Opinião
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13 de setembro de 2012
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12:45

O assalto ao estado

Por
Sul 21
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Por Marino Boeira

Em época eleitoral, o mesmo discurso de repete: o povo está sendo convocado para eleger os representantes que vão governar em seu nome o país, o estado e os municípios. Nessa ocasião nunca falta alguém para lembrar o famoso discurso de Abraham Lincoln, ao final da Guerra Civil Americana, em Gettysburg, proclamando a igualdade entre todos os cidadãos, representados por um “Governo do Povo, pelo Povo e para o Povo”. Nada tão ilusório, tanto lá nos Estados Unidos, como aqui no Brasil.

Num sistema político onde o capital interfere diretamente no processo eleitoral, patrocinando partidos e candidatos e onde os meios de comunicação – quase que sem exceções – promovem uma verdadeira lavagem cerebral entre os eleitores , dificilmente os eleitos vão representar objetivamente os interesses do povo.

Mesmo os pequenos avanços conquistados, como no caso das eleições de Lula e Dilma, nunca se completam, porque os eleitos são obrigados a assumir determinados compromissos que os impedem de radicalizar o processo de identificação com os interesses do povo.

Alguém dirá que isso faz parte do jogo democrático. Até pode ser. Mas, mais do que isso, o seu significado maior é a tomada do poder pelos interesses de uma classe social, a alta burguesia, representada por grandes empresários, negociantes e latifundiários. A privatização do estado moderno inseriu países e populações na lógica perversa do capitalismo, que constrói e destrói num ritmo cada vez mais alucinante, gerando riquezas para alguns poucos e pobreza para a maioria.

Na época da ditadura, o estado a serviço das classes dominantes, costumava usar o exército e a polícia para coibir os que se insurgiam contra esta dominação. Hoje, dentro da nossa normalidade democrática, o assalto ao estado se faz através de uma estratégia de ganho da opinião pública que transforma os interesses de pequenos grupos em interesses de toda a nação.

Os exemplos do estado servindo os interesses da grande burguesa podem ser vistos no dia-a-dia, embora possam aparecer disfarçados por medidas aparentemente de caráter popular.  Veja-se o caso da isenção do IPI para a indústria automobilística. O ideal, num país como o Brasil, é o investimento pesado no transporte de massa – ônibus, trens, metrôs – e não em produzir mais automóveis que vão rodar em ruas e avenidas cada vez mais congestionadas. Mas isso não interessa às grandes montadoras. Como elas são geradoras de uma massa enorme de empregos, o governo abre mão de recursos que poderiam ser usados com outros fins, em troca da manutenção do trabalho em suas linhas de montagem.

Há poucos dias, a presidente Dilma anunciou cortes nas tarifas de energia elétrica. Os consumidores privados terão um pequeno ganho direto – cerca de 16% sobre as atuais tarifas – mas as empresas que absorvem grandes quantidades de energia, terão uma substancial  diminuição de custos.  A expectativa do governo é que além de mais competitivas, estas empresas repassem esta vantagem financeira para os seus consumidores, oferecendo produtos mais baratos. A dar atenção às palavras do empresário Robson Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) , isto talvez não aconteça. Disse que “alguns setores como os fabricantes de alumínio estão no limite, operando com margens muito apertadas e que, portanto, essa redução do custo produtivo será usada como um alívio para esses empresários continuarem produz indo no País” . Ou seja, a redução nas contas de luz, servirá basicamente para aumentar a margem de lucro das empresas.

Outra forma de transferência de renda dos trabalhadores para os empresários é patrocinada pelos governos estaduais através de suas políticas de exoneração de tributos e suas conseqüências nefastas como a guerra fiscal entre os estados. Quanto cada estado abre mão de impostos em favor de empresas privadas é um segredo protegido por lei. As vezes, abre-se uma brecha nesse silêncio, como quando o Governador Tarso Genro reclamou que uma fábrica de calçados do Vale dos Sinos, que dispensara 200 empregados, tinha recebido incentivo fiscal do governo.

Como as grandes marcas de roupas e calçados esportivos dos Estados Unidos vem fazendo desde a década passada, produzindo a baixíssimos custos na Ásia e gerando desemprego entre os americanos, as fábricas brasileiras fazem o mesmo aqui. O êxodo de fabricantes gaúchos para o Nordeste em busca de mais lucros está dentro da melhor ótica capitalista. Se o Governo, porém, representasse os interesses de todo o povo brasileiro, ele encontraria uma maneira de impedir estas transferências de fábricas entre seus estados,que podem gerar uma melhoria passageira em suas novas sedes, mas empobrecem definitivamente suas terras de origem.

Isso não significa não apoiar as políticas de enfrentamento da crise mundial que os governos brasileiros, desde Lula, vem fazendo, apostando no aumento do consumo interno, mas sim, continuar denunciando aqueles setores dos grandes empresários e seus representantes na mídia, que procuram sabotar estes esforços e – acima de tudo – buscar esclarecer as pessoas que os limites para a melhoria do bem estar social dentro de uma sociedade baseada no lucro, são muito estreitos.

Marino Boeira é professor universitário


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