretários de Saúde para tratar sobre os recursos financeiros para a manutenção das Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) de urgência e emergência. No encontro, eles reclamaram dos custos elevados para manter em funcionamento as UPAs e de terem que arcar com a maior fatia. Já os administradores públicos que ainda não começaram a obra pretendem não erguer as unidades. Para tentar solucionar o problema, ficou definido que uma comissão de prefeitos irá nos próximos dias a Brasília pedir mais recursos ao Ministério da Saúde.
Conforme a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde, a portaria que trata dos incentivos financeiros estabelece que para uma UPA porte 1 – municípios entre 50 mil e 100 mil habitantes -, o valor repassado pelo governo federal é de R$ 100 mil. Durante 2013, o governo do Estado reajustou sua cota e passou de R$ 50 mil para R$ 100 mil o repasse aos municípios com UPA desse porte. Entretanto, conforme a Famurs, o custo mensal de uma UPA porte 1 é de 450 mil e as prefeituras têm de arcar com a diferença de R$ 250 mil. Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que foi pactuada entre União, Estados e Municípios que o governo federal repassaria entre R$ 100 mil e R$ 500 mil e que o restante do valor seria complementado pelos outros dois outros entes federados.
“Os municípios estão percebendo que os repasses do governo federal e do Estado não são suficientes para a manutenção das UPAs”, afirmou o secretário estadual adjunto da Saúde, Francisco Paz. Como havia valores fixados em portaria quando os municípios solicitaram as UPAs, conforme ele, é preciso encontrar alternativas para manter o atendimento de urgência e emergência sem penalizar os municípios. A secretaria integrará a comissão que vai ao Ministério da Saúde pedir mais recursos.
Argumentos dos gestores
Vice-prefeita de Santo Ângelo, na região noroeste, Nara Damião Makvitz (PMDB), disse que a unidade do município está concluída desde junho de 2014, mas que a administração não tem condições financeiras para abrir as portas da UPA. Como é de porte 2, os custos são ainda mais elevados e a prefeitura, conforme ele, tenta habilitá-la para porte 1 a fim de reduzir as despesas. Mesmo assim, segundo Nara, a prefeitura não tem como arcar com a diferença se mantidos os atuais repasses. “O Estado já ampliou em 100%, agora é a hora da União”, afirmou a vice-prefeita, sobre o governo federal aumentar a parcela de custeio.
Nara, a exemplo de outros gestores públicos, argumentou que a União não reajusta os valores desde 2009 e desde lá ocorreram
aumentos de salários de médicos e dos insumos, como medicamentos, implicando na elevação dos custos mensais das unidades de atendimento de emergência e urgência. Além disso, Nara sustentou que o município tem obrigação de custear a saúde básica e como as UPAs prestam atendimento de média complexidade caberia ao governos federal e do Estado sua manutenção.
O prefeito de Cruz Alta, na região central, Juliano da Silva (PMDB), contou que a UPA do município abriu em dezembro do ano passado e que até agora não recebeu repasses da União e nem do Estado devido a problemas burocráticos, entre eles, o fato de a portaria de habilitação da unidade não ter sido ainda publicada no Diário Oficial da União. “Desde lá, quem custeia é o município, a situação está insustentável”, disse ele, que não descarta o fechamento da UPA. O prefeito disse que no início chegou a gastar cerca de 650 mil mensais. Depois, ele terceirizou o serviço para reduzir as despesas – hoje, o gasto mensal é de R$ 530 mil. Apesar da redução, Silva disse que a prefeitura não pode arcar com esse custo, pois inviabilizaria os investimentos em obras. Ele acrescentou que está disposto a repassar ao Estado ou ao governo federal a administração da UPA, contribuindo com o percentual de 25% no custeio.
UPAs pelo Estado
No Estado, há 13 unidades em funcionamento e mais 10 prontas ou aguardando a aquisição de equipamentos para começarem o atedimento. Já outras 22 UPAs estão em fase de construção. Prefeita de Torres, no litoral norte, Nilvia Pereira (PT) comentou que o Ministério da Saúde está cobrando do município a ordem de serviço para a obra, mas devido aos custos elevados, a administração não terá condições financeiras para a manutenção da unidade no futuro. “É um dilema que o município está vivendo”, revelou ela. A petista sugeriu que fosse elaborado um documento pedindo a suspensão das ordens de serviço de todas as obras nessa situação até “construir um consenso” quanto aos recursos para o funcionamento da UPA.
“Eu não vou abrir a UPA, não sou maluco”, afirmou o prefeito Alceu Barbosa Velho, de Caxias do Sul, região serrana, sobre a unidade de porte 3 que acaba de ser concluída. Ele argumentou que é impossível bancar os custos que alcançariam os R$ 10 milhões por ano. Em Guaíba, na região metropolitana, a unidade de urgência e emergência está 70% concluída e o prefeito já se preocupa com os gastos futuros. “Há seis anos, os valores permanecem os mesmos e o custo é muito elevado. Se não houver esse custeio, fica inviável”, frisou o prefeito Henrique Tavares (PTB), que também é médico, sobre a necessidade de reajuste dos repasses da União.
Além do aumento da fatia de recurso pelo governo federal, o presidente da Famurs, Seger Menegaz (PMDB), disse que a comissão vai solicitar ao Ministério da Saúde a flexibilização da portaria que regulamenta o serviço das UPAs com objetivo de reduzir o atendimento de 24 horas para 12 horas e diminuir o número de profissionais estabelecido para as unidades de acordo com o porte.” Os municípios não podem bancar a diferença que está faltando”, sustentou Menegaz, sobre os custos das UPAs para as prefeituras.
Hospitais não terão recursos de complementariedade
Se o atendimento na saúde está complicado, a situação tende a se agravar ainda mais. Durante a reunião com os prefeitos, o secretário adjunto da Saúde no Estado, Francisco Paz, anunciou que não haverá mais o repasse de Incentivo à Hospitalização (IHOSP) aos hospitais filantrópicos. O IHOSP é uma complementaridade para o custeio dos procedimentos de média complexidade na assistência hospitalar. Seriam R$ 25 milhões por mês. Desse valor, R$ 5 milhões iriam para os hospitais municipalizados. Paz disse que o Estado estuda outras alternativas dentro do orçamento previsto para a Saúde, entretanto, admitiu dificuldades pelo fato de a arrecadação vir caindo. “É possível que se tenha dificuldades em manter alguns serviços”, conclui ele.
Nota do Ministério da Saúde
Conforme pactuado entre os três entes federados, o Ministério da Saúde é responsável por passar entre R$ 100 mil e R$ 500 mil para custeio mensal das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de todo o país. O restante do valor deve ser complementado pelos estados e municípios, conforme a Portaria nº 342/ 2013. Cabe ressaltar que os gestores estaduais e municipais – por meio de portarias publicadas em 2009, 2012 e 2013 – têm ciência de quanto será repassado para cada UPA.
O Ministério da Saúde repassa R$ 32,1 milhões anuais para as unidades habilitadas do Rio Grande do Sul. Atualmente, o Estado possui 13 UPAs em funcionamento e 22 em obras, das quais 10 em ação preparatória. Há ainda 13 que foram concluídas, mas ainda não estão em funcionamento. É importante esclarecer que o início do repasse do custeio está condicionado à habilitação e à qualificação da unidade. Das que estão em funcionamento, 11 são custeadas – destas 11, 9 também são qualificadas.
Tamanho e repasses de recursos para as UPAs*
UPA Porte 1
– De 50 mil a 100 mil habitantes
– O custo total da manutenção é de R$ 450 mil ao mês
– Governo federal repassa R$ 100 mil
– Estado repassa R$ 100 mil
– Município cobre o restante do valor das despesas, R$ 250 mil
UPA porte 2
– De 100 mil a 200 mil habitantes
– O custo total da manutenção é de R$ 650 mil ao mês
– Governo federal repassa R$ 175 mil
– Governo do Estado repassa R$ 162,5 mil
– Município cobre o restante do valor, R$ 312,5 mil
UPA porte 3
– De 200 mil a 300 mil habitantes
– Custo total da manutenção é de R$ 900 mil ao mês
– Governo federal repassa R$ 250 mil
– Governo do Estado repassa R$ 225 mil
– Município cobre o restante do valor das despesas, R$ 425 mil ao mês
* As UPAs consideradas qualificadas, cujos funcionários passaram por capacitação, recebem valores mais elevados em comparação às UPAs habilitadas.