Quem passou pela Casa de Cultura Mario Quintana (CCMQ) durante a tarde desta quinta-feira (21) percebeu que a água que saía das torneiras estava verde. Isso porque um coletivo de artistas derramou corante verde alimentício na caixa d’água do local, em uma intervenção chamada Verter.
“O verde é muito vinculado ao movimento feminista, principalmente na Argentina, mas na América Latina como um todo. Os pañuelos, que são os lenços verdes, começaram lá na Argentina para simbolizar a luta pela descriminalização do aborto. Então o verde conectou os territórios da América Latina por essa luta”, explica a artista Anna Ortega. O movimento argentino ficou conhecido como maré verde.
Enquanto as artistas conversavam com a reportagem, algumas pessoas que utilizavam a torneira do terceiro andar da CCMQ se espantaram ao ver a água colorida. “A ideia é de contagiar uma casa, uma instituição. A gente se infiltrar numa instituição pública, do Estado, tem a ver com tomar esses espaços e tornar visível a luta pela descriminalização do aborto, que vem se espalhando como uma maré”, completa a artista Andressa Cantergiani.
A escolha da data se deu em alusão ao Mês da Mulher. “Mas a gente também entende que é uma causa muito importante para pessoas não binárias, enfim, pessoas que podem gestar. É um termo que engloba outras identidades de gênero que também são atravessados pela questão do aborto”, lembra Anna.
A intervenção artística acontece em meio a uma série de ataques ao direito legal de interromper a gestação. Em Porto Alegre, três projetos têm esse viés – todos de autoria da vereadora Comandante Nádia (PP). Um deles, que também tem autoria da vereadora Fernanda Barth (PL), determina que o médico deverá sugerir a realização de ultrassonografia prévia ao procedimento de aborto para que a gestante escute os batimentos cardíacos do nascituro. Outro texto obriga que os hospitais afixem cartazes sobre aborto, contendo “explicação pormenorizada de cada tipo de procedimento abortivo, os danos físicos e psicológicos que o procedimento poderá ocasionar para a gestante e qual seria o destino do nascituro após a realização do procedimento”.
Verter é a primeira ação do projeto que culminará em uma exposição do coletivo, com inauguração marcada para 16 de abril, também na CCMQ. A mostra dará continuidade à ação, apresentando um vídeo de registro e uma instalação que coleta narrativas em temporalidades e espacialidades distintas para dar visibilidade ao tema. O projeto é financiado pela Lei Federal de Incentivo à Cultura.