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4 de julho de 2012
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20:26

Entidades questionam cercamento eletrônico da Redenção

Por
Sul 21
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Rachel Duarte

Prefeitura quer reforçar câmeras de segurança na Redenção; movimentos sociais dizem que medida vai intimidar usuários | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

O antigo debate sobre o cercamento do Parque Farroupilha, conhecido como Redenção, volta à tona. A Prefeitura de Porto Alegre pretende reforçar o número de câmeras de segurança no parque de modo a obter visualização de tudo o que lá acontece à noite. Tradicional ponto de prostituição na cidade, a medida está sendo criticada pelos movimentos sociais por intimidar os usuários e reforçar o preconceito de um local de criminalidade. “O poder público corrobora com o mito da violência exclusiva do parque, conceito defendido por setores moralistas da sociedade. Isto acarretará a inevitável invasão de privacidade dos frequentadores”, defendeu o Grupo Pela Livre Orientação Sexual, Nuances, em nota enviada à Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana.

Célio Golin: governo quer higienizar a cidade | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Para Célio Golin, coordenador do Nuances, a política do governo municipal é de higienizar os problemas da cidade e não contribuir para uma efetiva segurança da Redenção. “Estamos preocupados com o que será feito com estas imagens que serão capturadas pelo Centro Integrado de Comando. Aparentemente se justifica como um ato para melhorar a segurança, mas não garante que as pessoas que serão filmadas não serão expostas. A justificativa da insegurança é relativa. Temos crimes ocorrendo em todos os cantos de Porto Alegre. A insegurança na Redenção é proporcional a qualquer outro lugar”, alega.

A entidade enviou ofício à Prefeitura no começo da semana e até esta quarta-feira (4) não havia obtido resposta por parte do poder público. Em entrevista ao Sul21, o subcomandante da Guarda Municipal de Porto Alegre, Valter Fernando de Oliveira, explica que o objetivo não é discriminar nenhum tipo de usuário do parque e que o ponto das travestis não sofrerá interferências. Mas admite: “A prostituição no local é um problema”.

O projeto para aquisição de 27 novas câmeras para colocação na Redenção e no Parque Marinha foi enviado à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp). Se fora aprovado, os equipamentos deverão ser instalados até o final deste ano. A tecnologia de infravermelho permitirá detectar os movimentos no interior do parque e enviar alertas à Guarda Municipal de Porto Alegre. A cobertura na Redenção será quase total. As imagens serão monitoradas pelo futuro Centro Integrado de Comando (Ceic), a ser construído na Rua João Neves da Fontoura e que integrará informações de diversos órgãos municipais.

Já existem seis câmeras em atividade na Redenção; imagens podem virar provas de atos obscenos e coibir prostituição | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

“O que é isso? É um reality show? Não sabemos o que é segurança e o que é cerceamento da liberdade. As imagens poderão virar provas de atos obscenos para condenar a prostituição — que não é crime — , que ocorre no parque. Mas a sexualidade não é motivo de insegurança em nenhum local do mundo. Todos os frequentadores dos locais públicos na madrugada buscam o anonimato para namorar, fazer sexo ou outras intimidades. É um debate político e delicado, mas tem que ser feito”, cobra o ativista Célio Golin.

Atualmente já operam seis câmeras na Redenção, o que não intimida a prostituição no local, afirma a presidente da Associação Igualdade RS, Marcelly Malta. “É complicado para as travestis, mas como elas sabem onde estão às câmeras, não deixam de fazer programa. A Brigada Militar, se vê o que elas fazem, está fazendo vista grossa. Até porque prostituição não é crime”, alega. E complementa: “Não é feito sexo na rua. É dentro do parque, não é explícito. A maioria que vai lá na madrugada vai procurar sexo”.

O subcomandante da Guarda Municipal, Valter de Oliveira, contesta que “o ponto de prostituição não teria problema, mas transar na rua é uma conduta inadequada”. Segundo ele, “não temos o direito de intervir sobre os cidadãos que se prostituem, nem vamos julgar isso, mas muitos usuários deixam de ir ao parque à noite em razão do que lá acontece”.

Ocupar o espaço público é uma forma de inibir a criminalidade para alguns especialistas em segurança pública e compartilhado pelo guarda municipal. “Nossa principal atuação será coibir o tráfico de drogas que predomina nos parques da cidade e devolver a convivência aos usuários. Começaremos pela Redenção e pelo Parque Marinha, mas nossa intenção é expandir para outros pontos. Não queremos retirar a liberdade de ninguém e também fazemos a leitura de que o crime e os problemas sociais podem migrar, mas trata-se de um projeto piloto”, fala sobre futuras intervenções da Prefeitura de Porto Alegre.

Além das câmeras, será disponibilizada uma guarnição da Guarda Municipal de Porto Alegre para atender as ocorrências detectadas pelas câmeras do parque. Durante o dia, além da viatura, duas motos também atuarão na Redenção.  “Mas apenas a Guarda Municipal não dará conta dos problemas dos parques municipais. Teremos que ter atuação conjunta com outros órgãos. A discussão sobre isso será feita após a instalação das câmeras”, diz.

“Não é feito sexo na rua. É dentro do parque, não é explícito", argumenta presidente da ONG Igualdade-RS, Marcelly Malta | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Marcelly diz que está atenta para possíveis intervenções da entidade no projeto da Prefeitura, caso surjam abusos para com as travestis. “Entendo que existem práticas criminosas também nos parques e na cidade em geral. Isso acaba colocando em risco as próprias travestis e pessoas que trabalham na noite. Sou a favor de mais segurança. Mas somos contra o cercamento do parque. É um local público, tem que ser livre ao uso público”, afirma.

Já Célio Golin estuda junto a outras entidades o envio de ofício questionando a invasão da intimidade dos usuários do parque com o cercamento eletrônico ao Ministério Público do RS.


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